O chumbo de normas da Lei dos Metadados pode vir a afetar processos como a operação Marquês ou o caso BES, diz à Renascença Cândida Almeida, antiga diretora do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP).
Em causa estarão processos com “crimes graves”, como corrupção e burla, e com acesso a metadados que tenham sido utilizados na obtenção da prova, argumenta Cândida Almeida.
E, por exemplo, a Operação Marquês, em que o principal arguido é José Sócrates? “É evidente. Para que esta declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral possa afetar os processos são precisas duas condições: primeiro, que a investigação tenha pedido os metadados e, segundo lugar, que eles tenham sido utilizados na obtenção da prova”, explica.
A antiga diretora do DCIAP sublinha que “se estas duas situações se verificaram nestes processos de crimes graves, é evidente que atingirá todos os processos que passaram, de Ricardo Salgado, no BES, a Operação Marquês, o processo dos jihadistas e até do falecido João Rendeiro.
Questionada se é possível que os metadados tenham sido solicitados e utilizados nestes casos mediáticos e graves, Cândida Almeida responde que, apesar de não conhecer o detalhe dos processos, “é provável e natural, porque nestes crimes graves é preciso recorrer a uma série de diligências especiais de obtenção de prova”.
Sobre os próximos passos a dar pela defesa de José Sócrates, Ricardo Salgado e outros arguidos, no âmbito do chumbo de normas da Lei dos Metadados, a procuradora jubilada considera que os advogados já devem estar a “verificar e a apurar se foram pedidos e utilizados” metadados naqueles processos.
“Pior pior é na investigação e nos tribunais, mas os senhores advogados, com o seu dever de defesa dos arguidos, estarão a passar a pente fino todos os processos de crimes graves que lhes passaram pelas mãos.”
Para Cândida Almeida, o Tribunal Constitucional e a provedora de Justiça, que pediu a apreciação da Lei dos Metadados, “podiam ter previsto estas consequências e, nos termos da Constituição, delimitar o efeito e determinar que seja para o futuro, e não colocar em causa toda uma certeza do Direito que, passados 14 anos, se põe em causa toda a investigação” em criminalidade grave.
Se algum megaprocesso “ruir” por causa da utilização dos metadados, a antiga diretora do DCIAP considera que “a justiça cai, mas não por culpa da Justiça”, mas devido à ação do Tribunal Constitucional que não delimitou o efeito temporal da sua decisão.
O primeiro-ministro, António Costa, rejeita uma revisão constitucional para alterar a Lei dos Metadados, nomeadamente as normas chumbadas pelo Tribunal Constitucional, e vai avançar com uma alteração legislativa no próximo mês.