Alcançado um acordo entre Roma e a China, falta agora o difícil trabalho de unir as comunidades católicas chinesas. É uma tarefa que será muito complicada, considera o padre Peter Stilwell, reitor da Universidade de São José, em Macau.
Desde a implantação do regime comunista na China existem duas comunidades católicas, uma “oficial”, reconhecida pelo regime ao abrigo da Associação Patriótica Católica, com bispos indicados por Pequim, e outra “clandestina”, fiel ao Papa e frequentemente sujeita a perseguição por parte das autoridades.
Com o acordo alcançado entre o Vaticano e a China o Papa passa a ter a última palavra sobre a nomeação dos bispos e, em contrapartida, Roma reconhece a legitimidade – levantando as sanções canónicas – de sete bispos que tinham sido ordenados sem mandato papal, incorrendo por isso em excomunhão.
Numa carta escrita à comunidade católica da China, esta quarta-feira, o Papa pede que todos os católicos se esforcem para ser “artífices da reconciliação”, mas vai ser um trabalho difícil, considera o padre Peter.
“Vai depender muito das pessoas em concreto. O Papa fala de uma cultura do encontro. É preciso lembrar que, tal como aconteceu noutros tempos e noutras épocas, houve uma comunidade que se sentiu marginalizada, uma comunidade clandestina que, por isso, não gozava dos benefícios, dos apoios ou do reconhecimento da autoridade, enquanto via pessoas da mesma tradição religiosa que aceitavam as regras e que podiam ter uma vida pública normal e às vezes até protegida pelas autoridades”, recorda o sacerdote.
“Agora, juntar essas duas comunidades não vai ser fácil. Aconteceu depois de outras perseguições, noutras épocas, e Roma sempre defendeu o processo de reconciliação, de entendimento, diálogo, mesmo que fosse ao longo de muitos anos.”
Apesar do acordo, a China continua a ser um país que não respeita a liberdade religiosa, perseguindo muitas outras comunidades, cristãs e não só. Não obstante, na sua carta aos chineses, o Papa pede ainda que os católicos se esforcem por ser bons cidadãos e que colaborem com o Governo.
Ao fazê-lo o Papa está a ser fiel a uma longa tradição, considera o padre Peter. “Se formos às cartas de São Paulo, ele diz que se deve respeitar as autoridades civis, rezar por elas, porque desempenham uma função que tem a bênção de Deus. O próprio Jesus Cristo, confrontado por Pilatos, quando este lhe diz que Jesus deve reconhecer que ele tem poder para o mandar matar, responde que ele não teria qualquer autoridade se não lhe viesse do alto, o que tem sido interpretado pela Igreja como dizendo que a autoridade civil é aceite como parte do plano que Deus tem para a sociedade humana.”
“Por isso reza-se pelas autoridades civis, para que elas desempenhem fielmente as suas funções. No Império Romano rezava-se pelos imperadores, mesmo quando, esporadicamente, ou periodicamente, a Igreja sofria perseguições”, diz.
A solicitação do Papa não deve, por isso, ser lida como uma apologia de um regime em particular, pois “não tem a ver com situações políticas concretas.”