Sínodo dos jovens questiona pastoral vocacional como sinónimo de “recrutamento”
19-06-2018 - 13:47
 • Ecclesia

A próxima reunião internacional de bispos tem como tema “Os jovens, a fé e o discernimento vocacional”. O documento de trabalho pede tolerância zero para casos de abusos sexuais.

O próximo Sínodo dos Bispos vai debater a necessidade de uma pastoral vocacional que ultrapasse a ideia de “recrutamento” de padres e religiosas, adianta o documento de trabalho da reunião internacional, divulgado esta terça-feira pelo Vaticano.

O texto questiona uma “visão redutora do termo vocação”, que cria um “forte preconceito nos jovens, os quais veem na pastoral vocacional uma atividade destinada exclusivamente ao ‘recrutamento’ de sacerdotes e religiosos”.

A 15.ª assembleia geral ordinária do Sínodo dos Bispos, com o tema “Os jovens, a fé e o discernimento vocacional”, vai decorrer de 3 a 28 de outubro deste ano, por decisão do Papa Francisco.

Na preparação para este encontro consultivo de representantes dos episcopados católicos, o Vaticano promoveu um questionário online e uma reunião pré-sinodal, com jovens de várias confissões religiosas, em março de 2018, acompanhada nas redes sociais por 15 mil pessoas.

As propostas que as conferências episcopais fizeram chegar à Santa Sé defendem uma visão diferente, na qual se fale da “vida como vocação” e se sublinhem elementos fundamentais para o crescimento dos jovens, dando um sentido à sua existência.

“O discernimento vocacional nesta direção assume os traços de um caminho de reconciliação com o próprio corpo e consigo próprio, com os outros e com o mundo”.

Os representantes dos episcopados católicos de todo o mundo, incluindo Portugal, vão ser chamados a refletir sobre “percursos de preparação para o matrimónio” e de acompanhamento de jovens casais, bem como propostas vocacionais para os que decidem ficar solteiros.

O texto apresenta as diferentes vocações que existem na Igreja como serviços e não como qualquer “privilégio”, na construção de uma “comunidade fraterna”.

O discernimento é proposto como instrumento que orienta a vida para a “santidade”, vendo na juventude um “salto qualitativo” quanto ao envolvimento pessoal nas relações e nos compromissos de cada um.

“Jesus pede aos jovens uma reconfiguração da sua própria existência: é um chamamento ao risco, a perder o que já foi adquirido, à confiança”, pode ler-se.

Tolerância zero para abusos sexuais

O texto divulgado pelo Vaticano sublinha ainda a preocupação das novas gerações com a implementação da “tolerância zero” para abusos sexuais e económicos na Igreja Católica.

Estes casos, assinala o texto, minam a credibilidade da instituição, que sofre ainda com a “falta de preparação dos ministros ordenados” para trabalhar com os jovens e a dificuldade de apresentar as suas posições doutrinais e éticas à sociedade contemporânea.

A Santa Sé pede às comunidades católicas que evitem a “tentação de culpabilizar os jovens” quando estes se distanciam da Igreja, que deve “empreender caminhos de conversão” para promover uma reaproximação.

“Mesmo quando são muito críticos, no fundo, os jovens pedem que a Igreja seja uma instituição que brilhe pela exemplaridade, competência, corresponsabilidade e solidez cultural”.

De várias conferências episcopais e dos próprios jovens chegaram propostas para uma Igreja “menos institucional e mais relacional”, capaz de “acolher sem julgar previamente”.

“Hoje os jovens procuram uma Igreja autêntica. Queremos dizer, especialmente à hierarquia da Igreja, que ela deve ser transparente, acolhedora, honesta, convidativa, comunicativa, acessível, alegre e interativa com a comunidade”.

O documento de trabalho de 2018 aborda a relação entre os jovens e a religião e a espiritualidade, que vai do “desinteresse e apatia” à busca de um sentido para a vida individual e coletiva.

“Emerge um novo paradigma de religiosidade, descrita como pouco institucionalizada e cada vez mais ‘líquida’, assinalada por uma radical variedade de percursos individuais, mesmo entre os que dizem pertencer à mesma confissão”.

Num contexto religioso marcado pela “variedade e as diferenças”, os jovens católicos confrontam-se com dificuldades ligadas a perseguições ou a tendências que querem remeter a prática da fé para o âmbito “puramente privado”.

Segundo o Vaticano, as novas gerações, em geral, mostram-se “abertas à espiritualidade”, mesmo que o sagrado não marque presença na sua vida diária; a diversidade de posições é igual quando o tema é a figura de Jesus, visto como “homem bom e referência ética” por quem não é cristão.

O Sínodo dos Bispos pode ser definido, em termos gerais, como uma assembleia consultiva de representantes dos episcopados católicos de todo o mundo, a que se juntam peritos e outros convidados, com a tarefa ajudar o Papa no governo da Igreja.