Peritos recomendam: custas judiciais gratuitas e linha de apoio permanente para vítimas de praxes
06-03-2017 - 06:31

Autores defendem ainda a distribuição de um folheto no início do ano lectivo sobre a realidade da praxe e as consequências disciplinares e penais das situações de violência.

O Governo deve garantir o acompanhamento jurídico e a isenção de custas judiciais de todos os estudantes que pretendam recorrer à justiça para denunciar situações passiveis de serem consideradas crime. Estas recomendações constam do estudo “A praxe como Fenómeno Social”.

O trabalho, apresentado esta segunda-feira, na Universidade do Minho, visou compreender o fenómeno em profundidade com a caracterização da praxe no momento actual, a sua contextualização histórica, enquadramento jurídico e tratamento na comunicação social.

Nas recomendações finais, os investigadores aconselham a celebração de um protocolo entre o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e o Ministério da Administração Interna para garantir um reforço da articulação entre as forças de segurança, as direcções das Instituições de Ensino Superior e as Associações Académicas e de Estudantes, no sentido de se fomentarem práticas de segurança em ambiente académico, partilhando informação, antecipando eventuais problemas.

As autarquias são também chamadas a participar neste controlo de praxes abusivas, sendo recomendado articular a acção do Governo com a dos municípios, de modo a existir, em termos das orientações gerais e, particularmente, no combate ao abuso, assédio, violência e humilhação, uma prática concertada.

Nesta estratégia devem também ser envolvidos os Conselhos Municipais de Juventude na dinamização de acções de informação sobre a praxe académica e de prevenção de comportamentos abusivos ou violentos no contexto dos respectivos territórios.

Em articulação com as instituições de ensino superior, é recomendado um levantamento sobre o enquadramento do fenómeno da praxe académica nos regulamentos internos das instituições. Algo imprescindível para uma recomendação geral, no respeito pela autonomia das instituições, relativamente às sanções disciplinares que devem estar previstas e enquadradas face às situações de humilhação, abuso e violência ocorridas no contexto das praxes académicas, dentro e fora das organizações.

Os investigadores defendem também que Provedor do Estudante deve ter como competências o desenvolvimento de uma análise anual da situação da praxe académica na instituição a reportar aos seus órgãos internos e, se necessário, à Direcção-Geral do Ensino Superior e ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

Relatório anual sobre praxes

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior deveria elaborar um relatório anual nacional, com base em dados recolhidos pelas instituições, para uma comparação de informação sobre a situação da praxe académica em Portugal, segundo um estudo.

Neste relatório nacional, o Ministério apontaria os casos mais graves, elencando novas sugestões de intervenção e temas emergentes.

Os investigadores consideram ainda necessário proceder a um levantamento das estruturas de apoio psicológico e jurídico existentes em todas as instituições de ensino superior com vista a cumprir dois objectivos de curto/médio prazo. Estas estruturas deveriam existir em todas as instituições de ensino e salvaguardar uma atenção particular às situações de abuso, humilhação e violência que possam ocorrer no contexto das praxes académicas.

A sensibilização das direcções das Instituições de Ensino Superior para o não-reconhecimento das estruturas informais e não legitimadas das praxes académicas, particularmente nas cerimónias e eventos oficiais, é outra das recomendações.

É ainda recomendado às instituições, em articulação com as associações de estudantes, a abertura de um debate interno sobre as vantagens e desvantagens da proibição das práticas de praxe no campus da instituição com a finalidade de eliminar as situações de humilhação, abuso e violência, bem como sobre outras alternativas em matéria de política universitária sobre a praxe académica.

A linha de denúncia para praxes abusivas e violentas registou em 2015-2016, até ao mês de maio, dez queixas de alunos, um número substancialmente inferior às 80 no ano lectivo anterior, o primeiro de funcionamento da linha, segundo os últimos números divulgados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES).

A partir de Junho a supervisão das queixas recebidas pelo endereço electrónico praxesabusivas@dges.mctes.pt passou para a Direcção-Geral do Ensino Superior (DGES).

A linha de denúncia de praxes abusivas foi criada pelo ex-ministro Nuno Crato na sequência do caso da praia do Meco, em que um grupo de estudantes da Universidade Lusófona de Lisboa morreu afogado, alegadamente na sequência de uma praxe.

O estudo foi promovido pela Direcção-Geral do Ensino Superior e elaborado por uma equipa conjunta de investigadores do Centro de Investigação e Estudos Sociais do ISCTE-IUL (CIES), do Instituto de Sociologia da Universidade do Porto (ISUP) e do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (CES), sob coordenação de João Teixeira Lopes (ISUP) e João Sebastião (CIES).