Escrevo este texto depois de votar e antes de conhecer os resultados das eleições autárquicas. Lembrei-me de quando em Portugal as eleições não eram livres nem justas. E de como frequentemente, hoje, nos esquecemos do privilégio que é votar em eleições decentes.
Nos últimos dias decorreram eleições na Rússia. Eleições que o regime nada democrático de Putin não permitiu que fossem livres. Por isso, as eleições russas pouco ou nada mudarão esse regime.
Pelo contrário, ontem, na Alemanha, realizaram-se eleições democráticas para o Bundestag (parlamento federal alemão) de grande importância para o futuro da Alemanha e da Europa comunitária. A Alemanha conheceu o mais tenebroso e desumano regime autoritário, o nazismo; mas os alemães souberam depois construir uma sólida democracia representativa – um sinal de esperança para quem se preocupa com as atuais ameaças, de esquerda e de direita, às sociedades democráticas.
Dir-se-á que a vida económica, social e política em Portugal apresenta numerosos motivos de desagrado e frustração. Com certeza, mas não podemos pedir às eleições o que elas, só por si, não podem nem devem dar. As eleições democráticas possibilitam que os eleitores escolham entre diferentes propostas políticas.
E a democracia liberal e representativa tem uma característica essencial: as pessoas concordam em discordar, aceitando que as suas opiniões possam não ser as da maioria; mas nem por isso são obrigadas a desistir daquilo que pensam ser o bem do país ou da sua autarquia – em nova oportunidade talvez as suas ideias prevaleçam. Tal acontece porque, em democracia, os derrotados numa eleição não são eliminados nem afastados da política para sempre.
Nos regimes não democráticos, de direita e de esquerda, a situação é muito diferente. Por isso o adversário político surge nesses regimes como um inimigo, que importa liquidar. Viu-se no comunismo soviético, como antes no nazismo e agora nas teocracias islâmicas, até onde pode levar o desígnio de neutralizar e eliminar oponentes.
A tolerância democrática é um valor inestimável, que deve ser preservado, mas que tem limites. As modernas sociedades desenvolvidas são cada vez mais multiculturais. E respeitar as pessoas implica aí respeitar a cultura que, em parte, forma a personalidade de quem vive nessas sociedades.
Mas tal não deve levar à aceitação de práticas contrárias à dignidade da pessoa humana, tal como a entendemos. É o caso, por exemplo, de agressões de homens à suas mulheres.
Também não são admissíveis atentados ao Estado de Direito por parte de saudosistas da ditadura – como entre nós temos visto por parte do ultra-minoritário grupo de negacionistas das vacinas e das máscaras, que insultam e ameaçam figuras públicas.
A democracia é um bem frágil. Devemos prezá-la e defendê-la, em nome da liberdade.