A Sociedade Missionária da Boa Nova (SMBN) é uma organização de “vida apostólica, de padres e irmãos leigos consagrados à missão”, criada em 1930 em Portugal, depois de um largo período de perseguição à Igreja. Dois anos mais tarde, o Papa Pio XI assina a bula que oficializa a sua constituição, e são esses dois momentos que os missionários se preparam para celebrar.
“24 de outubro de 1932 é o dia da oficialização, e 1930 foi o ano em que foi nomeado o primeiro Superior Geral, por isso decidimos assinalar essas duas datas”, explica à Renascença o padre Adelino Ascenso, atual responsável máximo da SMBN. O itinerário comemorativo do centenário arranca, assim, na próxima terça-feira, dia 24, com a inauguração de uma exposição fotográfica que “mostra o trabalho dos missionários no terreno, nas regiões onde foram marcando presença”.
No início eram só missionários portugueses, mas aos poucos foram recebendo elementos de outros países, sobretudo das antigas colónias portuguesas, internacionalizando a missão, que hoje continua a justificar-se. “É difícil falar em causa própria, mas penso que a sociedade missionária tem um papel importante a desempenhar, na missão de ir ao encontro de povos diferentes, evangelizar. Neste momento somos 90, membros portugueses e de outras nacionalidades, nomeadamente angolanos, moçambicanos e brasileiros”, indica Adelino Ascenso.
O Superior Geral dos Missionários da Boa Nova explica que “desde 1937 até 1970 estivemos só em Moçambique. Em 1970 abrimos o nosso campo a Angola e ao Brasil, e em 1980 abrimo-nos à Zâmbia, ao mundo não lusófono. Na Zâmbia estivemos 35 anos, mas tivemos de fechar aquele campo em 2015. Entretanto, em 1998, partimos para o Japão, onde estamos há 25 anos”. Foi precisamente aí que o padre Adelino iniciou a sua atividade missionária. “Estive lá, ao todo, 12 anos, e gostava de voltar”, admite.
Para já é Superior Geral da SMBN, e desde abril preside também à CIRP, a Confederação dos Institutos Religiosos de Portugal.
“Ser missionário é sair de próprio”
Nesta entrevista – realizada também a propósito do Dia Mundial das Missões, que a Igreja assinala no domingo, 22 de outubro -, Adelino Ascenso reconhece que o papel das congregações religiosas nem sempre é reconhecido, ou sequer conhecido, mas faz a diferença. “Muitas vezes o trabalho desenvolvido pelos institutos religiosos, congregações e sociedades de vida apostólica faz-se, não em segredo, mas em silêncio. Não vem para os jornais, nem para a comunicação social, mas é fundamental, tanto lá fora como cá dentro, estejamos onde estivermos. Há trabalho a ser desempenhado por missionários e missionárias, consagrados e consagradas, e congregações contemplativas, que é extraordinário”, sublinha.
Na CIRP estão atualmente representados “132 institutos, 94 femininos e 38 masculinos. Todos têm a suas características específicas e todos estão empenhados”, indica ainda. Lembrando que os cristãos são chamados a ser missionários onde estiverem, alerta para o perigo de se ficar “no conforto”, e pensar que já não é preciso “ir ao encontro de outras culturas”. Pelo contrário, diz, “não posso deixar esmorecer no meu interior a necessidade de sair. E não é sair só geograficamente, é sair da auto referencialidade, que às vezes também implica uma saída geográfica. Porque, repito, uma saída geográfica para novas culturas, novas línguas, novas formas de pensar e de viver a fé, leva-nos a um exercício de grande aceitação e esvaziamento”, tão necessário à Igreja.
JMJ Lisboa não pode desaparecer como “uma bola de sabão”
Para Adelino Ascenso é prioritário não deixar apagar a chama que se criou com a Jornada Mundial da Juventude. “Aquela via Sacra foi uma autêntica maravilha, assim como a Missa do envio e a Vigília, foram momentos altíssimos, mas é necessário continuar aquele ambiente que se viveu, de grande fraternidade, acolhimento e hospitalidade mútua. É necessário que isso continue, que tenhamos o discernimento e a capacidade de respondermos aos anseios dos jovens”.
“Não deixemos que isto desapareça como uma bola de sabão. Os jovens não se contentam com bagatelas, querem coisas exigentes, sólidas, não se contentam só com o miolo do pão, querem côdea e devemos estar prontos para dar essa côdea aos jovens, para lhes darmos coisas com sentido, e devemos estar prontos para responder a essas exigências”, refere ainda.
Mas, acredita que a Igreja vai conseguir dar resposta a esses anseios? “Penso que sim. Sabemos que isto vai com passos titubeantes. No nosso trabalho de Igreja, por vezes somos lentos, mas tenho visto atividades em diversas dioceses e Institutos, e nota-se que as pessoas estão empenhadas e estimuladas para não deixarem apagar aquele fogo que viveram durante a JMJ. Isso é muito bom, dá-nos esperança”. Uma esperança alimentada pelo atual processo sinodal em curso na Igreja.
“Há mudanças que irão acontecer, mas a grande mudança estará precisamente na palavra sinodalidade - termos consciência de que devemos caminhar juntos, despirmo-nos da referencialidade, do narcisismo, e avançarmos para uma Igreja bastante mais plural, naturalmente mais aberta e mais dinâmica. Porque a tradição vive-se no dinamismo e não na imobilidade, que não é um parar, é um regredir. Portanto, há uma grande esperança neste Sínodo, de onde sairão coisas novas”.