A farmacêutica portuguesa Bial e o laboratório francês Biotrial foram parcialmente responsabilizados pela morte de uma pessoa, em Janeiro, na sequência de um ensaio clínico realizado em França.
Em conferência de imprensa, esta segunda-feira, a ministra francesa da Saúde, anunciou as conclusões do relatório encomendado à Inspecção-Geral de Assuntos Sociais (IGAS), em Janeiro.
A investigação não atribui responsabilidades à Agência de Segurança Nacional de Medicamentos (ANSM), que havia dado a luz verde em Junho ao teste da Bial, mas considera que não foi fornecida “protecção suficiente às pessoas que participaram na experiência".
A Bial reagiu à decisão, lamentando que o relatório final da IGAS seja “mais um que não permite determinar qualquer conclusão quanto à causa concreta do acidente, nem da morte de um dos voluntários que participou no ensaio clínico”.
Três grandes falhas
O Biotrial, centro de pesquisa onde foi realizada a experiência, é acusado de três "grandes falhas" na condução do ensaio clínico e da gestão da crise. Desde logo, é criticado por não ter agido em devido tempo face ao estado de saúde de primeiro voluntário hospitalizado.
Outro erro: não ter parado imediatamente a administração do produto aos restantes beneficiários do protocolo, falhando assim o seu dever de protecção.
O Biotrial é ainda acusado de não ter formalmente informado os outros voluntários sobre o que se estava a passar, apesar de ser seu dever fornecer aos participantes todas as "novas informações significativas que possam afectar a sua vontade de continuar o estudo" – uma obrigação que decorre também do Código de Saúde Pública.
A terceira grande falha apontada é o desrespeito pela obrigação de informar as autoridades sanitárias do que estava a acontecer. A ANSM só foi formalmente informada em 14 de Janeiro, quatro dias depois da hospitalização do voluntário que viria a falecer e três dias após a decisão de suspender o ensaio.
O regulamento prevê que, "sempre que um facto novo ponha em causa a segurança, o promotor do ensaio deve notificar imediatamente a autoridade de saúde e as medidas tomadas para garantir a segurança dos voluntários".
Bial pouco cautelosa
No que toca à Bial, é responsabilizada por ter sido “pouco cautelosa” na decisão de aumentar a dose de 20 mg para 50 mg. O aumento da dose é uma prática “permitida”, mas os inspectores consideram que a farmacêutica não tomou as precauções necessárias, “dado o nível de risco antecipado”, para limitar a exposição simultânea a vários produtos.
O relatório refere ainda que os inspectores foram apenas informados sobre as reacções à administração de 10 mg do medicamento, não tendo qualquer informação sobre a reacção aos 20 mg.
O medicamento em teste pretende tratar as variações de humor e sintomas de ansiedade, bem como desordens na coordenação de movimentos.
Desde a morte de um voluntário, em Janeiro, e da hospitalização de outros cinco, as experiências com o novo fármaco foram suspensas.
Contactado pela Renascença, o Ministério da Saúde não comenta as conclusões conhecidas esta segunda-feira.
A 17 de Janeiro, Guillaume Molinet, francês de 49 anos, morreu na sequência dos ensaios clínicos conduzidos em Rennes, a pedido da Bial. Foi o mais grave acidente alguma vez ocorrido na Europa no âmbito de uma experiência clínica. No total, estiveram envolvidos 108 voluntários, 90 dos quais receberam a droga, enquanto os restantes tomaram placebos. Os seis homens internados foram o grupo que recebeu a dose mais elevada.