A proposta sobre a Lei Orgânica da Proteção Civil é o principal motor da discórdia entre o Governo e a Liga dos Bombeiros Portugueses, que no sábado anunciou a suspensão de toda a comunicação de informações operacionais aos Comandos Distritais de Operações de Socorro.
Perceba o que está em causa.
O que diz a nova lei?
O Governo aprovou, em Conselho de Ministros realizado a 25 de outubro, a proposta de alteração à Lei Orgânica da Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC), que vai passar a designar-se Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC).
Com esta proposta, o Governo acaba com os atuais 18 comandos distritais de operações e socorro (CDOS), e cria cinco comandos regionais e 23 comandos sub-regionais de emergência e proteção civil.
O Governo pretende que o novo modelo da Proteção Civil passe a ter uma base metropolitana ou intermunicipal.
A proposta do executivo prevê também a criação de um Comando Nacional de Bombeiros com autonomia financeira e orçamento próprio, cujo responsável máximo será designado depois de ouvida a Liga dos Bombeiros Portugueses (LBP).
O diploma prevê ainda que os voluntários deixem de participar no ataque inicial a incêndios rurais, ficando essa tarefa entregue ao Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro da GNR.
Depois de ser aprovada em Conselho de Ministros, esta proposta esteve em consulta pública junto da LBP e da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que também a contesta.
No domingo, o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, afirmou que "o processo negocial ainda está em curso" e que "o Governo tem toda a disponibilidade para o diálogo" relativo aos diplomas que estão em discussão pública, reforçando que estes não estão em vigor, nem sequer aprovados na sua versão final.
De que se queixa a Liga dos Bombeiros Portugueses?
A proposta do Governo tem sido contestada pela LBP desde que foi tornada pública. A LBP classifica a proposta como "completamente desajustada da realidade do país" e considera que vai interferir na autonomia das associações de bombeiros.
A LBP reivindica uma direção nacional de bombeiros "autónoma independente e com orçamento próprio", um comando autónomo de bombeiros e o cartão social do bombeiro.
Em 24 de novembro, a LBP realizou uma concentração de protesto na Praça do Comércio, em Lisboa, naquela que foi a primeira manifestação desta estrutura. Esta concentração aconteceu um dia depois de a Liga se ter reunido com Eduardo Cabrita sem ter sido alcançado qualquer entendimento.
No sábado, a LBP decidiu "abandonar de imediato" a estrutura da ANPC e suspender a informação operacional por parte dos bombeiros aos CDOS a partir das 00:00 de domingo.
O presidente da LBP, Jaime Marta Soares, assegurou que esta atitude dos bombeiros não põe em causa a segurança e o socorro aos portugueses, garantindo que os bombeiros continuarão a funcionar "exatamente na mesma".
Em resposta, o ministro Eduardo Cabrita acusou a LBP de ser "absolutamente irresponsável" por colocar em causa a segurança das pessoas ao abandonar a ANPC e considerou a decisão ilegal.
O que significa suspender toda a informação operacional aos Comandos Distritais?
Os bombeiros voluntários que seguiram esta posição da Liga não estão a comunicar aos CDOS, estruturas distritais da ANPC, as chamadas de socorro que tenham recebido, ou seja, continuam a responder às solicitações, mas não dão conta das ocorrências aos comandos distritais.
A ANPC deixa assim de saber quantas viaturas dos bombeiros voluntários saem ou entram, o que vão fazer, porque os bombeiros não vão efetuar o registo no sistema que faz a ponte entre as duas entidades.
Segundo a LBP, este modelo de autogestão serve para mostrar ao Governo que os bombeiros voluntários são capazes de sustentar o modelo de comando único.
Caso a chamada seja feita via 112, a ANPC tem conhecimento da ocorrência, mas pode ficar sem saber quais os bombeiros e os meios que estão no local.
Na prática, a suspensão da informação operacional pode levar à duplicação de meios no terreno.
Quantas corporações de bombeiros voluntários existem no país?
Segundo a LBP, existem 412 corporações de bombeiros voluntários no Continente, 17 dos Açores e seis na Madeira.
A LBP tem, no total, 470 associados, distribuídos por corporações de voluntários (435), municipais (19), privativos (9), batalhão de sapadores bombeiros (1), companhias de sapadores bombeiros (5) e regimento de sapadores bombeiros (1) distribuídos por todos os distritos do Continente e Ilhas.
Dados da Autoridade Nacional de Proteção Civil indicam que, a 31 de dezembro de 2016, estavam no ativo 22.796 bombeiros voluntários e 6.226 profissionais que exercem funções nos corpos de bombeiros voluntários.