Da Alemanha chegam-nos notícias que permitem alguma esperança no combate à profunda recessão económica provocada pela pandemia. A popularidade que a chanceler Merkel ganhou nas últimas semanas colocou a inesperada possibilidade de ela, afinal, não se retirar da política em breve e vir a suceder a si própria, num novo e quinto mandato como chanceler. Talvez fosse bom para a Alemanha e também para a Europa comunitária.
Merkel conhece profundamente o funcionamento de uma e de outra e é respeitada. Além disso, é uma europeísta convicta e os anos que passou na então Alemanha de Leste, comunista, levam-na a dar grande valor à democracia liberal.
Por outro lado, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Alemanha, Heiko Maas, e o ministro das Finanças, Olaf Scholz, publicaram ontem em vários jornais europeus um artigo com o título “Uma resposta solidária à crise do coronavírus na Europa”. Em Portugal esse artigo apareceu no “Público”. Mera operação de relações públicas, para afastar a imagem, provocada pela recusa germânica de “coronabonds”, de que a Alemanha é egoísta?
É possível, mas o artigo parece ser um pouco mais do que isso. Dizem os ministros alemães que, “nesta pandemia do coronavírus, precisamos de um sinal claro a favor da solidariedade europeia. A Alemanha está pronta para dar esse sinal”. Os signatários do artigo pertencem, ambos, ao SPD, mas creio que não publicariam este texto sem luz verde da chanceler Merkel. Referindo-se ao Mecanismo de Estabilidade Europeu (MEE), cuja utilidade apontam, afirmam Heiko Maas e Olaf Scholz que “importa agora dar mais um passo: urge garantir que os países mais afectados pela crise do coronavírus tenham, de forma simplificada, acesso aos meios adequados para garantir a sua estabilidade financeira”.
E adiantam: “Propomos, assim, que em todos os países da UE se garanta de forma rápida e conjunta a liquidez necessária para que a manutenção dos postos de trabalho não dependa do capricho de especuladores financeiros. Para tal, os meios financeiros não podem ser sujeitos a condicionalidades desnecessárias (itálicos meus), o que equivaleria ao ressurgir de uma política de austeridade como a que se seguiu à crise financeira e que levou a que os Estados-membros fossem tratados de forma desigual (...) Não precisaremos de nenhuma troika, nem de fiscalizadores ou de uma comissão que desenvolva programas de reformas para um determinado país, mas sim de ajudas rápidas e direcionadas”. Palavras positivas, a reter.
Além disso, propõem um “fundo de garantia pan-europeu, capaz de assegurar os créditos com os quais o Banco Europeu de Investimento (BEI) disponibiliza liquidez às pequenas e médias empresas nos diferentes países. Isso permitiria garantir, através dos bancos comerciais ou de entidades financiadoras nacionais, financiamentos intercalares, prazos de reembolso mais alargados e novos empréstimos”. Resta saber se o volume de dinheiro de que o BEI dispõe está à altura do necessário para combater uma provável depressão.
Por outro lado, os ministros da RFA sublinham que “quando a crise estiver superada, o importante será colocar a economia europeia novamente no caminho da recuperação económica e do crescimento. Os Estados membros da UE terão de unir as suas forças num espírito de solidariedade europeia e agir em conjunto para tornar a UE mais forte. Todos nós, a Alemanha incluída, teremos de levar isso em conta nas negociações do Quadro Financeiro Plurianual, ou seja, do orçamento da UE para os próximos sete anos”.
Abrem, assim uma porta para o desejável aumento do orçamento da UE. Mas porquê só quando a crise estiver superada? Precisamos desse aumento exatamente para superar a crise económica gravíssima que está no horizonte.