O eurodeputado social-democrata Álvaro Amaro disse esta terça-feira em Estrasburgo que não vai refugiar-se no estatuto de imunidade, estando "até ao último segundo disponível para prestar todos os esclarecimentos perante a Justiça portuguesa”.
Amaro é um dos casos de eurodeputados envolvidos em casos judiciais nos seus países. No novo hemiciclo de Estrasburgo, há, pelo menos, outros seis casos, envolvendo crimes de corrupção, rebelião e até de homicídio.
1. Yannis Lagos, eleito pelo Aurora Dourada (extrema-direita) - Grécia
De acordo com a procuradoria no julgamento em curso contra vários membros do movimento neonazi, Lagos - que é líder do núcleo do partido na região de Piréus - desempenhou um papel preponderante em todos os casos sob investigação: quer no homicídio do rapper antifascista Pavlos Fyssas, mais conhecido como Killah P., morto à facada aos 34 anos, em 2013; quer noutros dois ataques mortais, um contra um grupo de unionistas PAME, outro contra um grupo de pescadores egípcios — os três tiveram lugar na região pela qual Yannis foi eleito.
Alguma imprensa grega viu na sua nomeação para as eleições europeias uma estratégia do Aurora Dourada para reforçar a narrativa de que houve elementos do partido a agirem sozinhos sem interferência da hierarquia nos eventos em questão.
Lagos e o atual líder do Aurora Dourada, Nikos Michaloliakos, foram libertados em 2015 depois de terem passado 18 meses em prisão preventiva, o máximo previsto na lei grega. Foram detidos em 2013 sob acusações de gestão de rede criminosa, pelo alegado envolvimento no homicídio de Killah P. e por outros crimes. Estão proibidos de sair da Grécia, pelo que o assento de Lagos no Parlamento Europeu está e continuará vago, ainda que o Governo grego, ao contrário do espanhol, não o tenha impedido de tomar posse. As alternativas são Lagos obter autorização especial das autoridades nacionais para ocupar o seu lugar no órgão legislativo da UE ou o Executivo em Atenas propor outro nome para ocupar esse assento.
2. Nils Usakovs, eleito pelo Harmonia (centro-direita) - Letónia
O ex-presidente da Câmara de Riga, a capital da Letónia, foi suspenso do cargo que ocupou durante quase 10 anos na sequência de suspeitas de que terá facilitado o uso indevido de fundos camarários por vários membros da sua autarquia, através de contratos fictícios, despesas pessoais, contrafação de documentos e uso dos mesmos.
Na segunda-feira, um dia antes de tomar posse como eurodeputado, o gabinete letão de prevenção e combate à corrupção nomeou-o suspeito na investigação criminal, relacionada com aquisições duvidosas pela Riga satiksme, a empresa municipal de transportes. O facto de ser considerado “suspeito” e não “testemunha” no processo não significa que tenha sido indiciado, embora aumente as probabilidades de o ser.
3. Álvaro Amaro, eleito pelo PSD - Portugal
Um dia antes de tomar posse como eurodeputado, o ex-autarca da Guarda Álvaro Amaro foi obrigado a pagar uma caução de 40 mil euros para aguardar julgamento em liberdade.
Foi constituído arguido a 12 de junho no âmbito da operação “Rota Final”, conduzida nesse dia pela Polícia Judiciária e decorrente de uma investigação iniciada em 2017 pelo Ministério Público, tendo como alvos 18 autarquias do Norte e Centro do país e o grupo de transportes Transdev, cujas empresas terão facturado 28 milhões de euros em negócios fraudulentos com as câmaras municipais visadas. Amaro é tido, segundo fonte da PJ à Renascença, como “a figura central na ligação entre as várias partes sob investigação”.
Sobre ele e os restantes arguidos pendem suspeitas da prática de corrupção, tráfico de influências, participação económica em negócio, prevaricação e abuso de poder. Para além do pagamento da caução, o eurodeputado foi proibido pelo tribunal de Viseu de contactar com as outras quatro pessoas indiciadas no processo. Depois de tomar posse em Estrasburgo, onde vai integrar a Comissão da Agricultura e do Desenvolvimento Rural (AGRI), garantiu aos jornalistas: “Jamais usarei o estatuto de imunidade parlamentar e estarei disponível para prestar todos os esclarecimentos.”
4. Carles Puigdemont, eleito pelo Partido Democrata Europeu Catalão; Toni Comín, eleito pela coligação Juntos pela Catalunha; e Oriol Junqueras, eleito pela Esquerda Republicana da Catalunha - Espanha
Acusados de rebelião, sedição e uso indevido de fundos por terem avançado com a consulta popular à independência da Catalunha no final de 2017, os primeiros dois estão exilados em Bruxelas e o terceiro está preso preventivamente há 19 meses.
Nenhum foi autorizado a tomar posse no Parlamento Europeu, havendo quem especule que os entraves impostos por Madrid terão como objetivo impedi-los de obter a imunidade parlamentar inerente ao cargo de deputado europeu.
Para poderem tomar posse, Puigdemont e Comín tinham de ter estado em Madrid para prestarem juramento no Congresso espanhol com os restantes políticos eleitos para representar o país no centro de decisões da UE. Pediram para o fazer in absentia, sabendo que o regresso a Espanha os poria atrás das grades juntamente com Junqueras. Madrid não deixou.
Nenhum foi ainda condenado por qualquer crime; os dois a viver em auto-exílio preferiram não correr o risco de se deslocar a França para o arranque da legislatura na terça-feira, por temerem ser deportados ao abrigo do pedido de extradição apresentado pelas autoridades espanholas.
5. Silvio Berlusconi, eleito pelo Força Itália
Aos 82 anos, o “sempre-em-pé” da política italiana, por três vezes primeiro-ministro e atração de holofotes desde a sua primeira eleição em 1994, volta a ocupar um cargo político pela primeira vez desde 2013, quando foi forçado a abdicar do seu assento no Senado italiano após ter sido declarado culpado do crime de fraude. No âmbito desse caso, foi condenado a prestar serviço comunitário - acabou a tocar piano para doentes de Alzheimer numa casa de saúde.
Absolvido num punhado de casos, condenado num apenas, o mais velho eurodeputado desta legislatura - antigamente próximo dos eurocéticos, agora favorável à unidade europeia - é atualmente arguido em dois processos no seu país-natal: um por suspeitas de suborno de senadores para derrubarem o Governo de Romano Prodi em 2006, outro por alegada difamação de Antonio di Pietro, um ex-magistrado do Ministério Público.