Faltam pouco mais de três meses para a Cidade do Cabo, na África do Sul, chegar ao “dia Zero” – o dia em que não haverá mais água para o abastecimento público. A data tem vindo a ser adiada devido ao esforço de poupança da população, mas pode mesmo chegar, a uma cidade com quatro milhões de habitantes.
Recentemente, foi decretado o estado de catástrofe natural. A Cidade do Cabo vive num quadro de seca extrema. A situação está a atingir o limite e o Governo sul-africano limitou o consumo de água a 50 litros por pessoa, por dia.
Restrições que alteram significativamente o dia-a-dia dos mais de quatro milhões de habitantes, como explica à Renascença o português Vitor Henriques.
Chefe de equipa de uma empresa de análise de risco da Cidade do Cabo, conta que, nesta altura, não pode usar mais do que os litros de água permitidos. Para conseguir isso, ele, a mulher e as duas filhas, “para lavar a louça” já não deixam “a água a correr”, colocam “baldes dentro tanques para a loiça”, fecham “as torneiras das sanitas”, e “passam a usar a água dos duches ou da loiça para as descargas”.
“Já faz parte da nossa vida. Já estamos a ficar habituados a isto”, admite, sublinhando que “esta situação tem afetado tudo. Há muitas empresas preocupadas. Por exemplo, as empresas que, ao final do dia, têm de lavar as suas instalações, têm grandes dificuldades. Os talhos não podem usar tanta água e estão a cremar restos de carne e ossos que vão sobrando. E tudo tem sido muito difícil”.
“Há quem, desde o principio, esteja a poupar, mas também há muita gente que não está a cumprir e não está a fazer o que tem de fazer”, lamenta.
Vitor Henriques assume que a população da Cidade do Cabo “está pronta para tudo”. “Há muita gente a comprar água. Está-se a vender muita água. Em casa já tenho 250 litros”, descreve.
E se o “Dia Zero” chegar? “Eu vou ter de ir buscar os 25 litros de água que vamos passar a ter direito por pessoa. Eu vou buscar 100 litros por dia, por mim, pela minha mulher e pelas minhas duas filhas”. A água não vai chegar às torneiras e “os pontos de abastecimento vão estar espalhados pela cidade e teremos de ir lá buscar a água. E isso vai afetar muito a rotina diária”.
As empresas já se estão a adaptar: “Na minha empresa, nós podemos trabalhar a partir casa. Vamos começar a fazê-lo desde já, para, nessa altura, conseguirmos ir buscar a água aos pontos de abastecimento. Porque pode ser a qualquer hora”.
A incerteza é ainda grande. Vitor Henriques reconhece que não sabe “como tudo vai ser organizado”. Por exemplo: “Se vai haver muitas filas ou não. Dizem que vão ser 200 pontos de abastecimento, mas não temos ainda a confirmação”.
Dúvidas e receios que se justificam numa cidade de quatro milhões de habitantes que pode ver as torneiras secar.