A desinformação é o principal risco e alterações climáticas a maior preocupação. O relatório de 2024 do Global Risks Report, divulgado esta quarta-feira, é pessimista e deixa vários alertas.
A maioria dos inquiridos - especialistas em riscos globais, decisores políticos e líderes da indústria - apresentam uma perspetiva negativa para o mundo a curto prazo.
Outros 30% “preveem uma maior probabilidade de ocorrência de catástrofes a nível mundial nos próximos dois anos”.
Já “quase dois terços preveem o mesmo nos próximos 10 anos”, refere este trabalho preparado para o Fórum Económico Mundial pela Marsh McLennan e pela Zurich.
A análise a mais de 1.400 entrevistas permite ainda antecipar que “a cooperação em questões globais urgentes poderá ser cada vez mais escassa, exigindo novas abordagens para responder aos riscos”.
Dois terços dos especialistas mundiais preveem que, na próxima década, “será desenvolvida uma ordem multipolar ou fragmentada, na qual as médias e grandes potências se confrontam e estabelecem – mas também impõem – novas regras e normas”.
É uma consequência da lenta redução dos progressos no desenvolvimento humano, o que deixa os Estados e os indivíduos vulneráveis a riscos novos e ressurgentes. “Num contexto de mudanças sistémicas na dinâmica do poder global, no clima, na tecnologia e na demografia, os riscos globais estão a levar ao limite a capacidade de adaptação do mundo”, refere o documento.
Eleições, desinformação e conflitos
No topo dos principais riscos assinalados para 2024 estão as preocupações com uma crise persistente do custo de vida, os riscos interligados de desinformação e informação falsa impulsionados pela inteligência artificial (IA) e a polarização social.
Os peritos inquiridos avisam que “a relação entre a informação falsa e a agitação social ocupará uma posição central nas eleições em várias economias importantes que deverão ter lugar nos próximos dois anos”. É o caso dos Estados Unidos e da Rússia.
Destaque ainda para os conflitos armados interestaduais, entre as cinco principais preocupações para os próximos dois anos. “As tensões geopolíticas e o risco de erosão da resiliência social estão a criar um contágio de conflitos”, defendem.
A marcar os próximos anos está ainda a “incerteza económica persistente” e as “crescentes clivagens económicas e tecnológicas”. Situações que contribuem para a “falta de oportunidades económicas” no curto prazo e “obstáculos à mobilidade” no longo prazo. Os países mais vulneráveis deverão ficar ainda mais isolados do investimento, das tecnologias e da criação de emprego. Em consequência, “os indivíduos podem ser mais propensos ao crime, à militarização ou à radicalização”.
Outro risco, que aliás se tem vindo a repetir, são as alterações climáticas. Dois em cada três especialistas estão preocupados com a ocorrência de eventos extremos durante este ano.
Metade dos 10 maiores riscos para a próxima década são ambientais: as condições climáticas extremas, as alterações críticas dos sistemas terrestres, a perda de biodiversidade e o colapso dos ecossistemas, a escassez de recursos naturais e a poluição. Ainda assim, não é consensual a urgência destes riscos, no setor privado prevalece a opinião de que estes riscos vão materializar-se mais tarde.
É preciso novas respostas
O relatório de 2024 apela aos líderes para que repensem a resposta a estes riscos globais, com o reforço da cooperação global para os riscos emergentes mais disruptivos. Por exemplo, acordos que abordem a integração da Inteligência Artificial (AI) na tomada de decisão em caso de conflito.
A nível interno, cabe a cada Estado desenvolver campanhas de literacia digital sobre desinformação e informação falsa, ou promover uma maior investigação e desenvolvimento de modelos e tecnologias climáticas, com potencial para acelerar a transição energética, com a contribuição dos setores público e privado.
Segundo Carolina Klint, chief commercial officer da Marsh McLennan Europa, “os avanços da Inteligência Artificial irão perturbar radicalmente as perspetivas de risco das organizações, com muitas a lutarem para reagir às ameaças decorrentes da desinformação, da desintermediação e do erro de cálculo estratégico”.
Por outro lado, “as empresas estão a ter de negociar cadeias de abastecimento que se tornaram mais complexas devido à geopolítica, às alterações climáticas e às ciber-ameaças de um número crescente de agentes maliciosos”.
A responsável da Marsh conclui que “será necessário um foco incansável para criar resiliência a nível organizacional, nacional e internacional – e uma maior cooperação entre os setores público e privado – para navegar neste cenário de risco em rápida evolução”.
Já John Scott, head of sustainability risk do Zurich Insurance Group, defende que nem tudo é negativo. “Os riscos conhecidos estão a intensificar-se e estão a surgir novos riscos – mas também oferecem oportunidades. As ações transfronteiriças coletivas e coordenadas desempenham o seu papel, mas as estratégias localizadas são fundamentais. As ações individuais dos cidadãos, das empresas e dos países podem fazer avançar a redução dos riscos globais, contribuindo para um mundo mais brilhante e mais seguro”.