Marcelo Rebelo de Sousa falou, esta quinta-feira à noite, ao país e anunciou a dissolução do Parlamento, convocando novas eleições para 10 de março. Leia aqui na íntegra a declaração do Presidente da República:
"Portugueses,
Pela primeira vez em democracia um primeiro ministro em funções ficou a saber, no âmbito de diligências relativas a investigação, respeitando a terceiros, uns seus colaboradores, outros não, que ia ser objeto de processo autónomo a correr sob a jurisdição do Supremo Tribunal de Justiça.
De imediato apresentou a sua exoneração invocando razões de dignidade indispensável à continuidade do mandato em curso.
Antes de mais, quero sublinhar a elevação do gesto e da respetiva comunicação aos portugueses. Quero também testemunhar o serviço à causa pública durante décadas.
Em particular, os longos e exigentíssimos anos de saída do déficit excessivo, saneamento da banca, pandemia, guerras na Ucrânia e no Médio Oriente e chefia do governo de Portugal.
Agradeço ainda a disponibilidade para assegurar as funções até à substituição nos termos constitucionais. Espero que o tempo, mais depressa do que devagar, permita esclarecer o sucedido, no respeito pela presunção da inocência, da salvaguarda do bom nome, da afirmação da justiça e do reforço do estado de direito democrático.
Portugueses, chamado a decidir sobre o cenário criado pela demissão do governo, consequência da exoneração do primeiro-ministro, optei pela dissolução da Assembleia e marcação de eleições em 10 de março de 2024.
Fi-lo depois de ouvir os partidos com assento parlamentar e o Conselho de Estado, como manda a constituição. O primeiro claramente favorável, o segundo com empate e portanto, não favorável à dissolução, situação aliás que já ocorrera no passado com outros chefes de estado.
Fi-lo portanto por decisão própria no exercício de um poder conferido pela constituição da República Portuguesa.
E fi-lo por inúmeras razões. A primeira é a natureza do voto nas eleições de 2022 personalizado no primeiro-ministro, com base na sua própria liderança, candidatura, campanha eleitoral e esmagadora vitória.
Assim o disse, logo a 30 de março do ano passado, no discurso de posse do Governo ao falar em eventual substituição a meio do caminho, sublinhando o preço das grandes vitórias inevitavelmente pessoais e intencionalmente personalizadas.
Segunda, a fraqueza da formação de novo governo com a mesma maioria, mas com qualquer outro primeiro-ministro para tanto não legitimado politica e pessoalmente pelo voto popular.
Terceiro, o o risco já verificado no passado de essa fraqueza redundar num mero adiamento da dissolução para pior momento com situação mais crítica e desfecho mais imprevisível.
Vivendo o governo até lá como um governo presidencial, isto é, suportado do pelo Presidente da República, e o Presidente da República como um inspirador partidário, tudo enfraquecendo o papel presidencial num período sensível em que ele deve ser sobretudo uma referência interna e externa.
Quarta, a garantia da indispensável estabilidade económica e social que é dada, garantia dada pela prévia votação do orçamento antes mesmo de ser formalizada a exoneração do atual primeiro-ministro em início de dezembro.
A aprovação do orçamento permitirá ir ao encontro de muitos portugueses e acompanhar a execução do PRR que não para nem pode parar ou mais tarde com a passagem do governo a governo de gestão ou mais tarde com a dissolução .
Quinta, maior clareza e mais vigoroso rumo para superar um vazio inesperado, que surpreendeu e perturbou tantos portugueses
Afeiçoados que se encontravam aos oito anos de liderança governativa ininterrupta, devolvendo assim a palavra ao povo sem dramatizações nem temores.
É essa a força da democracia, não ter medo do povo.
Portugueses, tentei encurtar o mais possível o tempo desta decisão, tal como o da dissolução e de convocação das eleições e se não foi possível torná-lo mais breve isso tem a ver com o processo de substituição na liderança do partido do governo, como aconteceu no passado.
Agora, do que se trata é de olhar em frente, estugar o passo, escolher os representantes do povo que resultará das eleições, um Governo que procure assegurar a estabilidade e o progresso económico social e cultural em liberdade pluralismo e democracia, um governo com visão de futuro tomando o já feito, acabando o que importa fazer, inovando no que ficou por alcançar
Como sempre, portugueses, confio em vós.
No vosso patriotismo, no vosso espírito democrático, na vossa experiência, no vosso bom senso, na vossa liberdade. Como sempre, sois vós e só vós a certeza decisiva do futuro do nosso Portugal".