Mais de três dezenas de médicos especialistas de Ginecologia e Obstetrícia (GO) manifestaram, esta quinta-feira, a sua solidariedade para com os mais de 400 médicos internos que comunicaram, recentemente, a sua indisponibilidade para realizar mais de 150 horas extraordinárias.
Numa carta, dirigida ao Presidente da República, ao primeiro-ministro e à ministra da Saúde, os especialistas reiteram “todas as dificuldades e preocupações expressas no documento” dos colegas mais novos, a quem declaram apoio total na sua luta.
Neste documento de cinco páginas, os profissionais de GO do Serviço nacional de Saúde (SNS) sublinham o deteriorar das condições de trabalho a que estão sujeitos nas unidades de saúde onde cumprem funções, exemplificando, com a “falta de investimento na manutenção e reabilitação das instalações e a deficitária atualização de equipamentos e meios tecnológicos”.
Condições que contribuíram, ao longo dos anos, para a degradação dos serviços do SNS, refletindo-se a situação “na capacidade de resposta dos Serviços de Urgência (SU) de GO”.
Para estes médicos, a “redução de profissionais contratados e integrados em carreira hospitalar e o recurso a “tarefeiros” por contratos de prestação de serviço externo é responsável pela debilidade da capacidade de resposta dos serviços, com reflexo na dificuldade de preenchimento de escalas no SU”.
A questão da formação é um outro problema que regista um alerta, com estes profissionais a lembrarem que “um médico no internato deverá apenas alocar 12 horas da sua atividade na assistência ao SU, sob pena de prejudicar a sua formação, que pode não lhe ser reconhecida pela Ordem dos Médicos”.
“No SNS, estamos a trabalhar há muitos anos “no limite” e em condições que nem sempre são as desejadas para os utentes e os profissionais que tentam ultrapassar as dificuldades, reinventar soluções para superar as falhas e carências com que se deparam frequentemente”, lê-se na carta aberta a que a Renascença teve acesso.
Por outro lado, lembram aos governantes que os profissionais sempre deram provas da sua dedicação e empenho, “arregaçando as mangas”, sendo a inesperada situação de pandemia um exemplo desse contributo.
A “falta de reconhecimento pelos órgãos da administração do SNS”, traduz-se no “desinvestimento acentuado”, nomeadamente no que toca à progressão das carreiras, a não abertura de concursos, bem como a uma tabela salarial “que não é digna, nem justa”.
São condições que se refletem “no esvaziamento do SNS, por opção do exercício da medicina em instituições privadas que oferecem melhores salários, melhores condições de trabalho e contratos mais rápidos”, sintetizam os especialistas.
Tudo agravado pelo “gradual envelhecimento dos especialistas do SNS, a maioria com mais de 50 anos e muitos já próximos da idade da reforma”.
O documento constata ainda que, de momento, “as urgências de GO do país são mantidas pelo “espirito de missão e equipa” destes profissionais que podem por direito legal deixar de as assegurar a qualquer momento”, é sublinhado.
Apesar de tudo, os médicos acreditam que “ainda estamos a tempo para inverter esta tendência para a total degradação e desgoverno, se for intenção genuína da tutela investir no SNS e nos seus profissionais”.
Para que tal seja possível, os signatários consideram “imprescindível”, implementar “uma tabela salarial justa e digna” do esforço que é feito.
Por outro lado, pretendem trabalhar 40 horas por semana, como qualquer trabalhador e “não estar dependentes de horas extraordinárias”. A progressão nas carreiras e a valorização pela qualidade e não pelo número de tarefas realizadas, são outras exigências expostas.
Um horário laboral com tempos para atividade não assistencial, contratos atempados e atrativos, equipas médicas em número e diferenciação aceitáveis, apoio legal e ainda um maior diálogo com os profissionais, são outras questões que cabem na lista das reivindicações.
“Desejamos um SNS forte e com perspetiva de continuidade nas gerações futuras, que possa servir universalmente e condignamente os nossos pacientes”, são os votos formulados pelos 36 especialistas de GO que assinam esta carta.