A primeira exposição em Portugal da obra do artista norte-americano Tony Conrad (1940-2016), que percorre um “constante questionar de limites e regras” através da arte, numa “postura crítica com humor”, é inaugurada na sexta-feira na Culturgest, em Lisboa.
Considerado um dos nomes maiores do experimentalismo na arte ocidental dos últimos cinquenta anos, Tony Conrad deixou um trabalho que abrange áreas tão distintas como a música, na qual se iniciou ainda jovem, a instalação, a pintura e o cinema.
Nesta exposição - que reúne alguns dos seus mais importantes trabalhos dessas várias áreas - o percurso leva o visitante ao início dos anos 1960, as décadas seguintes de experimentalismo em diversos suportes, finalizando poucos anos antes da sua morte, em 2016.
A exposição internacional em seu nome iniciou-se em 2018 nos Estados Unidos, na Albright-Knox Art Gallery, em Buffalo, onde viveu, e depois realizou um périplo pela Europa, a partir de 2020, na Alemanha, na Kölnischer Kunstverein, em Colónia, e no Museu de Arte Moderna e Contemporânea de Genebra, na Suíça, desde 2021, terminando agora em Lisboa, na Culturgest, onde ficará até 03 de julho deste ano.
Entre as obras que o público poderá ver nesta exposição, estão os "Yellow Movies" (1972-73) e as instalações "Panoptico" (1988) e "WiP" (2013), e ainda um conjunto das “ferramentas acústicas” que inventou e algumas das obras nas quais quis dissecar o funcionamento dos media e das instituições contemporâneas.
O filme "The Flicker" (1966) marcará também presença nesta antológica, estando previstas duas apresentações deste “marco do cinema estruturalista” nos auditórios da Culturgest, segundo a programação.
Questionado sobre a importância do trabalho deste artista, considerado pioneiro no experimentalismo das últimas cinco décadas, o programador de artes visuais da Culturgest, Bruno Marchand, sublinhou o "constante questionamento dos limites e das regras que lhe impunham".
"Tony Conrad tornou-se uma referência pelo seu trabalho de grande liberdade. Não apenas de expressão da liberdade, mas de luta e conquista por essa liberdade, questionando os limites e as regras que lhe tentavam impor", salientou.
Bruno Marchand recordou ainda que o artista norte-americano "foi um dos primeiros a antecipar a reflexão em torno dos media e a forma como estes meios induziram comportamentos e influenciaram o pensamento" das sociedades.
Conrad manteve-se sempre numa postura discreta, mas crítica, e "nunca perdeu o sentido de humor e a consciência da loucura e do absurdo da vida quotidiana, expondo as situações de forma caricatural", disse o responsável da Culturgest à Lusa, vincando a atitude "admirável e exemplar de crítica, sem fazer concessões".
Ao longo do percurso da exposição, o curador da exposição, Balthazar Lovay, foi apresentando algumas peças emblemáticas do artista norte-americano que teve grande influência na arte experimental, juntando-se, ao mesmo tempo, aos movimentos ativistas.
Conrad aprendeu violino ainda jovem, e tocava música barroca, estudou matemática em Harvard, nos Estados Unidos, acabando por reunir um currículo ao mesmo tempo artístico e científico.
Uma história é importante para compreender o espírito deste artista, disse Lovay aos jornalistas, na visita guiada: "Numa época em que os artistas conviviam, na sua maioria, com a pobreza, e comiam o que conseguiam, sobretudo 'fast-food', Conrad comprava fígado e rim, carnes baratas, mas que tinham uma substância nutritiva importante".
Esta atitude seguiu o artista ao longo da vida, não se conformando com os ditames sociais, e criticando sistematicamente as normas vigentes de forma satírica, usando, ao mesmo tempo, materiais baratos e acessíveis.
A irreverência do artista é visível em obras como a peça de música "Piece", onde colocou de lado a composição musical para experimentar essencialmente as sonoridades.
O artista também tinha a preferência por objetos do quotidiano para aplicar nas suas obras, nomeadamente nas colagens, e na forma satírica como aborda a influência dos media. Nessa linha, o seu trabalho, a partir dos anos 1980, "torna-se mais negro e distópico".
Essa crítica mordaz surge em obras como "Wip", uma instalação que reúne duas prisões com barras de metal e com camas, ao mesmo tempo que é projetado um filme com personagens que caricaturavam uma série norte-americana sobre uma prisão feminina.
Ao longo do seu percurso público, as obras de Conrad foram apresentadas em exposições no Museum of Modern Art, na Tate Modern, no L. A. Museum of Contemporary Art, no Whitney Museum of American Art, na Documenta ou na Bienal de Veneza.