O Parlamento vai debater e votar, a partir das 16h00 desta sexta-feira, o projeto de decreto do Presidente da República que declara o estado de emergência em Portugal entre 9 e 23 de novembro para permitir medidas de contenção da Covid-19.
O documento enviado por Marcelo permite, por exemplo, instituir o recolher obrigatório ou a imposição de controlos de temperatura corporal e testes de diagnóstico do novo coronavírus para acesso a determinados espaços.
O decreto tem aprovação assegurada com os votos de PS e PSD, que juntos somam mais de dois terços dos deputados, e também CDS-PP e PAN manifestaram disponibilidade para votar a favor, depois de confirmarem o conteúdo do diploma.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, prometeu falar ao país após a votação na Assembleia da República.
O PCP manifestou-se claramente contra um novo período de estado de emergência, tal como a Iniciativa Liberal também contesta este quadro jurídico, enquanto o Chega colocou 'linhas vermelhas', como a recusa de um novo confinamento geral - não contemplado no diploma.
O Bloco de Esquerda (BE) considerou desnecessário este instrumento, mas fez depender o sentido de voto da redação do decreto, e o Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV) manifestou dúvidas sobre esta matéria.
Na exposição de motivos do diploma enviado para a Assembleia da República, o chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa, defende que é preciso um estado de emergência para haver "garantias reforçadas da segurança jurídica" de medidas a adotar "em domínios como os da convocação de recursos humanos para rastreio, do controlo do estado de saúde das pessoas, da liberdade de deslocação e da utilização de meios do setor privado e social ou cooperativo".
As restrições
O decreto de estado de emergência esboçado por Marcelo Rebelo de Sousa e que será na sexta-feira votado na Assembleia da República impõe constrangimentos em quatro níveis.
Primeiro: “Direitos à liberdade e de deslocação”
- Os municípios com nível “mais elevado de risco” podem impor restrições de deslocação;
- Os municípios com nível “mais elevado de risco” podem, “na medida do estritamente necessário e de forma proporcional”, impor “a proibição de circulação na via pública durante determinados períodos do dia ou determinados dias da semana”;
Segundo: “Iniciativa privada, social e cooperativa”
- O Estado pode utilizar – “preferencialmente por acordo” – utilizar os “recursos, meios e estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde integrados nos setores privado, social e cooperativo, mediante justa compensação, em função do necessário para assegurar o tratamento de doentes com COVID-19 ou a manutenção da atividade assistencial relativamente a outras patologias;
Terceiro: “Direitos dos trabalhadores”
- O Estado pode mobilizar, através pelas autoridades públicas competentes, quaisquer colaboradores de entidades públicas, privadas, do setor social ou cooperativo (…) “para apoiar as autoridades e serviços de saúde, nomeadamente na realização de inquéritos epidemiológicos, no rastreio de contactos e no seguimento de pessoas em vigilância ativa”;
Quarto: “Direito ao livre desenvolvimento da personalidade e vertente negativa do direito à saúde”
- O Estado pode impor a realização de “controlos de temperatura corporal, por meios não invasivos, assim como a realização de testes de diagnóstico de SARS-CoV-2”, para efeitos de acesso e permanência "no local de trabalho ou como condição de acesso a serviços ou instituições públicas, estabelecimentos educativos e espaços comerciais, culturais ou desportivos, na utilização de meios de transporte ou relativamente a pessoas institucionalizadas ou acolhidas em estruturas residenciais, estabelecimentos de saúde, estabelecimentos prisionais ou centros educativos e respetivos trabalhadores".
O estado de emergência já vigorou em Portugal durante esta pandemia, entre 19 de março e 2 de maio, com duas renovações, por um total de 45 dias.
Na segunda-feira de manhã, Marcelo Rebelo de Sousa recebeu o primeiro-ministro, António Costa, que lhe propôs que fosse decretado o estado de emergência, "com natureza preventiva", para "eliminar dúvidas" sobre a ação do Governo para responder à pandemia da Covid-19.
Ao longo desse dia, o chefe de Estado ouviu os nove partidos com assento parlamentar e entre terça e quarta-feira os parceiros sociais.
De acordo com a Constituição, invocando a verificação de uma situação de calamidade pública, como é o caso, o Presidente da República pode declarar o estado de emergência, no todo ou em parte do território nacional, mas para isso tem de ouvir o Governo e de ter autorização da Assembleia da República.
O estado de emergência permite suspender o exercício alguns dos direitos, liberdades e garantias, que têm de estar especificados na respetiva declaração, e não pode ter duração superior a 15 dias, sem prejuízo de eventuais renovações com o mesmo limite temporal.
Em Portugal, onde os primeiros casos de infeção com o novo coronavírus foram detetados no dia 2 de março, já morreram 2.740 pessoas com esta doença, num total de mais de 160 mil casos de infeção contabilizados, de acordo com a Direção-Geral da Saúde (DGS).
PS, PSD, BE, CDS-PP e PAN votaram a favor de todas as declarações do estado de emergência, entre março e maio.
A primeira declaração do estado de emergência, inédita em democracia, foi aprovada no parlamento sem votos contra, no dia 18 de março, com abstenções de PCP, PEV, Iniciativa Liberal e da deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
A primeira renovação, duas semanas depois, teve um voto contra, do deputado único da Iniciativa Liberal, João Cotrim de Figueiredo, e abstenções de PCP, PEV, Chega e de Joacine Katar Moreira.
O terceiro decreto do estado de emergência foi aprovado em 16 de abril com abstenções de Chega e PEV e votos contra de PCP, Iniciativa Liberal e de Joacine Katar Moreira.