O último avião de transporte militar dos EUA saiu esta segunda-feira de Cabul, assinalando o fim de uma presença de 20 anos.
Segundo a imprensa americana o último C-17 americano que se encontrava em Cabul partiu esta segunda-feira à noite, deixando o país e levando com a bordo o que restava do efetivo. O Pentágono já confirmou a informação e diz que o mais alto diplomata americano no país, Ross Wilson, partiu também neste voo da capital afegã.
Segundo relatos no terreno, a partida dos últimos aviões foi recebida com festejos e tiros para o ar.
Chega assim ao fim uma ocupação de 20 anos que foi espoletada pelos ataques terroristas do 11 de Setembro de 2001.
Na altura o país estava ocupado quase na totalidade pelos talibãs, um grupo de estudantes islâmicos que tinha controlado um estado que se encontrava em desgoverno total desde o final da ocupação soviética. Os talibãs davam guarida a outros grupos terroristas, incluindo a chefia da Al-Qaeda, liderada por Osama Bin Laden, um veterano da Jihad que deu os seus primeiros passos na luta pelo islão extremista precisamente como voluntário no combate aos comunistas no Afeganistão.
A captura e morte de Bin Laden levariam ainda mais de uma década a consumar-se, mas entretanto o Afeganistão foi ocupado pelos americanos, com o apoio da Aliança do Norte, um grupo militar que mantinha uma parcela do terreno do Afeganistão. Seguiram-se duas décadas em que supostamente terão sido construídos os alicerces de uma democracia e de um estado funcional.
Mas os talibãs tinham outros planos. O grupo retirou-se para as montanhas e para as províncias, mas nunca desapareceu. Mesmo no auge da presença americana o Governo afegão nunca controlou mais do que as principais cidades. O fracasso tornou-se patente quando, a partir de maio, as forças americanas começaram a retirar e as afegãs se dissolveram perante um avanço talibã que superou mesmo as mais drásticas estimativas.
Em meados de agosto previa-se que Cabul ainda resistiria mais alguns meses, uma semana mais tarde os talibã estavam no palácio presidencial.
As últimas duas semanas de presença americana foram caóticas, com centenas de milhares de pessoas a tentar chegar ao aeroporto, último reduto dos americanos, para tentar embarcar nos voos de saída. A maioria não teve sorte, muitos nem lá chegaram, mas para mais de 122 mil pessoas a vida continuará longe dos extremistas.
O sentimento expressado pelo general Frank McKenzie, em conferência de imprensa esta segunda-feira à noite, era tudo menos festivo. "É uma partida muito pesarosa. Não conseguimos retirar toda a gente que queríamos", disse o oficial. McKenzie acrescentou, contudo, que "ainda que tivessemos ficado mais 10 dias, não conseguiríamos retirar toda a gente".
Os EUA confirmam ainda que nem sequer conseguiram retirar todos os seus próprios cidadãos, e que ficaram americanos em território ocupado pelos talibãs.
Com muitas pessoas vulneráveis ainda presas no Afeganistão, outros países, entre os quais França e Alemanha, tentam encontrar soluções para continuar a evacuar civis. Os talibãs, por enquanto, dizem que permitirão a saída a quem tiver esse direito.
A retirada do Afeganistão, comparada já com a saída americana de Saigão nos anos 70, marca o maior fracasso até agora da administração de Joe Biden e afetou fortemente os seus índices de apoio nos EUA. É verdade que o plano e as datas para a retirada foram herdadas de Trump, mas Biden insistiu em mantê-los e está a pagar por isso um alto preço político.