O ex-ministro do Ambiente João Pedro Matos Fernandes é suspeito de corrupção passiva e prevaricação no caso do lítio e hidrogénio, com o Ministério Público (MP) a apontar suspeitas à sua atuação relativamente ao consórcio H2 Sines.
Segundo a indiciação do Ministério Público (MP), a que a Lusa teve acesso, Matos Fernandes, que não foi constituído arguido, terá no ano 2020 - em conjunto com o ministro das Infraestruturas e então secretário de Estado da Energia, João Galamba - imposto ao Resilient Group a integração das empresas REN, EDP e Galp no seu projeto de hidrogénio verde designado Green Flamingo.
Em julho desse ano, João Galamba, que já é arguido no processo, acaba por afastar o Resilient Group, sob o argumento de que se identificaria com o consórcio H2 Sines, assente na REN, EDP e Galp. A estas empresas juntaram-se depois a empresa portuguesa Martifer e a dinamarquesa Vestas, sendo que o MP considera indiciado que Matos Fernandes colaborou após deixar o Governo com a Copenhagen Infrastructures Partner, na qual a Vestas investiu.
Os procuradores indicaram ainda que o ex-governante foi também entretanto contratado como consultor pela Abreu Advogados, escritório que presta assessoria jurídica à Copenhagen, e que manteve contactos considerados suspeitos com o chairman da Martifer, Carlos Martins.
O nome de Matos Fernandes surge associado também a suspeitas na concessão da exploração de lítio na mina do Barroso, no concelho de Boticas, à empresa Savannah. De acordo com os procuradores, o ex-ministro -- em ação concertada com João Galamba e Rui Oliveira Neves, então diretor da Galp (e um dos cinco detidos no âmbito desta investigação) -- terá imposto de forma indevida a entrada da petrolífera na participação da Savannah Lithium.
A atividade de Matos Fernandes está ainda a ser investigada em relação à aprovação de legislação sobre a gestão de resíduos, uma vez que a Abreu Advogados assessora empresas deste setor e a Associação das Empresas de Gestão de Resíduos não perigosos (APERA), sendo este um setor que estava integrado na sua tutela.
O MP entende também que o ex-ministro terá prejudicado o combate à seca em favor de um melhor resultado do PS nas legislativas de 2022. Matos Fernandes tinha sido alertado para o agravamento da seca no dia 17 de janeiro e apenas convocou a comissão permanente da seca - com vista a parar a produção de energia em cinco barragens e a cessação da utilização de água para rega na albufeira de Bravura - a 01 de fevereiro, dois dias depois das eleições.
Além destas matérias, a indiciação aponta igualmente que o antigo governante impôs os nomes dos arquitetos Inês Lobo e Alexandre Alves Costa no júri do concurso para a construção da nova ponte do metro do Porto sobre o rio Douro, como se estes tivessem sido escolhidos pela Ordem dos Arquitetos. Porém, os procuradores assumiram desconhecer ainda a motivação para esta atuação e os seus resultados.
A operação de terça-feira do MP assentou em pelo menos 42 buscas e levou à detenção de cinco pessoas: o chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vítor Escária, o presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, dois administradores da sociedade Start Campus, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, e o advogado Diogo Lacerda Machado, amigo de António Costa.
O ministro das Infraestruturas, João Galamba, e o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, foram constituídos arguidos.
Este processo visa as concessões de exploração de lítio de Montalegre e de Boticas; um projeto de produção de energia a partir de hidrogénio em Sines, e a construção de um "data center" na Zona Industrial e Logística de Sines pela sociedade Start Campus.
O primeiro-ministro, António Costa, que apresentou a demissão na terça-feira, é alvo de uma investigação autónoma do MP num inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça, após suspeitos terem invocado o seu nome como tendo intervindo para desbloquear procedimentos nos negócios investigados.