O economista João Duque considera que o pensamento económico do Papa Bento XVI "está centrado no bem comum". Na sua terceira encíclica - "Caritas in veritate" (caridade e verdade) -, o Papa emérito escrevia, em plena crise financeira, que a economia deve estar ao serviço do bem comum.
Mais do que uma crítica a modelos económicos, o economista e comentador da Renascença sustenta que Bento XVI expressou uma preocupação com a ética ao defender que não pode prevalecer apenas o lucro.
Segundo João Duque, “há aqui uma tentativa de fazer um exercício muito difícil, mas que é muito próprio e característico do Papa Bento XVI: o equilíbrio inteligente e culto entre a racionalidade e a fé, e a racionalidade que, depois, se impõe nas relações entre os homens, na vida do dia a dia, sem esquecer aquilo que é a sua relação com Deus”.
Para o economista, “isto é muito interessante, porque vem na sequência daquilo que é a sua preocupação, que é iluminar os homens: primeiro, orientando-os com uma primeira encíclica que ele escreveu, no sentido de orientar para a Palavra de Deus; depois, há uma segunda encíclica que segue nesse sentido, e vem equilibrar a orientação de Deus com a vida terrena. É este exercício entre o interesse individual e o interesse social, entre o privado e o bem comum, que é aqui exposto na encíclica da caridade na verdade”.
Ao publicar, em 2009, em plena crise financeira mundial, esta encíclica, apontando à necessidade de uma maior regulação, Bento XVI foi uma das vozes mais certeiras naquele momento, olhando para a atualidade.
“Aliás, vem até anteceder aquilo que são pressões muito fortes, no sentido das preocupações com o uso dos recursos e o esgotamento dos recursos sem fins de natureza social e, portanto, como uma preocupação com a sustentabilidade, com a preocupação da dependência excessiva do processo de globalização, que não tenha por detrás um interesse de bem comum e, portanto, há em toda a encíclica muitas linhas que são interessantes de ver, que são prenúncios daquilo que são ações hoje em dia muito fortes”, assinala.
João Duque nota que, atentando à conjuntura atual, o pensamento do Papa emérito reveste-se, por isso, de profunda atualidade.
“Diria, até, que ele antecipa e alerta os homens que conduzem o mundo para estes fenómenos. E, portanto, há aqui um equilíbrio muito bem feito e muito inteligente entre estas duas visões, chamando até a atenção para a questão da mobilidade do trabalho num mundo excessivamente aberto e global, que retira o trabalho de alguns e faz-nos, depois, depender de subsídios, o que lhes tira a liberdade e, no fundo, digamos, dignidade."
A partir desta segunda-feira, o corpo do Papa emérito estará exposto na Basília de São Pedro, para veneração e último adeus dos fiéis. O funeral realiza-se quinta-feira.