Diogo prepara-se para mais uma feira de emprego. Em setembro decidiu que não iria fazer mestrado e está, desde então, a tentar entrar no mercado de trabalho.
É um dos 88 mil jovens portugueses com menos de 25 anos que, no final de 2017, estavam desempregados. O número corresponde a uma taxa de desemprego jovem de 23,9%, quase o triplo do desemprego global do país no ano passado (8,9%), segundo os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatísticas (INE).
Com 22 anos, Diogo Vale licenciou-se em Ciências e Tecnologias da Documentação e Informação, no ISCAP. À Renascença, conta que está habilitado para trabalhar em museus, bibliotecas, arquivos, gestão de base de dados, gestão de informação e programação. A área é vasta à partida, mas a procura não tem sido fácil.
"Não consigo encontrar nada", lamenta. "Já tentei coisas fora da minha área mas, mesmo assim, muitas vezes não tenho resposta ou dizem para deixar o currículo e depois nunca mais há 'feedback'."
Os obstáculos são vários. No caso de Diogo começam num curso de formação vasta mas que falha em especialização e acabam na sua falta de experiência, própria de quem acabou de sair da universidade. “Todos pedem experiência, mas ninguém dá possibilidade de a adquirirmos”, desabafa.
Portugal no top 6 do desemprego jovem
Portugal é o sexto país da União Europeia com a taxa de desemprego jovem mais alta. Apesar de os números terem vindo a decrescer desde 2013, ano em que a taxa chegou a superar os 40% em Portugal, a descida tem acontecido a um ritmo mais irregular do que a média europeia.
O economista João Cerejeira aponta vários fatores que ajudam a explicar porque é que um quinto dos jovens portugueses continua desempregado: desadequação entre a formação e as necessidades das empresas, expectativas desajustadas e falta de comunicação.
“Não há procura, por parte dos mais jovens, da formação que tem maior empregabilidade”, constata. Dá como exemplo o setor industrial, em que muitos empresários se queixam da dificuldade em encontrar mão-de-obra. Falta mais formação especializada, mas também falta uma mudança de mentalidades.
"É um problema semelhante ao que tínhamos há uns anos na agricultura. Os pais que, neste momento, têm mais de 50 anos e que trabalharam toda a sua vida no setor industrial desejam que os filhos sigam outra carreira que não na indústria.
Do ponto de vista cultural, apesar de as coisas estarem a mudar muito com a automação, continuamos a pensar que são profissões sujas e de grande esforço físico, o que as torna menos apelativas do que uma profissão na área dos serviços."
E pode ser tudo “um problema de comunicação”, assegura, ou neste caso de falta dela - quer “na divulgação das oportunidades de emprego entre as camadas mais jovens, quer no aumento da apetência dos jovens para voltarem a assumir ocupações na indústria”. Para o economista, é necessária uma maior ligação entre o sistema de ensino e os centros de emprego para contrariar isto.
Salários baixos na casa de partida
Beatriz Arnedo também tem 22 anos mas, ao contrário de Diogo, nunca teve de entregar currículos. Acabou a licenciatura em Ciências da Comunicação e foi convidada para trabalhar numa empresa na área de ciência política.
Com contrato assinado, recebe cerca de 1.000 euros por mês. “Posso considerar que sou uma exceção à regra. Muitos dos meus colegas estão a trabalhar sem contrato e não chegam sequer a receber um salário mínimo."
Os baixos salários oferecidos à entrada no mercado de trabalho são outro grande obstáculo para muitos jovens. O economista João Cerejeira faz as contas: “Se compararmos as vantagens de trabalhar - o salário - com as desvantagens em termos de custos associados ao trabalho - habitação e transporte - vê-se que o benefício líquido é relativamente reduzido."
Beatriz tem um salário superior ao dos amigos e é isso que lhe permite continuar a viver no Porto. Natural de Setúbal, conta que está a pagar 500 euros por mês por um T1. Mesmo assim, “é metade do meu salário”, conclui.
Que estratégias?
Com a crise financeira de 2008, jovens como Diogo e Beatriz passaram a representar o grupo etário que enfrenta o maior risco de pobreza na União Europeia. Dez anos depois, em janeiro deste ano, o Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgou um estudo onde se concluía que a desigualdade aumentou entre gerações na última década e que isso se tem traduzido, acima de tudo, em maior pobreza e desemprego para os jovens com entre 16 e 34 anos.
Face ao fenómeno, e para contrariar as suas "consequências adversas", a diretora-geral do FMI, Christine Lagarde, sugeriu no mesmo mês que devem ser criados novos impostos sobre a riqueza na UE para financiar programas sociais de apoio aos mais jovens.
A ideia é, até certo ponto, ecoada por João Cerejeira, que em entrevista à Renascença defende "medidas de diminuição do esforço fiscal por nível etário", sobretudo "numa fase inicial da vida profissional" - uma espécie de empurrão aos jovens que querem lançar-se no mercado de trabalho.
Sobre os setores que contrariam a tendência do desemprego jovem, o economista não tem dúvidas. "A área de maior vigor a nível de contratações e remuneração é a das novas tecnologias”, uma que acaba por estar bastante ligada à indústria da qual tantos fogem.