Setenta comandantes de bombeiros já pediram escusa de responsabilidades junto da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC).
Para que não se repitam casos como os de Pedrógão Grande, em que o comandante dos bombeiros chega ao fim do julgamento como principal culpado, a Liga dos Bombeiros lançou um movimento de pedidos de “escusa de responsabilidades”, que está a ganhar força a cada dia que passa.
Na origem deste mais recente braço de ferro na área do combate aos incêndios, está um artigo do DECIR (Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais), que atribui aos bombeiros responsabilidades que a Liga considera não estarem previstas noutros documentos oficiais orientadores desta atividade, como é o caso do Dispositivo Integrado de Operações de Proteção de Socorro (DIOPS).
O presidente da Liga de Bombeiros, António Nunes, diz que a norma em causa “extravasa a legislação geral do enquadramento da atividade operacional dos corpos de bombeiros”.
O problema “está no facto dos corpos de bombeiros serem obrigados a potenciar permanentemente a atuação articulada do dispositivo. Ora, se o dispositivo não está sob o controlo do comandante do corpo de bombeiros, ele não o pode fazer”, concluiu António Nunes, em declarações à Renascença.
Os documentos, sublinha o presidente da Liga, devem ser claros, sobretudo numa altura em que “no teatro de operações se encontram unidades de bombeiros, unidades da GNR, unidades do ICNF, unidades dos sapadores florestais privados, unidades de sapadores florestais da Afocelca. Ou seja, uma miríade de forças no terreno que obrigam a uma ação de coordenação e comando que tem que ser muito clara”.
António Nunes diz à Renascença que a questão ganha importância à luz do que se está a passar no julgamento para apuramento de responsabilidades, sobre o que aconteceu em Pedrógão Grande em 2017.
“Não queremos que se repita aquilo que hoje se está a passar com o nosso companheiro Augusto Arnaut, num julgamento que pensamos que tem muito a ver com más interpretações daquilo que é um comandante, e da forma como deve atuar.”
Questionado sobre se esta iniciativa vai ou não prejudicar o funcionamento da época de incêndios, António Nunes diz que isso está nas mãos da Proteção Civil e do Governo.
Para já, a Liga “solicitou reuniões com caráter de emergência a suas excelências o Presidente da República e o primeiro-ministro, decidimos devolver as bandeiras da proteção civil à Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil e não convidar a ANEPC para as cerimónias dos bombeiros”.
António Nunes revela que também já pediu uma reunião urgente à ANEPC, “para já sem resposta”, e que irá manter o protesto enquanto “a redação da norma em causa não for revista”.
Proteção Civil analisa juridicamente protesto inédito
Confrontada com um tipo de protesto, até aqui sem qualquer histórico, a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil diz estar a analisar, do ponto de vista jurídico e operacional, os pedidos de escusa que lhe têm chegado nos últimos dias.
Em comunicado enviado à Renascença, a ANEPC explica que, "pela sua sensibilidade e complexidade, foi desencadeado um processo de análise, que deverá estar concluído a muito breve trecho".
A Autoridade revela ainda que, até ao momento, recebeu cerca de 70 pedidos de escusa, e que não tem conhecimento de qualquer constrangimento que tenha sido provocado por esta iniciativa dos bombeiros.