Mas aquilo foi uma chapada de luva branca? Não. Foi muito mais do que isso. Uma dessas é apenas uma resposta delicada, apropriada a uma ofensa. O que Éder fez atinge muitos mais âmbitos. É estratosférico. É atrevimento que se transforma em arte pura. É a frieza de quem acredita e não desarma. É a maneira de alguém dizer "presente" como nunca ninguém o havia feito numa final.
O maior feito da história do futebol português assume honras de película cinematográfica, de peça de teatro, de conto de fadas. Nestas categorias todas, o momento único, inolvidável, que perdurará para a eternidade, foi alcançado pelo herói improvável.
O actor predestinado a decidir o final e o final, esse, foi arrumado cedo do jogo, por um Payet certamente instruído para destruir o joelho do novo campeão da Europa. O jogo nem chegou a começar para Cristiano Ronaldo. Saiu antes do intervalo, com lágrimas e com um país a baixar a cabeça, incrédulo quanto ao sucesso que acabaria, então, por ocorrer.
Mas não fez mal. Com o capitão por terra, a equipa das quinas cerrou fileiras, enrijeceu os punhos e uniu-se em torno de um objectivo que, para além de uma vingança contra a história favorável aos gauleses, era também, uma maneira de vingar o que ao CR7 os "bleus" haviam feito.
Na baliza, Rui Patrício revelou-se intransponível. Impossível não o considerar o melhor guarda-redes do Europeu. Na defesa, Pepe regressou fresco, após lesão e liderou os destinos sem Ronaldo em campo. No banco, Fernando Santos deu - agora sim - a tal chapada de luva branca com mudanças dignas de um mestre da táctica.
Quaresma entrou para dar "explosão" aos duelos em 1x1 com a equipa de Deschamps. Moutinho foi lançado para refrescar o meio-campo e dar mais capacidade de transporte. Éder, esse, entrou para decidir. Não se atemorizou, não sentiu a pressão dos largos milhões que dele desconfiaram, por certo.
Já no prolongamento e depois de Nani ter permitido a Lloris uma defesa do outro mundo, o luso-guineense captou o esférico no lado esquerdo do ataque, avançou para a zona central e, perante a incredulidade da defesa francesa, que nunca quis acreditar que ele iria disparar à baliza a mais de 20 metros de distância, ficou estática.
A fotografia, a "chapa", foi bonita. Lloris bem se esticou, mas o esférico levava selo de golo.
Doze anos depois, as lágrimas que Ronaldo começou por brotar foram de raiva e injustiça. Doze anos depois, as lágrimas que todos libertaram após o apito final do árbitro foram de quem ainda não acreditava que o sonho se tinha tornado realidade.