Os sindicatos de enfermeiros mantêm a "greve cirúrgica" com início previsto para segunda-feira, mas admitem suspendê-la se o Governo confirmar antes do arranque da paralisação uma nova reunião negocial a 17 de janeiro.
"Neste momento, nós comprometemo-nos a suspender a greve caso nos seja confirmada a reunião de dia 17 com os dois ministérios [Saúde e Finanças] e com esta mesa negocial para tentarmos de facto chegarmos a um compromisso", disse à Lusa Lúcia Leite, dirigente da Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros (ASPE).
O Governo reuniu-se esta sexta-feira com os sindicatos de enfermeiros para nova ronda negocial relativa à carreira de enfermagem, que resultou em algumas cedências aos profissionais - como a criação da categoria de enfermeiro especialista e o descongelamento das progressões na carreira - mas não em todas as reivindicações sindicais, que exigem também aumentos salariais e a antecipação da idade da reforma.
A greve está marcada até 28 de fevereiro nos blocos cirúrgicos de sete centros hospitalares.
De acordo com Lúcia Leite, a reunião de hoje "foi difícil, demorou bastante tempo", com a apresentação de um documento novo da parte da tutela que "apanhou de surpresa" os sindicatos.
Ainda que não tenha aceite assinar o memorando de entendimento proposto pelos sindicatos, a dirigente da ASPE reconheceu que o executivo cedeu em algumas matérias, como a criação da categoria de enfermeiro especialista, o descongelamento das progressões de todos os enfermeiros, quer estejam abrangidos por contrato em funções públicas ou contrato individual de trabalho, e que terão 1,5 pontos contados por cada ano de trabalho entre 2004 e 2014, aplicando-se a partir de 2015 a contagem de dois pontos por biénio.
O Governo comprometeu-se a reconhecer o direito ao suplemento remuneratório a cerca de 600 profissionais ainda sem esse reconhecimento, com retroativos a janeiro de 2018 não se comprometendo, no entanto, com datas.
"O Governo aceitou desde já, nas medidas transitórias, que todos os enfermeiros especialistas que neste momento já são reconhecidos com subsídio transitório, mais os que venham a ser reconhecidos em breve, passem à carreira de especialista de imediato e que todos os enfermeiros que estão em categorias a extinguir -- os enfermeiros chefes da antiga carreira -- sejam integrados na categoria correspondente na nova carreira, que é a de gestor, o que também é uma mais valia", acrescentou Lúcia Leite.
A dirigente disse ainda que falta acertar questões que se prendem com a definição das funções nas categorias da carreira, condições de acesso, "que o Governo já assume que será por concurso", faltando definir os critérios para esse concurso.
Sindicatos exigem aumentos salariais e reforma mais cedo
Segundo um comunicado do Ministério da Saúde relativo às reuniões de negociações desta sexta-feira, "entre as reivindicações dos enfermeiros que não foram acolhidas, incluíam-se ainda aumentos salariais, com início da carreira no salário de 1613,42 euros, com um impacto financeiro estimado em 216 milhões de euros, e idade da reforma aos 35 anos de serviço e aos 57 anos, com um impacto financeiro estimado de 230 milhões de euros".
Os sindicatos recusam-se a aceitar que estas matérias fiquem fora do acordo.
"Não aceitámos, porque o que está em causa é criar uma carreira de futuro para os enfermeiros e estar a sujeitar a carreira a questões economicistas vai hipotecar o futuro da profissão. O que aceitamos é que haja um faseamento, que haja uma carreira justa para os enfermeiros, de forma equitativa com as restantes profissões da saúde", disse Lúcia Leite, que reconhece o impacto financeiro inerente a estas medidas, mas sublinha a disponibilidade para fasear a integração dos enfermeiros nas novas tabelas salariais.
"Não estamos a pedir nada excessivo em comparação com as outras profissões e, portanto, não vamos aceitar que se reduz a dinheiro o valor desta profissão. O que está na base das propostas que o Governo tem apresentado é uma lógica economicista. Percebemos que tem que haver um faseamento, porque o impacto financeiro é grande, mas não vamos por em causa os princípios nem vamos vender a profissão por uns milhões", acrescentou.
A greve convocada para segunda-feira segue o modelo da que já ocorreu entre 22 de novembro e 31 de dezembro e que teve origem num movimento de enfermeiros que lançou uma recolha de dinheiro numa plataforma 'online' para ajudar a financiar os colegas durante a paralisação.
Na ocasião, a recolha de fundos atingiu 360 mil euros.
Para a nova paralisação, a recolha decorre até segunda-feira, tendo reunido até às 21:00 de hoje 389 mil euros, ou 97% da meta pretendida de 400 mil.
Lúcia Leite acredita que esse objetivo será atingido: "Acho que vamos ultrapassar. Os enfermeiros estão mobilizados e o Governo sabe disso", disse.
Nesta segunda greve cirúrgica, a decorrer entre 14 de janeiro e 28 de fevereiro, a paralisação poderá afetar blocos cirúrgicos de sete centros hospitalares: os dois centros do Porto, Braga, Vila Nova de Gaia/Espinho, Entre Douro e Vouga, Tondela/Viseu e Garcia de Orta.