Desta vez, as sondagens acertaram: o partido democrático conquistou a maioria na Câmara dos Representantes e o partido republicano manteve (e até alargou) a maioria no Senado. Trump passará a ser mais vigiado. Poderá recandidatar-se e ser reeleito daqui a dois anos. Mas terá de contar com a crescente participação das mulheres na vida política – e a maioria das mulheres americanas não terá motivos para simpatizar com Trump, um machista primário. E deverá ter reparado que, nos subúrbios de algumas cidades, brancos da classe média alta, que tradicionalmente votavam nos republicanos (tendo elegido Trump há dois anos), agora passaram a votar no democráticos.
Estas eleições intercalares reforçaram a profunda divisão política dos americanos. Não era isso que acontecia ainda no tempo da guerra fria. Havia então conservadores e progressistas nos dois grandes partidos. Antes, com A. Lincoln, líder do partido republicano, depois de uma sangrenta guerra civil foi legalmente abolida a escravatura. E o partido democrático tinha, até há poucas décadas, uma forte implantação no Sul racista dos EUA. Hoje, quase todos os sulistas racistas passaram para o partido republicano.
Praticamente desapareceram do Congresso os acordos entre republicanos e democráticos, políticos que no passado frequentemente se juntavam para fazer aprovar uma qualquer medida legislativa. De certa maneira, o sistema político dos EUA está bloqueado, levando a uma brutal queda no prestígio do Congresso, que se tornou pouco produtivo.
Durante a guerra fria era na Europa que se registavam as maiores divisões políticas, entre anticomunistas e simpatizantes do comunismo soviético. Tudo mudou com o colapso político e geoestratégico do comunismo. Agora há importantes divisões na Europa, mas são outras – entre eurocéticos e europeístas, entre xenófobos e pessoas abertas à imigração (que o envelhecimento populacional torna indispensável), entre adeptos da democracia liberal e simpatizantes de autocratas, como Putin, etc.
Tudo indica que Trump, na segunda metade do seu mandato, longe de tentar unir os americanos, os vai dividir cada vez mais. Basta reparar na maneira como ele fala – ou melhor, insulta – os seus opositores do partido democrático. Além disso, inventa fábulas mirabolantes sobre os seus adversários, que ele considera serem inimigos. Aliás, como o “Financial Times” ontem observava, o presidente americano conta como inimigos também os jornalistas, os imigrantes, os serviços secretos do seu país, as chamadas elites, etc. Tudo isto incentiva um clima de violência na sociedade americana.
A base eleitoral que apoia Trump adora o estilo dele. O problema nem é tanto aquilo que Trump faz – aí a democracia americana tem alguns travões que funcionam. O pior é a agressiva retórica deste presidente, que constantemente recorre à mentira como arma de combate político.
Convém, entretanto, recordar que Bill Clinton e Barack Obama, nos seus primeiros mandatos, perderam a maioria na Câmara dos Representantes e dois anos depois foram reeleitos presidentes. Poderá acontecer também com Trump.