Lar do Comércio. Ex-responsáveis condenados por 18 crimes de maus tratos
19-03-2024 - 10:55
 • Renascença

Tribunal condenou ex-presidente e antiga diretora de serviços a penas de seis anos e seis meses de prisão.

O Tribunal Judicial de Matosinhos condenou, esta terça-feira, dois antigos responsáveis do Lar do Comércio, avança o jornal Público. Em causa estão 18 crimes de maus tratos a idosos que residiam naquela instituição, em Matosinhos.

Segundo adianta o jornal, o ex-presidente da direção e a antiga diretora de serviços foram condenados a uma pena de seis anos e seis meses de prisão.

O Lar do Comércio também foi acusado e condenado a uma multa de 510 mil euros por má qualidade dos serviços prestados.

Os dois arguidos e a Instituição de Particular de Solidariedade Social (IPSS) estavam acusados de 67 crimes de maus-tratos, 17 dos quais agravados pelo resultado morte.

Em janeiro, nas alegações finais, o procurador do Ministério Público (MP) deixou cair 49 crimes, entre os quais 17 agravados pelo resultado morte, por considerar que quanto a estes não existe "nexo de causalidade", mas pediu uma pena de prisão efetiva e "exemplar".

Sublinhando a especial vulnerabilidade e dependência dos idosos, o MP considerou que neste caso "verificou-se uma falta de humanidade".

À data, o MP entendeu dar como provados 18 crimes, tendo pedido ao coletivo de juízes que preside ao julgamento uma "pena exemplar e efetiva".

Em abril de 2022, o Tribunal de Instrução Criminal de Matosinhos decidiu levar a julgamento o antigo presidente da direção, hoje com 80 anos, a ex-diretora de serviços, de 49 anos, e a própria Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS).

Segundo a acusação do Ministério Público (MP), entre janeiro de 2015 e fevereiro de 2020, os arguidos "violaram os deveres inerentes aos cargos que ocupavam" porque "apesar de saberem que a instituição dispunha de meios económicos para o fazer, por razões de diminuição e contenção de gastos", não contrataram médicos, funcionários e enfermeiros necessários "para assegurar o conforto e cuidados mínimos aos utentes".

Deixaram também de comprar equipamentos, mobiliário e produtos de higiene e terapêuticos, como apósitos para escaras, colchões antiescaras, fraldas e suplementos proteicos.

Defesa vai recorrer

A defesa do ex-presidente e da ex-diretora de serviços do Lar do Comércio, hoje condenados por 18 crimes de maus-tratos a seis anos e meio de prisão, afirmou que vai recorrer da decisão do Tribunal de Matosinhos. .

À saída do tribunal, a advogada Filipa Elias adiantou aos jornalistas que "naturalmente" os seus clientes vão recorrer.
A advogada manifestou também estranheza quanto à decisão do coletivo de juízes, sublinhando que, no âmbito de um outro processo no qual se discutem essencialmente "os mesmos factos", os arguidos foram absolvidos.
"Há um outro processo que foi julgado neste mesmo tribunal, há duas semanas, e que culminou com a sua absolvição. Fundamentalmente são os mesmos factos", afirmou, referindo-se ao processo de um residente do lar que ficou de fora do julgamento que hoje terminou e no qual os arguidos foram absolvidos de outros 49 crimes de maus-tratos, 17 dos quais agravados pelo resultado morte.
O advogado que representa O Lar do Comércio, Nuno Pimenta, referiu que a decisão de recorrer será tomada após uma análise mais pormenorizada do acórdão.
O advogado considerou, contudo, que a decisão permite reter de imediato "uma consequência", a de que as "pessoas de uma instituição, seja ela qual for, têm de ter noção da sua responsabilidade e do poder que têm".
Lembrando que os factos em julgamento remontam ao período entre 2017 e 2020 e não dizem respeito à atual direção, a quem cabe agora assumir o pagamento da multa decretada pelo tribunal, Nuno Pimenta realçou que o acórdão refere que foram implementadas medidas para corrigir algumas situações deste que a atual direção tomou posse, em 2021.
"O Lar do Comércio com a nova direção é diferente. O Lar do Comércio que está descrito no acórdão não é o Lar do Comércio de hoje", defendeu, reconhecendo que a multa a que a instituição foi condenada vai refletir-se na nova gestão, que poderá ter de recorrer ao seu património imobiliário para cumprir o acórdão.
O advogado, que contrariamente à convicção do tribunal considera que neste caso "no máximo há negligência", admitiu aos jornalistas que algo estava mal na instituição, contudo questiona onde estavam os enfermeiros e os médicos que tratavam estes idosos que nunca viram as escaras, as lesões.

"Não vou dizer que algo podia estar mal, eu tenho a certeza de que algo estava mal. O relatório da Segurança Social existe e por isso mesmo é que a nova direção assumiu medidas que, por muito impopulares que fossem, eram necessárias para mudar todo o lar", afirmou, classificando como "retaliação" as queixas-crime em investigação contra a atual direção de O Lar do Comércio.

[Notícia atualizada às 15h30]