Mal subiu ao palanque e se aproximou do microfone para falar ao congresso do PCP, Bernardino Soares, presidente da Câmara de Loures, foi aplaudido durante vários segundos por um pavilhão Paz e Amizade, em Loures, repleto que depois se silenciou para ouvir o autarca.
Era um discurso anunciado como sendo de boas-vindas, mas foi marcadamente ideológico e afiado contra os que criticaram a realização deste congresso.
Bernardino não referiu o nome de Adão Silva, mas foi ao líder parlamentar do PSD que se referiu quando disse que "um desses iluminados” a propósito da realização do congresso do PCP falou de “habilidade saloia”.
E lá veio o troco ao deputado social-democrata. Bernardino, para delícia dos congressistas e delegados, que foram pontuando a intervenção com muitas palmas, disse que em Loures há "muito orgulho na raiz saloia" da cultura, "de gente empenhada há séculos na produção agrícola, a que se acrescentaram milhares de operários da cintura industrial e depois gentes de todo o país e de todo o mundo à procura de uma vida melhor".
E insistiu que com "a habilidade saloia nesta autarquia" tem "conseguido combater a pandemia e proteger as populações mantendo a atividade económica, cultural e associativa".
Ainda com essa "habilidade saloia" se articulou "o trabalho entre as várias instituições públicas da administração central e local tomando medidas inovadoras no combate à pandemia", disse o autarca, acrescentando que muitas das soluções adotadas pela Câmara de Loures "foram adotadas depois noutros concelhos no país".
O autarca e membro do comité central do PCP definiu então as águas em que o PCP se mexe nesta altura, referindo que este "é um congresso que se realiza num momento de forte combate político ideológico, contra o anticomunismo, contra o ataque às liberdades, branqueamento do fascismo e o fomento do individualismo e isolamento social".
Ora, disse Bernardino (agora bem mais grisalho do que nos tempos em que foi líder parlamentar e de barba, tapada pela máscara de proteção), o PCP é o "representante destacado dos que não se resignam, dos que não se isolam e não viram a cara à luta por mais difícil que ela se torne".
Aprovado o Orçamento do Estado, com uma pandemia em curso há meses, com eleições presidenciais e autárquicas à porta "o papel dos comunistas é o que verdadeiramente incomoda os que querem impor o retrocesso e a resignação", conclui Bernardino.
O alvo político-partidário destas palavras é incerto, mas não haja dúvida que é o centro de direita e a direita à direita desse centro. Para o dirigente comunista a esses "incomoda-os que este congresso se realize, incomoda-os que o quinto concelho mais populoso do país seja dirigido por eleitos do PCP".
O autarca não foi explícito, mas garante que em Loures tem "enfrentado regularmente ofensivas, calúnias e campanhas" e a "todas" tem dado combate", avisando que não tem "medo deste combate".
E insiste na tecla. Ouve-os, sem nomear quem, "muito preocupados com a realização deste congresso, concretizado como se vê em plenas condições de segurança, mas nunca os ouvimos preocupados com a sobrelotação dos transportes públicos".
E numa referência implícita ao Chega referiu que ouve gente preocupada "com as fraudes do rendimento mínimo", mas que "nunca" os ouve "preocupados com os rendimentos máximos dos banqueiros ou dos grupos económicos".
O remate do discurso foi feito ao som de mais aplausos, com Bernardino Soares a concluir: "Ao longo dos últimos meses querem convencer o povo que a luta contra a pandemia e a defesa da democracia são questões contraditórias, mas não é combate à pandemia o ataque aos direitos dos trabalhadores e a degradação do Serviço Nacional de Saúde, isso não é combate à pandemia isso é sim um ataque à democracia e sem democracia não há saúde nem direitos nem progresso nem futuro".