O fundo de garantia das agências de Viagens (FGVT) pagou este ano cinco "vouchers" de viagens de finalistas canceladas em 2020, mas à comissão arbitral chegaram 226 requerimentos de devolução, muitos sem luz verde por falta de fatura/recibo.
"Pode ser complicado os [lesados] que pagaram em numerário" conseguirem a devolução da viagem, cancelada em 2020 devido à covid-19, admitiu à Lusa a jurista da associação de defesa do consumidor Deco, Ana Sofia Ferreira, ressalvando que cada caso é um caso e defendendo a importância de os lesados juntarem "tudo" o que têm que comprove o pagamento da viagem ainda não reembolsada.
Também nas situações em que os finalistas entregaram tranches de dinheiro às associações de finalistas das escolas, existindo apenas um comprovativo da transferência total de várias turmas para a agência de viagens, é de difícil prova para o fundo, mas a Deco reforça que devem ser juntas todas as provas. .
Não existe legalmente a obrigação de entregar ao fundo de garantia um documento específico, como a fatura/recibo, explica a jurista, mas o fundo é um sistema de reembolso, para situações de incumprimento das agências de viagens, cujo acesso depende de comprovar o pagamento, o que é feito por decisão do Provedor do Cliente das Agências de Viagens ou por uma comissão arbitral presidida pelo Turismo de Portugal e que integra a Deco e a associação das agências de viagens APAVT.
O Turismo de Portugal, numa resposta à Lusa, reforçou que o FGVT se destina, exclusivamente, a reembolsar viajantes aos quais sejam reconhecidos créditos sobre agência de viagens e turismo, decorrentes de serviços prestados por estas, sempre que as mesmas não efetuem os pagamentos devidos aos viajantes, e que alguns serviços prestados pelas agências de viagens não estão abrangidos pela garantia do FGVT (como compras isoladas de bilhetes de avião).
No que diz respeito a viagens de finalistas, adianta que a comissão arbitral recebeu, até 03 de fevereiro, 226 requerimentos de intervenção relativos a reembolsos de cinco agências de viagens. .
"O FGVT já ativou seis pagamentos relacionados com a emissão de vouchers, todos suportados por decisões em tal sentido de instâncias de arbitragem de conflitos de consumo. Neste âmbito, cinco processos já foram pagos, num total de 1.910 euros", precisa o Turismo de Portugal.
Vera Temudo, mãe de um finalista em 2020 e lesada da agência Xtravel, é um dos casos que contou à Lusa não ter comprovativo do pagamento, por ter sido feito em dinheiro, e ter recebido resposta do provedor a solicitar mais documentação, mas confessa resistir a pagar 15 euros ao seu banco para obter o comprovativo da transferência bancária que fez em 2020 para Xtravel.
A agência de viagens Xtravel apresentou-se na semana passada à insolvência na Comarca Lisboa Oeste, já depois de clientes denunciarem a orgãos de comunicação social o incumprimento da devolução de viagens de alunos finalistas em 2020 e, segundo Ana Dolor, também mãe de um finalista, faltam na lista de credores da Xtravel entregue ao tribunal pelo menos 70 lesados daquela agência.
Mas essa listagem de dívidas ainda não é definitiva, segundo a jurista da Deco, uma vez que decorre ainda o processo de reclamação de créditos e só no final do prazo legal (30 dias) são emitidas as listas de créditos reconhecidos e de créditos não reconhecidos (mas reclamados), estando ainda em curso o prazo para lesados fazerem a reclamação ao tribunal dos seus créditos.
Ana Cariano, que integra um grupo de cerca de 70 pais de finalistas de duas escolas da Guarda, entregou esta segunda-feira no tribunal uma queixa-crime contra a Xtravel, solicitando ao Ministério Público (MP) que investigue sobre a prática de crimes de fraude fiscal, abuso de confiança e burla pela agência, e requerendo o reembolso da viagem.
A viagem de finalistas a Punta Umbria, Espanha, prevista para 28 de março de 2020, envolvia 10 mil alunos e foi tema de notícia nesse mês em que surgiram em Portugal os primeiros casos de covid-19, porque a agência Xtravel pretendia adiar a viagem para dezembro, e os pais, em protesto, enviaram uma carta aberta ao Governo, que acabou por interditar viagens de finalistas e ordenar às agências o reagendamento ou a emissão de vales, válidos até 31 de dezembro de 2021, período após o qual podiam solicitar o reembolso. .