Três anos e meio depois do referendo que determinou a saída do Reino Unido da União Europeia, o Brexit está ainda longe de estar resolvido e marca o dia a dia daqueles que vivem no Reino Unido. Um bom exemplo disso é Duarte Mendonça, 34 anos, jornalista da CNN há nove, os mesmos que leva a residir no Reino Unido, e que ao longo do último ano tem estado quase diariamente à porta do número 10 de Downing Street, a residência oficial do primeiro-ministro britânico.
Quando nos encontrámos na sede da CNN International, no centro de Londres, o jornalista português pintou o cenário - e os desafios - de um dia típico passado na era Brexit.
“Passo muito tempo em Downing Street e em Abington Green também, em frente ao Parlamento, e os dois são cenários completamente diferentes. Downing Street é uma rua muito isolada, com barreiras que criam a área onde os jornalistas estão. É um dia um pouco estranho, porque estamos ali o dia todo a usar a porta da casa do primeiro-ministro, o 10 de Downing Street, como fundo, onde aparece o repórter com quem estou a trabalhar. Vemos pessoas a entrar e a sair do número 10 de Downing Street, que é só um ponto-chave porque lá dentro se passam muitas vezes os momentos derradeiros da política britânica”, conta Duarte Mendonça.
O produtor da CNN diz que é um dia “um pouco complicado, faz frio”, e chamam-lhe “o túnel de vento”. Não há casas de banho nem sítios para comer, “logisticamente acaba por ser complicado e, por isso, é um dos sítios para onde as pessoas mais odeiam trabalhar (risos). Para mais, o tempo de Londres não ajuda”, refere.
Já o Parlamento é diferente, explica Duarte Mendonça, “porque o espaço é muito mais amplo, há muitas equipas de media diferentes a trabalhar”.
“Depois é interessante ver também a dinâmica toda que há por trás, porque Downing Street é um espaço exclusivo, onde só se entra com convite ou passe de imprensa, ao passo que no Parlamento o público geral pode estar relativamente perto dos jornalistas. O típico dia começa cedo e acaba tarde, pelo meio entramos em direto uma a três vezes por hora e tentamos dar a melhor cobertura possível à história, num espaço de 24 horas que é o que o canal oferece.”
Em nove anos no Reino Unido, estas são as terceiras eleições que Duarte acompanha - as segundas que são convocadas como consequência do Brexit.
Mas não só por isso, esta campanha tem sido diferente das outras: “normalmente os trabalhistas e os conservadores são quem se destaca mais, mas sinto que tem havido mais ‘barulho’ dos partidos mais pequenos, como os Verdes, até porque as alterações climáticas têm sido um tema muito mais importante, mais presente e as pessoas têm outra consciência disso. E depois claro, o Brexit. Mas agora se calhar voltou-se a falar mais de outros temas como o estado do NHS, o Serviço Nacional de Saúde, ou a segurança nas ruas, não só pela ameaça do terrorismo, mas também por causa da onda recente de crime violento, principalmente em Londres. E depois tenho sentido também que há mais, não quero chamar jogo sujo, mas há muitos documentos que não deviam estar a sair cá para fora, que chegam às mãos dos partidos rivais e são divulgados”, reflete Duarte.
Para lá das eleições, o Brexit tem dominado a discussão pública e política nos últimos quatro anos alterando com isso também o ciclo noticioso: “sim, eu acho que não há dia em que não se fale de Brexit. Mesmo na CNN, que é uma cadeia televisiva americana. Nas televisões britânicas, como a BBC ou a Sky News ainda mais. A presença constante de jornalistas em Downing Street e no Parlamento são prova desse apetite, mas também do interesse internacional no Brexit”.
Dia 12 de dezembro, os britânicos vão a votos e se, para já, nenhum partido parece ter apoio suficiente para uma maioria absoluta, olhando simplesmente para a campanha, Duarte Mendonça não tem dúvidas de que Boris Johnson é o vencedor do ponto de vista mediático.
“Boris Johnson é o cabeça-de cartaz, porque é uma figura de muito mediatismo, não só aqui no Reino Unido, mas também fora. Para já porque o Boris foi mayor de Londres, e isso tem algum peso. E depois é uma personagem que é… aliás, é uma personagem! É extrovertido, é um excelente comunicador, tem um certo carisma e para o bem ou para o mal, são coisas que têm enaltecido a imagem dele. Sinto que se fala muito mais do nome dele do que dos rivais”, admite Duarte Mendonça, um jornalista português em Londres.