As contas do Estado lucram com a inflação. De certo modo, a própria inflação, com todas as injustiças que provoca, contribui para algum equilíbrio das contas públicas portuguesas. Mas importa não ter dúvidas sobre prioridades. O ataque à inflação é uma prioridade, até pelos males sociais que provoca.
Como informou na SIC o comentador Luís Marques Mendes, até outubro a receita fiscal do Estado estava 4,5 mil milhões de euros acima do previsto pelo Governo; a receita do IVA estava quase 1,6 mil milhões acima do previsto. Marques Mendes considerou que o Governo deveria ter ido mais longe do que o recente apoio de 240 euros às famílias mais vulneráveis.
Talvez, mas alargar o apoio a famílias da classe média (que M. Mendes não propôs) retirava-lhe uma característica importante, o de ser uma ajuda direcionada aos mais sacrificados pela inflação. É que medidas genéricas de mitigação dos efeitos da inflação arriscam-se a prolongar a alta dos preços, enraizando na sociedade a convicção de que a inflação veio para ficar durante largo tempo.
Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, defende que a prioridade deve ser reduzir a dívida do Estado. Até agora, vários indicadores mostram que os juros da dívida pública portuguesa não subiram perigosamente. Decerto que a dívida a dez anos já passou de 3%, mas mantem-se abaixo da dívida espanhola e da italiana para o mesmo prazo. Só que tudo pode mudar de um momento para o outro. Entende-se a prudência nesta matéria.
Foram tempos em que se acreditava que a inflação favorecia o crescimento económico. Hoje, porém, tornou-se claro que a inflação não só é uma fonte de injustiças sociais, como trava o crescimento económico. Sobretudo, naturalmente, quando a alta dos preços atinge dois dígitos. Mesmo para uma economia como a portuguesa, marcada por altos níveis de dívida pública e privada, a inflação é um obstáculo a enfrentar.