Está instalado o primeiro "Ponto de Transição” num contentor marítimo reciclado, à porta do Mercado 2 de Abril, no Bairro da Bela Vista.
“Escolhemos Setúbal para o projeto-piloto do 'Ponto de Transição', porque é um concelho com um índice de pobreza muito elevado e porque é necessária alguma proximidade da equipa”, justificou Filipa Saldanha, sub-diretora do Programa Gulbenkian Desenvolvimento Sustentável, em declarações à Renascença, no momento da apresentação.
Este primeiro "Ponto de Transição" vai permanecer no Bairro da Bela Vista, mas Filipa Saldanha revelou que há a intenção de ter um segundo, ainda em modo “piloto” a funcionar até ao fim do ano, em Palmela ou Sesimbra.
A iniciativa é totalmente financiada pela Fundação Gulbenkian, mas a ideia é que, numa fase mais avançada, possa ser replicada em muitos outros municípios nacionais, com apoio de outros parceiros e entidades. “Há contacto com autarquias e juntas de freguesia porque são elas que melhor conhecem a realidade local, um conhecimento que a Gulbenkian não tem”.
O objetivo do projeto é ajudar as famílias portuguesas a combater a pobreza energética, em três dimensões: informação, ações de proximidade e capacitação.
De segunda a sexta-feira, quem quiser, pode aparecer no espaço, onde, em cada parede, se lê várias dicas sobre como poupar energia ou tornar as habitações mais confortáveis.
Dois técnicos estão lá para dar informação adicional e mais personalizada, consoante as necessidades de cada um. E também para facilitar o acesso das famílias a eventuais financiamentos do Estado, através do PRR, para realizar obras que promovam a maior eficiência energética das suas casas.
Além de exporem as dúvidas, as famílias interessadas podem agendar a ida de um dos agentes de transição a sua casa para fazer uma avaliação energética gratuita e identificar as possíveis melhorias nas habitações. Os agentes são pessoas da comunidade que receberam formação específica para este trabalho. Entregam o relatório aos técnicos e são estes que, posteriormente, aconselham as melhores decisões a tomar por cada família e a ajudam a concretizar, se for necessário.
O último objetivo do projeto é capacitar todos os agentes e parceiros envolvidos. A fase de testes também vai servir para correções e melhorias, de forma a funciona de forma mais eficaz, quando se tornar efetivo noutros concelhos. “Estamos a capacitar uma rede de stakeolders, que possa dar escala a nível nacional”, diz Filipa Saldanha.
O jovem vizinho, agente de transição
Quem entra na casa de uma família que pediu uma avaliação energética não é propriamente um desconhecido. Na maior parte dos casos, são pessoas que vivem ou têm alguma ligação ao Bairro da Bela Vista ou à Freguesia de São Sebastião. São vizinhos. E o programa da Gulbenkian apostou muito na captação dos jovens.
É o caso de Tiago Fernandes, que vive no Bairro e do seu amigo Ricardo Carvalho, do Viso, mas que passa muito tempo na Bela Vista, com os amigos. Ambos com 18 anos, percebem que a ligação à comunidade dá mais confiança; são pessoas conhecidas.
Por outro lado, diz Tiago, “todos passamos pelo mesmo, conhecemos as dificuldades e isso ajuda”. A formação para agente de transição já levou a fazer correções lá em casa para melhorar a eficiência energética. “Por exemplo, o frigorífico não pode ficar muito encostado à parede porque senão, o ar não circula e gasta mais energia. E não devemos deixar os aparelhos em stand-by”. Ricardo veio para o programa “puxado” pelo amigo, mas afirma categoricamente que o seu objetivo “é tentar fazer alguma diferença na vida das pessoas”.
Tânia Lourenço mora há 33 anos na Bela Vista e diz que é um orgulho estar no projeto como agente de transição. “É uma questão de confiança e há maior abertura das pessoas face a um rosto conhecido”.
É com grande entusiasmo que diz que há pessoas que já começaram a querer marcar visitas e a interessar-se pela iniciativa. A ela - como aos outros agentes – cabe-lhe a tarefa de fazer o levantamento das dificuldades e vulnerabilidades que encontrar nas casas que vai visitar e entregar a informação aos técnicos.Um grande entusiasmo que contagiou a irmã Any Semedo, de 21 anos, que também se inscreveu para ser agente de transição.
Esta é apenas mais uma das iniciativas comunitárias em que as duas irmãs se envolvem. Ambas estão no “Nosso Bairro, Nossa Cidade”, o Programa Integrado de Participação da Bela Vista e Zonas Envolventes, criado pela autarquia setubalense. E foi lá que tiveram conhecimento do Ponto Transição, iniciativa da Fundação Gulbenkian.