A associação ambientalista Zero admite que, caso a situação de seca se agrave ainda mais em Portugal, poderá ser necessário recorrer a medidas mais extremos e começar a racionar a água para utilização doméstica.
O Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia previu esta terça-feira que a Península Ibérica possa ter, até novembro, "condições mais secas do que habitual", ao mesmo tempo que admitiu que "os riscos podem persistir" relativamente à seca, alertando para a falta de armazenamento de água em Portugal.
“É provável que nos próximos meses, até novembro de 2022, ocorram condições mais quentes e secas do que o habitual na região euro-mediterrânica ocidental. Em algumas zonas da Península Ibérica, estão previstas condições mais secas do que as habituais para os próximos três meses”, refere este organismo, num relatório atualizado sobre a avaliação da situação de seca na Europa.
Em declarações à Renascença, Sara Correia, da Zero, sublinha que o relatório agora divulgado mostra que “vamos ver prolongadas as condições que temos atualmente, tempo seco e quente, portanto, isto vai agravar a situação que já estamos a viver e que deixou grande parte das nossas albufeiras e barragens numa situação bastante critica”.
A manterem-se estas condições meteorológicas, a “situação vai agravar-se”, levando, inevitavelmente, “à tomada de medidas para fazer uma gestão muito mais ao detalhe daquilo que são os recursos hídricos que temos disponíveis”.
Questionada sobre que medidas podem ou devem ser implementadas, a ambientalista responde com a prioridade das prioridades.
“Tem que ser sempre assegurado o abastecimento às populações, esta é a prioridade. Todas as outras utilizações da água ficarão para segundo plano”, diz, elegendo a agricultura como” o setor que mais consome água a nível nacional”.
Sobre o racionamento de água para uso doméstico, Sara Correia lembra que agora, como em situações de seca anteriores, algumas regiões do país “têm de ser abastecidas por autotanques através dos bombeiros”, o que, por si só, “já é uma medida de racionamento”.
Em caso de agravamento significativo, esta e outras medidas terão que ser colocadas em cima da mesa.
“Não temos propriamente essas medidas rígidas que obriguem a população a um consumo muito rigoroso da água, mas essas medidas podem ser equacionadas”, embora não saiba “se chegaremos ao ponto de racionar a água para consumo doméstico, mas podemos até chegar a essa situação, sim”, sublinha.
Uma agricultura menos dependente da água
O relatório da Comissão Europeia deixa também alertas sobre a água disponível para a produção hidroelétrica, para a irrigação dos terrenos, além da possibilidade da continuação de risco elevado de incêndio.
Nesta altura, Portugal tem energia hidroelétrica armazenada, em reservatórios de água, inferior a metade da média dos últimos cinco anos. Uma situação extrema com impactos em várias áreas, como na agricultura.
“Estamos numa situação extrema e daí fazerem esta referência a ser uma das piores ou talvez a pior seca nos últimos 500 anos”, o que “vai ter impacto a vários níveis, e a agricultura é obviamente um deles”, uma vez que algumas regiões do país, “a agricultura está muito dependente da água e da existência de recursos hídricos”, lembra, Sara Correia.
“A agricultura aposta muito em culturas permanentes, que precisam de irrigação contínua e em grandes quantidades de água”, menciona, “e isso torna-nos ainda mais dependentes dos recursos hídricos que vão ser cada vez menos”.
Esta responsável da Associação Sistema Terrestre Sustentável admite a necessidade de “medidas de gestão em relação ao tipo de agricultura que praticamos”, para “sermos mais resilientes a estas situações de seca e termos uma agricultura menos dependente da água.”
O documento sobre a situação da seca na União Europeia (UE) em agosto, ndica que 47% do espaço comunitário está em condições de alerta, o que significa que a precipitação tem sido inferior ao normal e que a humidade do solo é deficitária.
Entre as regiões mais afetadas pela falta de chuva, entre junho e agosto estão o centro e o sul de Portugal, Espanha, sul de França, centro de Itália, sul da Alemanha, Eslováquia, Hungria e Roménia.
A Península Ibérica sofreu uma prolongada onda de calor na primeira quinzena de julho de 2022, levando a temperaturas acima da média a longo prazo para o mesmo mês, estando ainda a registar temperaturas elevadas.
A Comissão Permanente de Prevenção, Monitorização e Acompanhamento dos Efeitos da Seca, que envolve os Ministérios do Ambiente e da Agricultura, reúne-se na quarta-feira.