Favorecimento ao socialista Carlos Pereira? Da esquerda à direita exigem-se explicações
14-04-2023 - 14:07
 • Renascença

Deputados querem saber se houve favorecimento do deputado socialista Carlos Pereira, que abandonou entretanto a comissão de inquérito à TAP.

O Chega quer saber junto da Comissão da Transparência se, nas conclusões do relatório da Comissão Pública de Inquérito à Caixa Geral de Depósitos, houve favorecimento do banco público a Carlos Pereira.

O deputado do PS, Carlos Pereira, terá, segundo notícias vindas a público, alegadamente, recebido um perdão de dívida de 66 mil euros da CGD. O vice-presidente da bancada socialista disse aos jornalistas, no Parlamento, que era apenas o avalista de uma dívida da qual, a dada altura, se tornou devedor e que tentou saldar entre 2016 e 2022.

Já esta sexta-feira, em conferência de imprensa, Carlos Pereira anunciou a sua saída da Comissão de Inquérito à TAP, para poder ter a "tranquilidade necessária" e acabar com o que considera ser um "clima de suspeição, insinuação e especulação".

Carlos Pereira negou que o faça porque "houve um perdão de uma dívida" da Caixa Geral de Depósitos, acrescentando que é "falso que tenha havido um perdão", favorecimentos ou incompatibilidades -- uma versão entretanto corroborada pela própria CGD.

Na sequência das notícias, o líder do partido Chega diz querer saber junto da Comissão da Transparência se nas conclusões do relatório houve mesmo um favorecimento do banco público ao deputado.

Para André Ventura é preciso saber “se os prazos coincidem com a altura em que o aval estava em vigor, em que teve um desfecho favorável e com o ter sido o deputado Carlos Pereira o relator da Comissão de Inquérito”.

De qualquer modo, “a mera suspeição de que isso possa acontecer deve e merece que todos os grupos parlamentares, com urgência, reolhem para o relatório da caixa, por uma razão: é que este relatório ilibou completamente a Caixa de qualquer responsabilidade”, afirmou André Ventura.

Já o líder da Iniciativa Liberal revelou que vai apresentar um requerimento à Comissão de Transparência para que seja apurada a participação de Carlos Pereira no relatório à luz do litígio com o banco público.


“Nós queremos saber o que é que o Parlamento entende se há ou não condições para um deputado, nestas condições, ter sido o relator, portanto, uma figura relevantíssima dessa Comissão de Inquérito e ser até membro de uma Comissão de Inquérito, se devia ou não ter partilhado essa informação com o Parlamento, se devia ter ou não conduzido a essa Comissão de Inquérito”, explicou Rui Rocha.

Entretanto, o PSD quer esperar pelo parecer da Comissão de Transparência que a bancada pediu sobre o eventual conflito de interesses de Carlos Pereira, levantando dúvidas se, legalmente, o Parlamento pode revisitar as conclusões da Comissão de Inquérito à recapitalização da Caixa.

“Temos dúvidas se, legalmente e no quadro jurídico que rege o funcionamento, nomeadamente das comissões de inquérito, se é possível, após ter sido encerrado um relatório voltar atrás”, afirmou Paulo Moniz.

Segundo o deputado, “ temos muitas dúvidas que isso seja formal e juridicamente enquadrável”.

Já o Bloco de Esquerda exige que a Caixa Geral de Depósitos e Carlos Pereira esclareçam rapidamente a situação.

“Qualquer deputado que entra numa Comissão de Inquérito, uma das primeiras coisas que se faz é assinar um documento em que se diz que não tem nenhum tipo de participação de interesse pessoal naquela Comissão de Inquérito”, esclareceu Pedro Filipe Soares.

Por isso, Carlos Pereira “terá que esclarecer se o que assinou é correto, está válido ou, se não está válido, porque é que não está válido”. Uma informação que os bloquistas querem receber nas próximas horas.


Pelo PCP, a saída de Carlos Pereira é mais um sinal de desestabilização da Comissão de Inquérito à gestão da TAP.

“Estas oportunidades têm sido utilizadas para atacar a companhia e abrir caminho a outros interesses, portanto, neste momento, o que importa é esclarecer cabalmente aquilo que há a esclarecer, quer em relação a estes casos que têm surgido, quer em relação, principalmente, à questão de fundo, que são as opções políticas que têm sido tomadas e que venham a ser tomadas em relação à TAP”, disse Bruno Dias.

Entretanto, a Caixa Geral de Depósitos veio já negar que tenha havido qualquer perdão de dívida ao deputado socialista, pois o acordo foi efetuado pelo valor que, à data, considerou legalmente devido. No acordo, a CGD foi totalmente ressarcida do capital que emprestou acrescido dos juros à taxa supletiva legal”, referiu em comunicado o banco.


Neste momento, a Comissão da Transparência é o único recurso direto das oposições para que o parlamento se pronuncie sobre o eventual conflito de interesses de Carlos Pereira, quer nos trabalhos da Comissão de Inquérito da caixa geral de depósitos em 2017 quer na Comissão de Inquérito à TAP a decorrer agora.

A Comissão da Transparência presidida pela socialista Alexandra Leitão pode, a requerimento dos partidos, avaliar o compromisso de honra do deputado socialista entregue nas comissões de inquérito para saber se houve ou não declaração falsa de algum impedimento.

Fontes parlamentares dizem que Carlos Pereira podia ter pedido escusa de participar no inquérito à Caixa, por exemplo, tendo em conta que era avalista e, mais tarde, credor de uma dívida ao banco público.

Assim sendo, qualquer revisão do inquérito à Caixa não é de todo possível, garantem fontes parlamentares à Renascença. Os trabalhos estão encerrados, os documentos confidenciais avaliados nesse inquérito estão fechados e igualmente sem acesso.

Aliás, muitos deles são documentos que, durante o funcionamento do inquérito à Caixa, estavam em segredo de justiça e que não estão disponíveis de novo. As conclusões do inquérito essas sim são públicas, constam da documentação do Parlamento e podem ser consultadas.

É ainda assinalado à Renascença que há deputados dessa altura que já não estão em funções, embora Carlos Pereira seja protagonista de ambos os inquéritos.

No limite é dito à Renascença que, neste momento, a única coisa a fazer é propor a instalação de uma Comissão de Inquérito ao inquérito à Caixa, mas isso significa entrar num outro patamar de discussão.