O Presidente da República chumbou a proposta de PSD e PS para limitar a realização de debates sobre questões europeias a dois por ano.
Esta foi uma das alterações que os dois maiores partidos aprovaram nos últimos dias da sessão legislativa e que merece o veto de Marcelo Rebelo de Sousa. O Presidente vetou o diploma e escreveu ao presidente da Assembleia da República, explicando os motivos que o levam a discordar desta alteração à Lei nº46/2006, relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia pelo Parlamento no âmbito do processo de construção da União Europeia.
Marcelo Rebelo considera que o momento da alteração é errado, uma vez que estamos a quatro meses do início da Presidência portuguesa da UE, mas também porque considera que não são suficientes dois debates por ano em plenário: se é certo que o Presidente não quis pronunciar-se sobre o fim dos debates quinzenais por serem matéria do Regimento parlamentar e competência exclusiva da Assembleia, o facto é que essa alteração implica nos debates que antecedem as reuniões do Conselho Europeu, que eram quase precedidos desses debates quinzenais.
Para o Presidente, "dois debates não são seis ou mais" (como até agora), "porque a comissão parlamentar não é plenário" e a prática tem revelado que achar que um debate semestral é suficiente é uma "visão simplificadora". Mas diz mais Marcelo Rebelo de Sousa, que considera que a leitura mais óbvia desta alteração proposta é a da "desvalorização dos temas europeus e do papel da Assembleia da República perante eles".
Termina esta mensagem dirigida a Eduardo Ferro Rodrigues solicitando que a Assembleia da República pondere se não é "no mínimo politicamente mais adequado prever mais um debate em plenário, a meio de cada semestre".
O texto final aprovado no Parlamento apenas com os votos do PSD e do PS prevê a redução dos debates preparatórios dos Conselhos Europeus para apenas dois debates em plenário por ano.
Presidente veta também nova Lei do Mar
Marcelo devolveu também à Assembleia da República a nova Lei do Mar para que o parlamento clarifique pontos específicos do diploma, assinalando que estão ressalvadas a soberania do Estado e as normas constitucionais.
Em nota no sítio da Internet da Presidência da República, lê-se que Marcelo Rebelo de Sousa “devolveu, sem promulgação o decreto sobre a primeira alteração à Lei n.º 17/2014, de 10 de abril, que estabelece as Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional".
O chefe de Estado considerou não existirem "razões suficientes" para enviar o diploma para fiscalização preventiva junto do Tribunal Constitucional porque é ressalvada “a primazia da integridade e da soberania do Estado”, bastando dois aditamentos à legislação em causa.
Porém, Rebelo de Sousa entendeu “dever merecer reflexão complementar e precisão acrescida" os pontos "respeitantes a poderes secundários, pacificamente entendidos como delegáveis”.
Por outro lado, ganhar-se-ia "em exigir que os procedimentos de codecisão constem – ao menos no seu traçado essencial – dos instrumentos de ordenamento previstos no n.º 3 do artigo 8.º, assim garantindo a conjugação entre Estado e regiões autónomas na definição desse traçado”, aconselhou o Presidente da República.
Marcelo Rebelo de Sousa defende ainda que “será importante ressalvar as matérias relativas à integridade e soberania do Estado, mediante aditamento final”, segundo a carta enviada ao Presidente da Assembleia da República.
A nova Lei do Mar foi aprovada em 23 de julho, com os votos a favor de PS, PAN e Iniciativa Liberal e as abstenções do PSD, BE, PCP, CDS, “Os Verdes” e Chega.
Outros 12 deputados socialistas, incluindo a ex-ministra do Mar, Ana Paula Vitorino, assinaram uma declaração de voto, apelando ao veto presidencial da proposta que partiu da Assembleia Legislativa Regional dos Açores.
Segundo aqueles deputados a mesma "enferma de vícios de natureza política e jurídica" ao criar "uma fratura na soberania nacional, estabelecendo "um conceito específico de território autónomo que transforma o mar português, em matéria de ordenamento e gestão, num somatório de três espaços marítimos, o dos Açores, o da Madeira e o do continente".
Ascenso Simões, Jorge Lacão, Marcos Perestrello, Pedro Bacelar de Vasconcelos, Pedro Cegonho, Sérgio Sousa Pinto, José Magalhães, Rosário Gamboa, Alexandre Quintanilha, Jorge Gomes e Bruno Aragão foram os parlamentares do PS signatários do texto.
No mesmo dia, o presidente do Governo dos Açores classificou o “sim” do parlamento ao articulado como "histórico" para as regiões autónomas e o país no seu todo.
"Este é verdadeiramente um dia histórico para os Açores, por vários motivos, para as regiões autónomas em geral e para o nosso país. Aquilo que esta lei consagra não é mais nem menos do que a concretização de um princípio que está inscrito desde 2009 no estatuto político-administrativo dos Açores, quando se refere à gestão partilhada em relação ao mar", declarou Vasco Cordeiro.