Ucranianos “com espírito em alta para defender o país”, enquanto hospitais se enchem de feridos
25-02-2022 - 14:04
 • Beatriz Lopes , Marta Grosso

A Renascença falou com uma ucraniana que vive em Portugal, mas mantém estreito contacto com o país de origem. “Num momento como este, quanto mais se alastra o silêncio dos familiares pior, é um sentimento de impotência”, revela, ao mesmo tempo que faz o retrato daquilo que lhe chega.

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Os hospitais ucranianos, nomeadamente em Kiev, estão a precisar de doações para fazer face às centenas de feridos que chegam, incluindo mulheres com crianças.

“Eles têm muitas muitas necessidades em termos de medicamentos, até em termos de roupa e bens essenciais, porque, além dos militares que estão a ser tratados, há uma grande maioria dos civis feridos”, conta Iryna Shcherbatyuk, uma ucraniana que vive em Portugal há 20 anos.

Tem uma amiga que faz voluntariado no hospital militar da capital e reproduz à Renascença o que ouve. “Os enfermeiros e os voluntários já estão sem dormir há muitas horas, porque há mesmo muitos feridos a necessitar de ajuda, incluindo muitas mulheres acompanhadas de crianças".

Iryna Shcherbatyuk mantém uma forte ligação e contacto permanente com os familiares que ainda estão na Ucrânia e com a ONG Philanthropy, onde estagiou em 2014.

Desde quarta-feira à noite que não recebe notícias de uma prima e teme o pior. Viktorya fugiu de Kiev com o marido e dois gatos e conseguiu chegar a Kaniv, a cerca de 150 quilómetros da capital. “Vejo que ela, desde as nove da noite, não está disponível nas redes sociais e o número ucraniano também não está disponível. A única coisa que sabemos é que a cidade onde ela está tem um ponto estratégico muito importante, que é uma fábrica de produção onde são feitas peças para os mísseis e sabemos que os russos estão a atingir também estes pontos estratégicos que possam ajudar a Ucrânia a melhorar o seu armamento. Por isso, tememos muito o que possa estar a acontecer”.

“Num momento como este, quanto mais se alastra o silêncio dos familiares pior, porque é um sentimento de impotência muito grande estarmos tão longe e não conseguirmos ajudar”, descreve.

Já outra familiar, mal houve os primeiros bombardeamentos, a minha prima pegou apenas no filho, em duas mochilas e saiu logo da capital”, conta.A restante família recebeu formação militar e foi mobilizada para defender o país – algo que muitos ucranianos decidiram fazer também, depois do apelo do Presidente.

“Tenho primos, tios e familiares que já estão a fazer parte da defesa territorial, que são as pessoas que foram treinadas por ex-militares ucranianos, e que vão estar a fazer a proteção de pontos estratégicos como escolas, hospitais e barragens”, refere à Renascença.

Iryna Shcherbatyuk explica que, se “as barragens forem atingidas e se isso acontecer na capital, toda a parte da margem esquerda estará sob risco de inundação e aí estaremos a falar de milhares de pessoas vítimas e de danos devastadores”.

A vontade de defender o país é grande e, por isso, muitos nem pensam abandonar a terra natal.

“As pessoas estão com o espírito em alta, porque querem defender o país. Tenho uma prima com duas gémeas de quatro anos e uma filha mais velha com 14 anos, mas ninguém quer sair porque aquela é a casa de todos; eles vão fazer todos os possíveis para ajudar os militares e na doação de bens”, diz, adiantando: “Tenho familiares que estavam como reserva já partiram para a linha da frente”.

A guerra na Ucrânia começou na madrugada de quinta-feira, com a invasão da Rússia. Os bombardeamentos não têm cessado e o país já alcançou um elevado grau de destruição.

Nesta sexta-feira, as autoridades de Defesa apelaram a todos que se juntem às tropas, independentemente da idade.

O Presidente ucraniano acusa a Rússia de atacar alvos civis e o ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano confirmou relatos de bombardeamentos a infantários e orfanatos, que podiam estar a ser usados como abrigos.

A Ucrânia já garantiu que irá reunir provas para submeter ao Tribunal de Haia.