Mais competências para os municípios na gestão de escolas e de centros de saúde, mas sem terem poderes sobre os professores ou os médicos - esta é a regra genérica da proposta de lei que o Governo aprova esta quinta-feira, em Conselho de Ministros. A descentralização de competências os municípios, freguesias e entidades intermunicipais e é a reforma que todos – governo, partidos, autarcas e Presidente da República – dizem querer e que pode ser o ponto de maior consenso parlamentar.
Para conseguir esse consenso, o Governo já abdicou de um ponto que fazia parte do programa eleitoral socialista: a eleição directa dos presidentes das áreas metropolitanas e das comissões de coordenação e desenvolvimento regional (CCDR). E aposta apenas naquilo em que parece poder chegar a acordo com o PSD rapidamente que é a descentralização de competências do Estado central para os municípios e de forma a que esteja em vigor a tempo de os próximos autarcas, que hão-de ser eleitos no outono, já entrem em funções com novas competências.
É isso que o primeiro-ministro tem prometido. "O próximo ciclo dos autarcas a eleger em Outubro deste ano deve ser marcado por mais meios, mais competências e mais responsabilidades para poderem servir ainda melhor as suas populações", disse António Costa em Janeiro, numa homenagem aos autarcas socialistas.
E é isso também que o Presidente da República tem pedido. Num encontro, também em Janeiro, com presidentes de junta de todo o país, Marcelo Rebelo de Sousa defendeu que "não fará sentido deixar para a véspera das eleições a aprovação de legislação autárquica”. E acrescentou: “Este é o momento, estão reunidas as condições para um verdadeiro acordo de regime em termos de descentralização.”
Professores e médicos de fora
A proposta de lei, que será aprovada esta quinta-feira e que tem vindo a ser discutida com a Associação Nacional de Municípios e com o PSD, num processo conduzido pelo ministro adjunto Eduardo Cabrita, enquadra essa descentralização de competências em várias áreas, com destaque para a educação e a saúde.
Na área da Educação, as autarquias serão responsáveis pela gestão dos equipamentos escolares, desde o pré-escolar até ao secundário. Serão também responsáveis pelo pessoal não docente, mantendo-se o concurso nacional de professores nos moldes actuais.
Na Saúde, os municípios ficam com competências na gestão dos equipamentos afectos aos cuidados de saúde primários. Nestes dois sectores – que correspondem a dois grande ministérios – os professores e os médicos permanecem, contudo, sob alçada do Estado central.
Mas serão também transferidas competências nas áreas da protecção civil, segurança pública, acção social e gestão de áreas marítimas e de lazer, competências essas que, actualmente, estão dispersas por vários organismos do Estado. Um dos exemplos é o licenciamento de apoios de praia.
Antecipação do PSD
O PSD – que foi desafiado para esta reforma pelo primeiro-ministro no debate quinzenal de 7 de Dezembro – antecipou-se ao Governo e já entregou quatro propostas no Parlamento. A mais importante – um projecto de lei – propõe a descentralização de competências para as Câmaras e entidades intermunicipais nas áreas da educação, saúde, acção social, gestão florestal, gestão da orla costeira, medicina veterinária, saúde animal e segurança alimentar.
O PSD pretende, por exemplo, como o Governo,que sejam transferidas para as autarquias poderes na gestão das infra-estruturas dos agrupamentos de saúde, no recrutamento dos assistentes técnicos e operacionais, nas concessões e licenciamentos de equipamentos de venda ambulante em espaços balneares, na gestão de marinas e portos de recreio.
Os sociais-democratas querem ainda que as freguesias possam ter competências na fiscalização da actividade dos guardas-nocturnos, na realização de acampamentos ocasionais e de fogueiras e queimadas.
Municípios querem mais
Depois da aprovação da proposta do Governo em Conselho de Ministros, o processo, que tem sido conduzido pelo ministro adjunto Eduardo Cabrita passa, então, para o Parlamento, onde o PCP também já anunciou que pretende ter propostas.
O outro vértice desta negociação – e do consenso que todos dizem querer – são os municípios. Na véspera da aprovação em Conselho de Ministros, Eduardo Cabrita voltou a reunir-se com a Associação Nacional de Municípios, que no parecer que já fez sobre este assunto diz que as competências a transferir podem ser ainda mais amplas e devem corresponder a aumentos de financiamento.
A proposta do Governo e o projecto do PSD falam apenas em “meios necessários e suficientes” para o desempenho das novas competências transferidos através do Orçamento do Estado, mas a ANMP preferia uma alteração da lei das finanças locais que não deixasse os municípios dependentes de transferências casuísticas anuais.
Os municípios também pretendem que a descentralização de competências se faça mais rapidamente do que o previsto no plano inicial do Governo.