​Política europeia de asilo está a “depositar as pessoas” em campos de refugiados
21-11-2016 - 19:28
 • Ângela Roque

Diagnóstico da directora da Obra Católica Portuguesa das Migrações.

A actual política de asilo na União Europeia “está a empurrar as pessoas para os campos de refugiados, está a deixá-las depositadas, presas. Não há uma verdadeira solidariedade entre os Estados-membros”, diz a directora da Obra Católica Portuguesa das Migrações.

Eugénia Quaresma veio directa do aeroporto para a Renascença, depois de alguns dias de visita à comunidade portuguesa em Bruxelas e de ter participado, no dia 17, na reunião da Comissão dos Episcopados Católicos da União Europeia (COMECE), onde o tema central foi o dos refugiados e o seu acolhimento na Europa.

“Tivemos um momento de partilha dos diferentes países porque cada Estado-membro está a sentir a realidade migratória de maneira diferente”, explica à Renascença. “Há países de fronteira que têm uma pressão muito grande, muito diferente de Portugal, que está mais distante e pode preparar um acolhimento diferente.”

Um dos objectivos da reunião foi ver como é que, com esta experiência no terreno, organismos da Igreja Católica como a Cáritas e o Serviço Jesuíta aos Refugiados poderão influenciar as políticas europeias e ajudar os políticos a melhorar as leis, mostrando-lhes “as consequências que as suas políticas têm na vida das pessoas”.

Portugal é exemplo

A reunião serviu para mostrar que há problemas no acolhimento e depois ao nível da integração, domínio em que o caso português é considerado exemplar.

“O nosso modelo tem sido apontado como boa prática, porque prepara esta integração. Acolhe, mas também prepara cada família para ser integrada, incluída na vida de uma comunidade, e os ecos que vêm dessas famílias são felizes, permite as pessoas sonhar. Primeiro, damos abrigo, a segurança que precisavam, e, depois, permite que sonhem e pensem noutro tipo de vida”.

A reunião familiar dos imigrantes foi uma das preocupações manifestadas no encontro. “Já era uma preocupação quando falamos de emigrantes económicos, também o é quando falamos de refugiados”, porque actualmente há cada vez mais “mulheres que chegam, mas o marido ou os filhos ficaram para trás, na guerra”.

E há o grave problema das crianças – e foram mais de 100 mil as que no último ano chegaram sozinhas à Europa. “Há o risco do tráfico laboral ou sexual destas crianças. É uma questão que nos preocupa bastante, e não é por acaso que a próxima mensagem do Papa para o Dia Mundial do Migrante e do Refugiado [17 de Janeiro de 2017] é sobre esta atenção aos menores.”

Para Eugénia Quaresma, também aqui o trabalho da Igreja continua a fazer a diferença. “A presença da Cáritas e do Serviço Jesuíta aos Refugiados é uma tentativa de humanizar os campos de refugiados, que acabam por se uma prisão. Algumas crianças ficam muito tempo sem escola, sem actividade ou ocupação. Humanizar estes espaços é uma das tarefas que está a ser realizada, até com voluntários que partem de Portugal e vão para a Grécia, por exemplo. Estamos a falar de religiosos, mas também de muitos leigos, voluntários – porque falar de Igreja não é só falar de hierarquia”, sublinha.

Emigrantes portugueses atentos e empenhados

A directora da Obra Católica Portuguesa das Migrações aproveitou a deslocação a Bruxelas para contactar com as comunidades portuguesas e gostou do que viu. “São comunidades muito activas, cheias de vida e criativas.”

Percebeu “a importância da língua portuguesa como elemento unificador” e algumas dificuldades que existem. “A pastoral dos migrantes fala muito de hospitalidade e acolhimento e não é só o migrante económico que tem essa necessidade. Isso também acontece com os trabalhadores em mobilidade. Falei com professores e outras pessoas destacadas em trabalho na União Europeia e que também têm experiências de dificuldade e necessidade de acolhimento.”

Esta responsável não tem dúvidas de que as missões, ou comunidades católicas, desempenham um papel fundamental para quem emigra, que ultrapassa o papel evangelizador.

“Continuam a ser um ponto de encontro, fazem a ponte com o país de acolhimento, para as pessoas não ficarem isoladas”, diz. E continuam a ser fundamentais no alerta e ajuda que dão aos mais desprevenidos, que partem sem saber muito bem ao que vão. “Isso continua a acontecer, continua gente a chegar, desinformada”, por isso, “essa preocupação e esse alerta mantém-se”, explica Eugénia Quaresma.

Esta entrevista foi emitida no espaço informativo das 12h00 da Renascença desta segunda-feira. Todas as semanas, à segunda-feira, este espaço conta com notícias sobre religião