Está em vigor desde agosto um despacho que obriga a que as ementas e a composição das refeições nas escolas públicas contemplem os princípios da dieta mediterrânica, assim como refeições vegetarianas, dietas justificadas por prescrição médica ou por motivos religiosos.
Mas o facto de muitos produtos já não serem vendidos nas escolas não quer dizer que as crianças e jovens não os consumam.
Veja-se o exemplo da Secundária José Gomes Ferreira, em Benfica, uma escola onde não há bar. Quem quiser almoçar na escola, ou leva de casa ou vai à cantina, partilhada com a vizinha Básica Pedro de Santarém, que entretanto mudou radicalmente de ementa, de forma a cumprir a lei.
Já nem as máquinas de venda automática têm o que procuram os alunos como Diniz Santos, de 16 anos, que sai da escola com três colegas para ir ao supermercado, a menos de 50 metros, para comprar salgados e sumos. Diz o Diniz que em vez de ter retirado das cantinas e bares esses produtos, os Ministérios da Educação e da Saúde deviam ter substituído a proibição pela liberdade de opção.
"Não é normal comer snacks constantemente. Mas ter a opção de o fazer, quando nos apetece, acho que é justo. Fazerem a escolha por nós não me parece correto", diz este aluno, que, entretanto, volta a entrar na escola, com os colegas, munidos de alimentos que não encontram na cantina.
Já José Mendes diz que poucas vezes comia croissants, empadas ou batatas fritas na escola, porque sai sempre à hora do almoço e uma avó que reside nas proximidades garante-lhe uma refeição equilibrada. O jovem entende por que razão se tomou a decisão de retirar bolos, empadas, folhados e outros das cantinas e bares das escolas.
"Obesidade, talvez. E problemas como a diabetes, coisas assim do género. Porque a saúde das crianças é importante", diz.
Não há na escola – compra-se fora
Maria Carolina está encostada ao gradeamento da escola, à espera do toque de entrada. Para ela, a decisão do Ministério da Educação, em articulação com a Direção-geral da Saúde, é boa, porque ajuda a ter uma alimentação mais saudável, mesmo que possa pecar por não ter algum equilíbrio. É por essa falta de equilíbrio que muitos alunos procuram fora da escola o que nela já não existe. Assim, a preocupação desta aluna é mais com a segurança dos alunos, sobretudo os mais jovens, porque se na escola o ambiente é controlado, fora dela nem por isso.
"Não costumavam sair da escola e agora saem. Isso pode ser um caminho para começarem a fazer coisas mais perigosas. Comportamentos desviantes, especialmente em idades mais precoces", avisa.
Outra aluna garante que se não comem na escola, vão a outros sítios e “comem as porcarias na mesma".
A situação é de tal forma estranha que nem há interesse de entidades externas em gerir o bar da escola, como costumava acontecer, porque agora não podem vender o que lhes dava o lucro necessário para apostar no negócio.
Mas como diz o ditado, em terra de cego, quem tem olho é rei. E por isso, sabendo que muitos colegas saem para comprar comida, alguns alunos começaram a vender à fatia baguetes com manteiga de alho. Outros, como Manuel Sousa, têm nas mãos um tabuleiro com tostas mistas feitas em pão de forma, que fizeram – imagine-se – num dos locais mais improváveis.
"Foi nos laboratórios de Biologia da escola", explica Manuel. "Forneceram-nos o forno e nós fizemos as tostas e os pães de alho".
Se a metodologia é pouco ortodoxa, pelo menos o objetivo é salutar: conseguir dinheiro para uma visita de estudo aos Açores.
Problema agora está fora da escola
Quanto aos pais, regra geral, consideram a medida acertada. Ainda que alguns a apontem como radical. "Quanto mais saudável melhor, mas têm de arranjar condições, não é retirar as comidas menos saudáveis e nem sequer haver uma garrafa de água", diz uma mãe de um aluno desta secundária.
Mas a maioria sublinha que o problema não está na escola, mas fora dela.
"Penso que é um começo, mas eles comem noutros lados as mesmas coisas", diz uma mãe, depois de deixar o filho na escola. Outra admite que a filha reclamou por não poder mais comprar chocolates e salgados.
E há quem vá mais longe. "Fazia sentido se próximo das escolas não existissem pastelarias, estabelecimentos que vendem gomas e chocolates", alega uma encarregada de educação. "Eles podem sair da escola. E como não compram na escola, vão comprar noutro sítio".
E opções, como se vê, não lhes faltam.