Um Orçamento que não responde ao aumento da inflação, que “não foi preparado” para os efeitos da guerra na Ucrânia e que, no fim, acabará por representar um “corte real nos salários”. Foi esta a reação dos partidos no Parlamento, após a apresentação da proposta do Governo para o Orçamento do Estado para 2022.
PSD alerta para “austeridade encapotada”
Representados por Jorge Paulo Oliveira, os sociais-democratas salientaram que o documento entregue pelo executivo de António Costa conduzirá a uma “perda do poder de compra” e que se traduzirá numa “austeridade encapotada”.
O vice-coordenador do PSD na Comissão de Orçamento e Finanças referiu que existe nesta proposta o “erro capital” de não responder ao que considera ser o principal desafio estrutural do país: o crescimento económico, a produtividade e a competitividade.
“O Governo continua a recusar que o fraco crescimento económico em Portugal é o principal problema estrutural do país”, afirmou, avisando que se este Orçamento “repete as mesmas fórmulas, não é expectável que tenha resultados diferentes”.
O deputado social-democrata aponta que a proposta do OE2022 “não responde a uma necessidade do país, que é o fenómeno da inflação”.
“Estamos a assistir a um aumento muito considerável dos preços, claramente superior ao aumento expectável dos salários, à atualização do salário mínimo nacional, das pensões e dos salários da função pública”, afirmou.
Chega antecipa perda de rendimentos para os portugueses
Já o presidente do Chega, André Ventura, considerou que o Orçamento "não foi preparado" para os efeitos da guerra na Ucrânia na economia e, em declarações aos jornalistas, lamentou a falta de investimento em setores importantes.
“Os portugueses vão perder rendimentos, não vamos ter alívio fiscal significativo, nem sequer em matéria dos combustíveis tal como foi anunciado pelo Governo e nas áreas cruciais, da Defesa à Administração Interna, passando pela Justiça, é um nada de Orçamento que aqui se apresenta”, afirmou.
Ventura realçou ainda um “dado importante”, acusando o Governo de “não olhar para o salário médio” e de prever “pouco mais do que a manutenção” das verbas contempladas na última proposta, afirmando que o orçamento “não foi preparado para o fim da pandemia” e “não foi preparado para a situação de guerra e de aumento brutal de preços da energia, do gás, do combustível em toda a Europa e incluindo em Portugal”.
IL antecipa provável voto contra
O presidente da Iniciativa Liberal (IL), João Cotrim Figueiredo, pediu esclarecimentos ao Governo sobre como é que o Orçamento do Estado “mantém o mesmo défice, gastando mais e sem cortar em nada”.
Como é que é possível, com mais despesa e o mesmo défice? Onde foram feitos os cortes? Quero perceber onde é que foram feitos os cortes”, afirmou o líder liberal, referindo que, “do ponto de vista da política económica como um todo e da política fiscal em concreto, este orçamento é igualzinho ao de outubro”.
Assim, continuou o presidente da IL, “o mais provável” é que o partido venha a votar contra a proposta de Orçamento do Estado.
BE alerta para “corte real nos salários”
Os bloquistas também deixaram grandes críticas ao orçamento, acusando o Governo de “acelerar a perda de poder de compra” e de “ganhar com a inflação” ao não devolver aos trabalhadores o aumento dos preços na economia.
“Este Orçamento não só não responde aos problemas estruturais do país, como acrescenta a esses problemas um novo problema, que é um corte real no salário de todos os trabalhadores deste país que nem conseguem ver os escalões do IRS atualizados à inflação. Estamos a assistir a um movimento de perda de poder de compra acelerado que é permitido pelo Governo e incentivado pelo Governo, que fica com as receitas do aumento dos impostos”, disse Mariana Mortágua, em reação ao OE2022.
A deputada chama mesmo de “milagre” que o Governo tenha previsto em baixa o crescimento real da economia, prevendo também o défice em baixa. “Este milagre só é possível porque o Governo ganha com a inflação, mas não devolve à sociedade para compensar essa inflação e por isso, de alguma forma, transfere para os trabalhadores o custo do aumento dos preços na economia”, afirma.
Questionada sobre como irá votar o BE a proposta do executivo, a deputada não respondeu diretamente, mas recordou que os bloquistas consideram que o orçamento, “como foi apresentado na sua versão original inicial não respondia aos problemas estruturais do país”, tendo então merecido o voto contra do partido.
PS promete abertura para analisar propostas de outros partidos
Do lado do Governo, o PS afirmou que adotará uma atitude de abertura política para analisar propostas de alteração ao Orçamento para 2022 que sejam apresentadas por outras forças políticas, embora ainda não conheça nenhuma.
Jamila Madeira, dirigente socialista, considerou que a proposta de Orçamento “procura garantir contas certas, convergência com a União Europeia” em termos de crescimento económico e “acomodar” os efeitos negativos da atual conjuntura internacional resultante da intervenção militar russa na Ucrânia.
“Este Orçamento apoia as famílias diretamente com cerca de 475 milhões de euros, reforça com um aumento extraordinário em mais dez euros as pensões até 1108 euros mensais e com efeitos retroativos a 01 de janeiro, mas reforça também os abonos de família para o segundo filho e para a gratuitidade das creches”, apontou.
Voto do Livre dependerá da aceitação de propostas do partido
O deputado único do Livre, Rui Tavares, referiu que o sentido de voto na proposta de Orçamento do Estado dependerá da aceitação de propostas que o partido considera essenciais para uma “transformação estrutural” da sociedade.
“A proposta hoje entregue é pautada por uma linha orientadora do Governo na qual o Livre não se revê e com a qual tem diferenças assinaláveis: o Governo tende a ver as mudanças que estamos a passar como conjunturais, e o Livre como estruturais”, afirmou Rui Tavares, em declarações aos jornalistas no parlamento.
O deputado considerou que, mesmo admitindo que a inflação possa ser conjuntural, esta chega a Portugal “em cima de muitos anos em que os trabalhadores perderam poder de compra”.
“Os portugueses precisam de recuperar poder de compra e, se for conjuntural, ter uma política assente num pacto para rendimentos, trabalho e proteção social”, defendeu.
PCP. Proposta é "mais desajustada" e "aprofundará estrangulamentos"
O PCP considerou que a proposta de Orçamento do Estado para 2022 (OE2022) apresentada hoje é "mais desajustada" do que aquela que o Governo apresentou há cinco meses e "aprofundará estrangulamentos" à vida dos portugueses.
O PCP foi o último partido com representação na Assembleia da República a reagir à proposta de OE2022 que foi hoje apresentada pelo ministro das Finanças, Fernando Medina.
Paula Santos considerou que o documento persiste "num caminho que aprofundará estrangulamentos, injustiças e desigualdades".
PAN considera que Governo foi “pouco ambicioso
Inês Sousa Real destacou positivamente “o acolhimento em relação a algumas propostas do PAN, nomeadamente em matéria de proteção animal, de combate à pobreza como os projetos Housing First [de apoio a pessoas em situação de sem-abrigo] e também o investimento nos transportes públicos ou no combate à pobreza energética”.
“Ainda assim o Governo é pouco ambicioso em algumas matérias e inclusivamente deixa para trás um dimensão que nos parece de alguma forma inconsequente a este tempo, que se prende com a execução da Lei de Bases do Clima e com a previsão que deveria constar no Orçamento do Estado para a execução não só das rubricas e da avaliação de impacte ambienta que as iniciativas deveriam conter”, defendeu, adiantando que essa será uma das propostas de alteração que irá apresentar aquando da discussão na especialidade, porque “a crise climática não desapareceu”.
A deputada única e porta-voz do PAN considerou igualmente que o “orçamento está pouco atualizado face ao contexto” que se vive e também “à proposta que tinha sido apresentada antes do final da legislatura”, defendendo a necessidade de “um reforço muito mais significativo” no que toca ao “combate à pobreza energética e à soberania e autonomia energética”.