O Irão negou "categoricamente", esta segunda-feira, qualquer implicação no ataque ao escritor Salman Rushdie, responsabilizando antes o próprio autor de "Os Versículos Satânicos", obra que há 33 anos lhe custou uma condenação à morte pelo líder espiritual iraniano.
"Desmentimos categoricamente" qualquer ligação entre o agressor e o Irão, disse o porta-voz dos Negócios Estrangeiros iraniano, Nasser Kanani, ao fim de três dias de silêncio sobre o ataque ao escritor, na sexta-feira, durante uma conferência em Chautauqua, no estado norte-americano de Nova Iorque.
Na sua conferência de imprensa semanal, o porta-voz insistiu que “ninguém tem o direito de acusar a República islâmica do Irão”.
"Neste ataque, apenas Salman Rushdie e os seus apoiantes merecem ser culpados e mesmo condenados", acrescentou Kanani na primeira reação oficial do regime de Teerão à agressão ao escritor britânico de 75 anos.
"Ao insultar as coisas sagradas do Islão e ao ultrapassar linhas vermelhas de mais de 1,5 mil milhões de muçulmanos e de todos os adeptos das religiões divinas, Salman Rushdie expôs-se à cólera e à raiva das pessoas", disse ainda.
Esfaqueado uma dezena de vezes no pescoço e no abdómen, Salman Rushdie permanece hospitalizado em estado grave, mas no sábado à noite conseguiu dizer algumas palavras e no domingo o seu agente, Andrew Wylie, afirmou que o escritor está no "caminho da recuperação".
"Os ferimentos são graves, mas o seu estado evolui numa boa direção”, acrescentou, admitindo que o processo de recuperação do escritor será longo.
Ameaçado de morte desde uma ‘fatwa’ (decreto da lei islâmica) iraniana de 1989, um ano após a publicação de "Os Versículos Satânicos", Salman Rushdie foi alvo de um ataque que chocou o Ocidente, mas que foi bem recebido por extremistas no Irão e no Paquistão.
O agressor, um jovem norte-americano de origem libanesa, foi no domingo presente a um juiz do estado de Nova Iorque, perante o qual se declarou "inocente" de tentativa de homicídio do escritor.
Segundo a acusação, o ataque foi premeditado.
O ataque, visto por muitos como um ataque à liberdade de expressão, foi condenado por líderes mundiais como o Presidente norte-americano, Joe Biden, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, ou o chefe de Estado francês, Emmanuel Macron.
As vendas do controverso livro de Rushdie dispararam desde sexta-feira e o romance está hoje no 11.º lugar da lista de 'best sellers' da plataforma eletrónica de vendas Amazon.
Residente em Nova Iorque há 20 anos, Salman Rushdie tinha começado a retomar uma vida mais ou menos normal enquanto continuava a defender a sátira e a irreverência nos seus livros.
"Os Versículos Satânicos" são considerados pelos muçulmanos radicais como uma blasfémia contra o Alcorão e o Profeta Maomé.