Desde que iniciou os seus trabalhos, em janeiro, a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa já recolheu 424 testemunhos de alegadas vítimas, incluindo oito casos que foram enviados pelas comissões diocesanas. O novo balanço é avançado pelo presidente da Comissão, Pedro Strecht, esta terça-feira.
Em conferência de imprensa, este responsável confirmou que dos testemunhos recolhidos só 17 foram enviados ao Ministério Público, e adiantou que há outras 30 denúncias em estudo com possibilidade de virem também a ser comunicadas. Isto significa que, até ao momento, dos 424 testemunhos recolhidos, e a menos que surjam novos dados, 381 foram considerados prescritos, ou seja, quase 90%.
Álvaro Laborinho Lúcio, membro deste grupo de trabalho, garantiu ainda que a comissão independente não transmite “nenhuns dados nem à CEP, nem às comissões diocesanas”. “A única entidade a quem transmitimos alguns dados é ao Ministério Público, exatamente no caso de os testemunhos configurarem a prática de um crime e estarem possivelmente dentro do prazo de procedimento criminal. Digo 'possivelmente' - não somos nós quem julga a prescrição, damos sempre uma margem de erro e enviamos ao Ministério Público alguns casos que na nossa perspetiva estarão prescritos, mas deve ser o Ministério Público a dizê-lo”, afirmou o antigo ministro da justiça.
Entre as alegadas vítimas há mais rapazes do que raparigas, e todas pedem um pedido de perdão por parte dos abusadores, bem como da hierarquia da Igreja Católica. Várias situações reportadas à Comissão cruzam informação idêntica, o que reforça consistência dos depoimentos, tendo sido referido que em alguns locais “atingiram proporções endémicas”.
A Comissão Independente conta fechar o relatório final no prazo previsto (dezembro) e fazer a sua apresentação pública a 31 de janeiro de 2023. De acordo com Pedro Strech, o documento incluirá recomendações.
A Comissão referiu, ainda, que já foram concluídas as entrevistas aos bispos das várias dioceses, e que foram igualmente realizadas a uma amostra dos dirigentes de institutos religiosos.
No final de março, a Comissão mandatou um grupo para estudo dos arquivos diocesanos, que enviou um inquérito relativo aos casos de abusos, e as respostas têm chegado “a bom ritmo”. Na segunda fase do processo, o grupo propôs reuniões presenciais, e na terceira será feita a análise presencial dos documentos em cada diocese.
Sobre o memorial de homenagem às vítimas, que a Comissão propôs que venha a ser criado, foi convidado o arquiteto Álvaro Siza Vieira que se disponibilizou para o executar ‘pro bono’.
A Comissão Independente renovou o apelo a que todos os casos de suspeita de abuso sejam denunciados através dos meios disponibilizados em https://darvozaosilencio.org/