O governador do Banco de Portugal desaconselha aumentos salariais. Mário Centeno afirma que o risco de a atual crise económica se transformar numa crise financeira não pode ser descartado e sublinhou que o papel do BCE é garantir medidas para a acautelar.
“Do ponto de vista de um banco central, temos de garantir que esta crise económica que se desenha no horizonte – que é uma ameaça – não se transforme numa crise financeira. Esses riscos não podem ser retirados da mesa, porque nós temos sempre de ter medidas para os acautelar”, afirmou Mário Centeno, durante a conferência CNN Portugal Summit, na Culturgest, em Lisboa.
O antigo ministro das Finanças vincou que, do ponto de vista da política monetária, existe a disponibilidade a nível europeu de criar novos instrumentos que introduzam disciplina no mercado, “quando os diferenciais da dívida estarão para além dos fundamentos económicos”.
Na semana passada, o Banco Central Europeu (BCE) anunciou que vai criar um instrumento “anti-fragmentação” nos mercados de dívida, depois de países como Itália e Espanha verem os prémios de risco dispararem nos últimos dias, comparativamente à Alemanha. “Se for bem desenhado, [este instrumento] nunca vai ser utilizado”, apontou Mário Centeno, explicando que “só a mera existência” da ferramenta vai prevenir certos comportamentos dos investidores.
A economia pode desacelerar e as taxas de juro vão subir, mas diz que “não estamos numa situação em que devemos entrar num semi-pânico”.
Centeno reitera a confiança de que “na área do euro temos hoje um conjunto de instituições muito mais fortes do que havia nas crises anteriores”. A Comissão Europeia passou a emitir dívida mutualizada – “um fator que não existia e é muitas vezes esquecido” – e o BCE tem à disposição “um conjunto de instrumentos mais vasto”.
No entanto, o governador do Banco de Portugal sublinhou que há erros que não podem ser repetidos, como o “velho argumento” de incluir um “caráter penalizador” nas medidas, que considerou ser “uma tentação muito grande que existe na Europa”.
Durante a conferência, Mário Centeno foi confrontado com a proposta de aumento de 20% dos salários até ao fim da legislatura e deu uma reposta com base no passado. “Num contexto de inflação baixíssima, 4% em seis anos os salários aumentaram 22%”, responde dirigindo o olhar a António Costa na primeira fila.
O antigo ministro das Finanças desaconselha aumentos salariais no setor público em linha com a inflação, caso estas criem pressões inflacionistas, mas apela a um acordo de médio prazo sobre os salários e a produtividade. “Acho que faz sentido que essa discussão seja tida a um nível coordenado em quem que todos os agentes económicos e sociais estejam presentes.”