O presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, volta a justificar o caso do envio de dados de manifestantes a embaixadas com a falta de juízo crítico nos serviços da Câmara.
Uma falta de reflexão que chega até ao Parlamento de onde, depois de toda a polémica e do anúncio de mudança de procedimentos da Câmara, chegou um pedido de dados sobre a manifestação de polícias que ocorreu na segunda-feira.
Ainda a propósito do caso dos manifestantes, Medina, que é ouvido esta quinta-feira no Parlamento, ataca Carlos Moedas, o candidato do PSD, que acusa de fazer uma política de insulto e de não ter ideias
Fernando Medina, geralmente apontando como um dos eventuais sucessores de António Costa, diz que vai continuar a esperar sentado pela saída do primeiro-ministro e defende que Costa tem condições para continuar a liderar o PS e o país depois de 2023.
Dá por encerrado o caso da comunicação das manifestações às embaixadas?
Nós fizemos o que era a nossa obrigação e a nossa responsabilidade perante um erro grave que foi cometido ao nível dos serviços do município. Foi em primeiro lugar o reconhecimento desse erro, sem hesitações, sem ‘mas’, sem vírgulas, sem aquelas fórmulas que às vezes tendem a ver que a desvalorização do problema pode acontecer. Permitam-me esta nota pessoal. Eu venho de uma família em que os meus avós foram opositores ao antigo regime e ajudaram muita gente a sair do país. Os meus pais estiveram na clandestinidade. Eu sei bem o que é a expressão da palavra medo. Não eu próprio, porque nunca o senti, felizmente, mas sei bem o que é o sentimento do medo. Conheço relatos do tempo do medo, da perseguição de que as pessoas eram alvo pelas suas posições políticas. O que me toca, o que eu acho que é grave, o que me penaliza mais é sentir que a câmara de alguma forma contribuiu para um sentimento de receio e medo por parte de pessoas que estão no território português.
Que explicação encontra para que isso tenha acontecido? Para que tenha havido uma ordem do anterior presidente que não foi cumprida?
Encontro a explicação que já dei. Com a mudança da lei e a passagem para o município das competências - uma lei de 1974, pré-Constituição, do tempo do Vasco Gonçalves e do Presidente Spinola. A participação da Câmara no direito à manifestação na forma como a Constituição o coloca, que é um direito que não carece de qualquer autorização e a Câmara simplesmente é destinatária de comunicações, fez com que o processo ficasse muito desgraduado do ponto de vista interno. Isto era tratado ao nível de um gabinete de expediente, que recebia comunicações, digitalizava comunicações e reencaminhava comunicações.
Como se ninguém pensasse?
Sim, como se ninguém pensasse. Ninguém fazia nenhum juízo crítico. Quando se diz "há aqui uma entrega de dados a embaixadas", aconteceu no âmbito de um processo em que 7000 manifestações aconteceram numa década e o procedimento que foi seguido foi um processo em que a Câmara funcionava como elemento de comunicação e transmissão de informação e que muitas vezes o fez de forma inadequada, não cuidando de distinguir os dados. O procedimento normal que era adotado pelos serviços da Câmara era a digitalização do aviso que chegava por parte dos promotores e a sua remessa às entidades - polícias, entidades alvo da manifestação, representações diplomáticas quando era o caso. Era um processo que se repetia. Não tenho nenhuma explicação de malícia, de má intenção.
Mas é estranho que um despacho que era especificamente destinado àquele serviço tenha sido ignorado durante estes anos todos.
Conhecendo os meandros da burocracia e das rotinas dos processos, não me custava a crer que possa ter havido uma mudança de procedimentos logo num primeiro momento e, depois, até por solicitação das entidades que normalmente recebem essa informação, que tenha recomeçado a ser enviada, porque era assim que era feito. Em 2002 o governo civil fazia exatamente isso: pegava nos avisos, não sei se digitalizava ou enviava por fax, aliás a câmara era destinatária - sem que a lei o previsse. Nestes últimos dias, a propósito desta manifestação que aconteceu dos polícias, a Câmara de Lisboa recebeu uma solicitação dos serviços da Assembleia da República para que lhes fosse enviado o aviso da manifestação.
E foi?
Não, obviamente não foi. A rotina do funcionamento dos procedimentos que vem de muito tempo atrás, as máquinas vão reproduzindo. Um dos erros graves deste processo - e daí nós retirarmos a conclusão de reestruturação do serviço - é que este procedimento toca com direitos fundamentais das pessoas, que se sentiram atingidas em algo que para nós é da maior importância e que eu levo muitíssimo a sério, que é a liberdade de alguém se poder manifestar. E não é uma liberdade formal, é substantiva, alguém o poder fazer no nosso território sem medo.
Há uma resposta de 2019, dada pelo gabinete de comunicação a vários órgãos de comunicação social, sobre a transmissão de dados de manifestantes pró-Palestina, num protesto que se realizou, à embaixada de Israel. Estando o gabinete de comunicação sob a sua alçada direta, não lhe chegou ao conhecimento este caso?
A resposta que sai do gabinete de comunicação para os órgãos de comunicação social é referindo não a questão dos dados pessoais, mas a do envio para as embaixadas, não local da realização da manifestação, mas alvo. Talvez por essa razão não tenha suscitado particular questão. Não suscitou no município e não suscitou ninguém. Não me recordo de isto ser alvo de debate político nem na câmara nem na cidade, muito menos no Parlamento.
Havendo um caso tão flagrante de violação de um despacho que vem da autoridade máxima dentro da câmara, que é o presidente, o que é que isto diz da autoridade interna dos eleitos?
O que diz é sobre o funcionamento desse serviço concreto. Por esse serviço passaram vários responsáveis. Não houve ainda tempo de fazer essa análise mais fina de saber com que critério cada responsável tratou esta matéria ao longo do tempo, foram pessoas diferentes que estiveram e imagino que tenha havido práticas diferentes por parte das pessoas. Quem conhece o funcionamento das máquinas da administração, sabe que processos que são relativamente normalizados do ponto de vista burocrático, como era o caso deste. Só para termos uma ideia, estamos a falar de três a quatro manifestações por dia que entram. Muitas vezes o que se passa é rotina aplicada.
É automatismo.
É tratada da mesma forma uma manifestação sobre uma casa ambiental como foi esta, com a sensibilidade política. Esse é que é o erro, é isso que não pode ser.
Estão a circular nas redes sociais informações que dão conta de que o encarregado da proteção de dados da câmara quis intervir no gabinete de apoio à presidência e que lhe terá sido negado esse acesso com o argumento de que este gabinete não lidava com dados sensíveis. Também se diz que ele fez uma informação que lhe era dirigida e que terá desaparecido. O que é que responde a isto?
Isso é falso. Isso faz parte de uma campanha de notícias falsas, aliás as fontes que as têm posto a circular estão muito bem identificadas e é mais um exemplo do que tem sido a utilização deste caso para uma campanha de ataques pessoais, de mentiras, de insulto, de ataque político que eu quero rejeitar.
O responsável que foi exonerado já foi mesmo exonerado ou isto implica um processo interno?
Isto implica uma proposta ao executivo, que é composto pelos 17 vereadores. Será numa próxima reunião, obviamente que queremos fazer essa proposta com uma de proposta de nomeação do novo responsável, da nova equipa. A câmara juntou na mesma pessoa duas figuras que são diferentes. Tem um encarregado de missão para implementação do RGPD. Esta equipa tem de assegurar que os processos críticos estão identificados e, se houver obstáculos internos à identificação dos procedimentos críticos, tem de informar a nível superior. E depois há uma segunda figura que se acumula na mesma que é o Encarregado da Proteção de Dados que tem uma função diferente desta. Vamos fazer a separação das duas funções.
A auditoria que anunciou à robustez do sistema será feita por uma entidade externa? Quando é que podemos esperar resultados desse inquérito?
Não lhe posso dizer. A minha grande preocupação neste processo foi ter o diagnóstico da situação, informar com clareza, com verdade e com transparência a situação, e tomar as medidas para a corrigir. Começando pela medida mais importante, que é assegurar a cada um daqueles que viram os seus dados pessoais transmitidos indevidamente uma avaliação de segurança por parte dos serviços de segurança da República. Estamos a iniciar o contacto com cada uma dessas pessoas. Em segundo lugar, foi tomar as medidas internas para que isto não voltasse a acontecer, fazer as correções que são necessárias, quer ao nível da estrutura de missão, quer ao nível dos departamentos, quer ao nível dos próprios processos. Para assegurar que este rame-rame da burocracia que nos fez chegar aqui a este ponto, crítico do ponto de vista dos direitos das pessoas, não volte a acontecer. Agora há um trabalho mais de fundo, de avaliação, de varrimento de novo à câmara -- o primeiro já foi feito aquando da implementação do RGPD - para ver se há ou não há mais processos com lacunas que precisem de ser corrigidas. Espero poder lançá-lo já com o novo encarregado da equipa de missão, mas não lhe posso adiantar uma data para a conclusão.
Este tornou-se um caso político, que levou a vários pedidos de demissão. Demitir-se ou suspender as funções não lhe teria dado mais margem de liberdade e transparência?
Não, não teria dado. Não teria resolvido nada do problema, teria sido um número com efeito político e mediático e teria seguramente contribuído para que o problema não se resolvesse. Não se teriam promovido as mudanças. Eu assumo na íntegra todas as minhas responsabilidades, ao assumir ao problema, ao reconhecê-lo, ao pedir desculpas em nome do município, ao fazer algo que acho que é raro, que foi a rapidez com que se apresentam as verdades fundamentais. Há sempre auditorias mais perfeitas a fazer, há sempre coisas mais profundas a saber. A questão é: transmitir publicamente, a uma opinião pública que valorizou, e bem, o caso, o que é aconteceu, porque é que aconteceu e que não vai voltar a acontecer, esta foi a nossa preocupação. Nós agimos da forma como acho que devíamos agir. Em volta disto aconteceu um debate político que é absolutamente legítimo porque este é um assunto político. Mas depois levou a um aproveitamento político que, obviamente, pelo facto de estarmos na proximidade das eleições autárquicas e também pela fragilidade do discurso político dos opositores, faz com que tenhamos ouvido coisas do género. A primeira acusação, aliás, que ouvi do candidato do PSD é que nós estávamos ao serviço do regime de Putin. Isto foi dito. Convém não esquecer, não deixarei branquear e não me esquecerei desta. A primeira leitura política que foi feita, por parte do candidato do PSD à Câmara de Lisboa, foi que nós estávamos a agir ao serviço de Putin. O líder do CDS afirmou também que nós estávamos ao serviço de interesses estrangeiros e que havia uma subserviência relativamente a poderes externos. Não aceito e não deixarei que isto se desvalorize nem que se ignore. Isto foi uma tentativa de insulto pessoal, uma tentativa de ataque pessoal à honorabilidade.
Se não estivéssemos em ano de autárquicas não teria acontecido?
Isto diz muito sobre quem profere esse tipo de ataques. Revela bem a personalidade dessas pessoas e o estado de espírito com que estão nesta contenda autárquica. Uma coisa é o debate político, em que participo com responsabilidade, levo isto muitíssimo a sério. Isto é uma tentativa um pouco delirante.
Já antes deste caso, Carlos Moedas atacava a sua gestão na câmara dizendo que havia uma sombra de suspeição. E chegou mesmo a dizer em entrevista à Renascença que "há uma parte do PS que viveu sempre no Estado com uma ideia de amigos e de favores e que a história é clara sobre isso". Como é que responde a estas acusações?
As declarações posteriores, sobre o envio indevido de dados pessoais, colam muito bem com essa afirmação prévia. Toda a linha política do candidato do PSD nestas eleições resume-se a insulto e ataque pessoal. Esta linha só tem uma origem, que é a sua fraqueza, a sua fragilidade. Não sei se reparou que Carlos Moedas, sempre que pretende intervir sobre a cidade, não tem verdadeiramente nada a dizer. E isso de facto é uma dificuldade para quem quer ser candidato à principal câmara do país. A forma que ele arranjou para ultrapassar esse enorme vazio de ideias foi entrar numa campanha com esse nível. Esse tipo de linha diz muito mais do candidato do PSD do que de mim.
Como é que vai lidar em campanha eleitoral com as suspeitas ou com as investigações que existem e que envolvem, nomeadamente, o arquiteto Manuel Salgado?
Talvez por conhecer alguma coisa da natureza humana e também por ter alguma leitura de Eça de Queirós, confesso-lhe que este tipo de campanha não é para mim uma surpresa. Aqueles avisos pios, no início, de que ia ser uma campanha pela positiva, pela apresentação de ideias, não me pareceu que isso fosse durar muito. Aliás, não durou a primeira sondagem negativa para vermos transformar uma campanha política no pior que há em política. O slogan que se ajusta melhor seria "Velhos Tempos", porque aquilo é mesmo a velha forma de fazer política, é a forma que afasta as pessoas da vida política. Acho que Lisboa precisa e merece o debate de ideias, das propostas, das soluções para os desafios com que está confrontada e é aí que eu me quero concentrar. Sobre o caso concreto que referiu, nós apoiaremos todas as investigações em curso. Mas gostava de sublinhar um aspeto: várias, para não dizer as mais importantes, investigações que estão em curso, resultam de queixas feitas ao longo dos anos por parte desses mesmos partidos junto das autoridades. A tentativa de judicialização da política da cidade de Lisboa é algo que não vem de agora.
Ainda não apresentou a sua recandidatura, quando tenciona fazê-lo?
Depois da marcação das eleições é o tempo das decisões e da comunicação dessas decisões.
O que é que está por fazer?
Este mandato está marcado por um avanço em políticas centrais de transformação da cidade, que são três. A promoção de habitação acessível para jovens e classes médias, iniciámos uma nova geração de políticas, que é essencial ser prosseguida. Por outro lado, uma política de mobilidade que faça crescer significativamente o transporte coletivo de qualidade e acessível na área metropolitana, porque se não fizermos isso não conseguiremos fazer a gestão da mobilidade no município. Uma cidade como Lisboa que recebe diariamente uma população que é superior à residente não pode pensar que resolve o problema da mobilidade dentro das suas fronteiras. O terceiro pilar da transformação da cidade é a valorização do espaço público e dos espaços verdes, tornar Lisboa numa cidade cada vez mais saudável e amiga das pessoas.
Ainda que seja acusado de ser um bocadinho fixado nas ciclovias.
Nós tínhamos programas muito centrados numa lógica de mudança de filosofia da cidade e de valorização do espaço público e dos bairros, mas também na promoção de estilos de vida saudáveis. Se há lição que podemos tirar da pandemia sobre a construção da cidade é que nós devemos fazer isto mais rápido. Hoje, no nosso país, há cerca de 7000 mortes por ano que estão de forma direta associada à poluição. E nós podemos não fazer nada sobre isto? O próximo ciclo tem de ser marcado por uma aceleração deste processo de transformação da cidade, no espaço público, também na promoção da mobilidade ciclável. A mudança vai passar por cada um perceber que a criação das ciclovias é a criação de uma possibilidade adicional de um meio de mobilidade, que para ser efetivo tem de ser seguro. As ciclovias não são nenhuma obrigação, as bicicletas não são nenhuma obrigação, são um meio para quem o quiser usar. Isto é mais uma possibilidade de que todos beneficiam, mesmo aqueles que têm de continuar a usar o automóvel.
Já que estamos a falar de tirar carros da cidade, os novos autocarros da Grande Lisboa estão para chegar, é desta vez que os carros vão diminuir? E como é que estamos de parques para quem queira deixar o carro à entrada da cidade e se continua a queixar?
A melhoria do sistema de mobilidade vai ser gradual e depende, acima de tudo, de nós conseguirmos fazer aquilo que durante décadas não se fez: um sistema de mobilidade pesada e ligeira que permita as deslocações eficazes em transporte coletivo dentro de toda a área metropolitana. A força dos movimentos pendulares é enormíssima. A criação de parques de estacionamento dissuasores para resolver o problema do trânsito na cidade é uma ideia tão evidentemente ineficaz...
Não é para continuar a aposta nos parques dissuasores?
Deve haver parques junto às principais interfaces de transportes. Mas vamos ter noção da escala: entram por dias em Lisboa 340 mil automóveis. É uma fila de Lisboa até Paris. Se nós estivermos a falar de um parque como o do Marquês de Pombal ou do Corte Inglês, por exemplo, estamos a falar de mil lugares de estacionamento, acham que a solução é criar 300 parques iguais àqueles à porta de Lisboa?
Mas a câmara assumiu a estratégia de criar parques dissuasores.
E temos vindo a fazê-lo.
O que nos está a dizer é que a aposta tem de ser outra?
Nos transportes coletivos, claro. Achar que a criação de parques de estacionamento é a primeira ou a principal solução para o problema da mobilidade na cidade de Lisboa é um erro.
Levar o metro a Alcântara e o metro ligeiro a Oeiras e a Loures são projetos para esta década?
A expansão da linha vermelha do metro até Alcântara é um projeto que está inscrito no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). A execução terá de ser de tal forma rápida que terá de ser colocada até ao final de 2026. É um desafio muito grande para o metropolitano, mas tenho confiança que o façam. Para as outras linhas neste momento já estão contratados os estudos.
Isso não seria uma forma mais rápida de tirar carros da cidade? Porque é que não foi dada prioridade a Alcântara?
A linha circular tem uma importância grande sobre a eficácia de funcionamento do sistema. Tocam na linha circular todas as grandes linhas de operação do barco, do comboio, as outras linhas de metropolitano. Nós conseguimos num mandato não ter uma, mas duas linhas de metropolitano expandidas.
Porque é que não foi possível cumprir a sua promessa de mais seis mil casas de renda acessível?
Vamos concluir este mandato com o maior número de casas atribuídas em todos os programas municipais desde os mandatos de Jorge Sampaio e João Soares. Essas foram as épocas em que o trabalho feito entre a câmara e o Governo de Cavaco Silva permitiu a erradicação das barracas. Entre casas atribuídas e casas para as quais a câmara permitiu a bonificação da renda, vamos ter cerca de 3000 casas neste mandato. Destinamos a maioria destas casas para o regime de renda apoiada, isto é, para cidadãos de mais baixos rendimentos. E acabaremos o mandato com mais de mil casas em regime de renda acessível, quer através de propriedade municipal ou de atribuição de um subsídio de arrendamento. Isto é um avanço muito grande.
Ainda assim não será tão grande como queria e tinha prometido.
Este mandato autárquico foi muito atípico. No nosso programa não estavam apoios à economia, não estavam programas de testagem, nem centros de vacinação, nem enfermeiros, não estava todo o último ano e meio de resposta à pandemia que nos mobilizou. O que nós já fizemos e temos em marcha relativamente à renda acessível fará a diferença na cidade. O que nós temos é um pipeline de projetos já com grande impacto quantitativo. Neste momento, temos já aprovadas em câmara, já depois de dirimidas as questões que nos consumiram quase dois anos no debate com o Tribunal de Contas...
O Tribunal de Contas foi uma força de bloqueio?
Não, eu não lhe chamaria isso. Não vou repetir aqui a nossa história. A questão está ultrapassada. Temos já aprovadas duas operações, mais três que representam mais de mil casas, temos um pipeline de construção direta do município que está em fase de projeto de mais de 1200 casas.
Em relação aos sem-abrigo, a câmara tinha colocado a meta de resolver o problema. Presumo que a pandemia veio colocar problemas nesse sector. O que é que está em marcha para os sem-abrigo?
Quando nós aprovámos a nossa estratégia, em 2019, estávamos num momento de grande crescimento económico, e havia uma grande expressão dos casos mais difíceis, aquelas pessoas que estão em situação de sem-abrigo há mais tempo. Assumimos a estratégia de concentrar as energias no chamado housing first, em que se começa pela inserção através da casa, estabiliza-se a vida das pessoas e gradualmente se vão recuperando todas as patologias. Demos passos de gigante nesta estratégia. Passámos de 80 casas de housing first e já conseguimos aumentar, durante a pandemia, para 340 casas. Temos já contratado com as associações chegarmos às 400 casas, o que nos permitiria a cobertura integral do problema antes da pandemia.
Estamos a duas semanas do congresso do PS. Já pensou o que vai dizer no congresso?
Ainda não pensei. O congresso está muito marcado por dois factos: a reeleição do secretário-geral António Costa e a proximidade do ato eleitoral autárquico. Obviamente irei intervir nesse âmbito.
Na sua moção a este congresso, António Costa já fala na governação pós-2023. Acha que é possível o PS continuar no Governo?
Isso dependerá dos portugueses. Não há razões para que esta legislatura não se cumpra. Espero que consigamos virar a página da pandemia, começar a execução do plano de recuperação económica e social e depois os portugueses farão a avaliação em 2023.
Há um ano, o presidente do PS, Carlos César, dizia aqui numa entrevista à Renascença e ao PÚBLICO que os protocandidatos à liderança do PS deviam continuar a esperar sentados. Vai continuar a esperar sentado?
Isso eu concordo. Acho essa uma boa expressão. António Costa tem sido um muito bom secretário-geral do PS, mas acima de tudo tem sido um muito bom primeiro-ministro. É difícil imaginarmos alguém que fosse testado nas condições tão difíceis como ele está a ser testado na governação. O meu desejo, como socialista e português, é que ele se mantenha em ambos os cargos por muito tempo.
Para lá de 2023?
Para lá de 2023.