O desafio de Paulo Rangel à liderança de Rui Rio, após as autárquicas de setembro, é visto por alguns como um “remake” da luta no interior do PS, quando António Costa quis tomar a liderança a António José Seguro. Mas será que é replicável ao que se vai passar agora no PSD?
“Há uma comparação evidente entre António José Seguro e António Costa e entre Rui Rio e Paulo Rangel, com uma diferença. Enquanto no PS António Costa era um velho militante socialista, um político profissional, que escolheu quase exclusivamente o melhor momento para se apresentar a candidato a secretário-geral e acabou por derrotar António José Seguro, no PSD é diferente. Rui Rio, muito embora com uma experiência local, é muito mais veterano no PSD do que Paulo Rangel. Ele vai apresentar-se a candidato a primeiro-ministro como maior indicador de notoriedade do que Rui Rio, mas serão os militantes do PSD a decidir”, analisa o politólogo António Costa Pinto.
Em 2014, o PS acabara de ganhar as eleições europeias, mas com uma vitória que o setor “Costista” classificou de "poucochinho". A pressão sobre Seguro aumentou e, meses mais tarde, o atual primeiro-ministro assumiu que a luta pela liderança era para valer. O resto da história é conhecida.
Em 2021, o PSD não ganhou as autárquicas, mas saiu com um balão de oxigénio gigante e a possibilidade de cavalgar a ideia de que o ciclo político pode estar a mudar. As vitórias em Lisboa e em Coimbra, sobretudo, são fatores para olhar com confiança na recuperação do partido nos centros urbanos, onde o partido estava a perder eleitorado de forma sustentada.
Ainda assim, Rangel, que há muito começou a fazer o trabalho de bastidores em concelhias e distritais, saltou para a ribalta para se assumir como candidato. Quer ser o "challenger" de Costa em 2023.
A dificuldade de ser líder da oposição
O mesmo Costa Pinto argumenta que nos grandes partidos em Portugal, quer no PS quer no PSD, muitas vezes a sobrevivência dos líderes na oposição é difícil.
“Às vezes, dependendo de fatores mais conjunturais do que estruturais, os líderes que sobreviveram na oposição por longos períodos acabam por não chegar a ser candidatos a primeiro-ministro. Isso aconteceu com António José Seguro no PS, mais recentemente, e poderá acontecer com Rui Rio no PSD”, argumenta.
Outro investigador de ciência política, Adelino Maltez olha para a disputa anunciada no PSD com uma imagem bem popular. “Isto é um problema do pote. De vez em quando, mesmo sem sinais de mudança política fundamental, ficam fartos de um estilo de comando, e apostam noutro homem que exprima mais vontade de poder”, refere.
O mesmo crê que no PSD acontecerá “um desafio entre estilos, e o estilo é o homem”. “Não há alteração de políticas. Há quem esteja cansado do estilo de Rui Rio e aposta no desafiador. São duelos quase feudais em torno do ‘eu represento melhor o PSD do que tu’”, sublinha Maltez.
Na mesma linha de opinião, o investigador do Instituto de Ciências Sociais (ICS) António Costa Pinto argumenta que “longos períodos na oposição são um problema duplo”. Primeiro, “conseguir controlar a comunidade militante de que são portadores de uma alternativa política” e, muitas vezes, serem fatores externos à liderança política que os leva ao poder.
“Mas a tendência para os líderes serem desafiados é um clássico no PS e no PSD”, avalia.
Para este politólogo, Rui Rio talvez tenha uma diferença em relação a António José Seguro e outros “o facto de ter sido um líder permanentemente desafiado”.
“Foi desafiado desde o primeiro momento em que assumiu a liderança do partido. Teve um ligeiro intervalo e volta a ser desafiado quando há a inversão ou perceção da inversão das tendências eleitorais dos portugueses.”
Ser do Porto é handicap?
Rui Rio queixa-se com frequência que o facto de ter feito a sua carreira política no Porto é um fator que o prejudica junto dos comentadores e jornalistas de Lisboa. Adelino Maltez e Costa Pinto dizem que esse argumento não cola a esta disputa.
“Ambos vêm do Norte, das estruturas partidárias do concelho do Porto, mas têm percursos muito diversos. Neste caso, e muito embora Rui Rio se queixe, que a marca regional do Norte lhe causou alguns problemas, a verdade é que Paulo Rangel teve um perfil de carreira bem mais cosmopolita e apresenta-se como alguém que como candidato a primeiro-ministro tem uma experiência política mais diversificada do que a de Rui Rio”, começa por dizer Costa Pinto.
“Não se trata apenas da marca regional, mas fundamentalmente que Paulo Rangel terá maior potencial junto da sociedade portuguesa do que a de Rui Rio. Mas quem vai decidir são os militantes do PSD e não a sociedade portuguesa”, remata o politólogo.