Julgamento SEF. Vigilante admite ter entregue fita para atar pés de Ihor Homeniuk
04-02-2021 - 12:00
 • Liliana Monteiro

Os arguidos estão acusados de terem morto o cidadão ucraniano, numa situação que configura homicídio qualificado, crime punível com pena de prisão até 25 anos de prisão.

Ao terceiro dia de julgamento uma confissão. Confrontada pelo juiz com imagens resultantes das câmaras de videovigilância do Centro de Instalação Temporária (CIT) do Aeroporto de Lisboa, a vigilante Ana Lobo admite ter entregue fita para atar os pés de Ihor Homeniuk e ter ouvido gritos.

“Sim, levei uma tesoura ao meu colega até à porta da sala”, começou por reconhecer. Mas o magistrado Rui Coelho, folheando as imagens do processo constatou que a testemunha também levou fita adesiva. Questionada do porquê, respondeu: “Achei estranho, mas não perguntei”.

Até aqui a testemunha, a primeira a ser ouvida no arranque da terceira sessão do julgamento, tinha descrito um cenário de normalidade, apontando sempre o cidadão ucraniano - com quem dizia não ter tido contacto - como agitado.

À entrada do CIT o homem “estava confuso e parecia que não sabia o que se estava a passar”.

Relatou que os vigilantes chamaram a Cruz Vermelha, porque consideraram que Ihor necessitaria de medicação para se acalmar, tendo em conta que não se tinha conseguido comprar um produto que já lhe tinha sido prescrito. A testemunha acrescentou que lhe tinha sido pedido um copo de água pela equipa de enfermagem e relatou ainda que, posteriormente, ouviu gritos.

Enquanto lá estavam os inspetores [os três arguidos no processo] ouvi ‘ai… ai’. Esses gritos duraram mais de 10 minutos”.

Na sequência deste testemunho, Ana Lobo sublinhou por diversas vezes que nunca tinha ido à sala, situação que levou o presidente do coletivo a confrontá-la com as imagens que a mostram a ajudar os colegas vigilantes, que entraram na sala após os inspetores do SEF terem abandonado o centro.

Disse que os dois colegas lhe “pediram para ajudar, mas depois disseram que ele a podia magoar e era para não ir. Eles estiveram a pôr fita adesiva à volta dos pés.” Questionada pelo juiz se não estranhou este facto, pois os inspetores tinham deixado a vítima com algemas, respondeu que sim.

A defesa de um dos arguidos perguntou se também tinha ouvido gritos da vítima quando os seguranças lhe colocavam fita adesiva, a testemunha respondeu afirmativamente. “Ouvi durante uns três minutos.”

Foi ainda confrontada com imagens que a mostram a levar uma revista aos colegas vigilantes, que se encontrava na sala onde estava o cidadão ucraniano. Confirmou, mas “não sei para que a queriam”.

Num segundo momento, a vigilante admitiu que levou fita adesiva por duas vezes.

Ainda bem que temos as fotos, mas se pudesse recordar era ainda melhor”, disse o juiz depois de ter ajudado a testemunha a recuperar a memória.

Durante o depoimento, os três inspetores arguidos revelaram que encontraram Ihor atado com fita adesiva castanha, um procedimento já comentado por diversas testemunhas também como sendo anormal e nunca visto.

Bruno Sousa, Duarte Laja e Luís Silva estão no banco dos réus. Encontram-se em prisão domiciliária desde a sua detenção em 30 de março e são acusados de homicídio qualificado de Ihor Homenyuk depois de o cidadão ucraniano tentar entrar ilegalmente em Portugal em 10 de março.