O social-democrata Pedro Duarte considera que uma eventual governação baseada em meros atos legislativos do Governo "não fará muito sentido". A possibilidade de "governar por decreto" foi noticiada em manchete no último fim-de-semana pelo semanário "Expresso" e não mereceu até agora qualquer comentário da direção de Luis Montenegro.
Em declarações ao programa "Casa Comum" da Renascença, o presidente do Conselho Estratégico Nacional do PSD rejeita esse caminho desde logo por motivos jurídicos.
"Quem é jurista percebe que isso não fará muito sentido. A Constituição explica bem o que são as competências exclusivas e partilhadas do Governo e da Assembleia. Não há muita fórmula. Por muito que pudesse existir uma motivação política, há matérias que, pela sua natureza e do ponto de vista prático, sempre foram decididas pelo Conselho de Ministros. E há outras matérias que tem que ser o Parlamento a decidir", afirma Pedro Duarte no debate semanal de política da Renascença.
O espectro das coligações negativas
Na noite das eleições legislativas, Luis Montenegro tinha alertado para a possibilidade de uma "aliança negativa" entre o PS e o Chega "para impedir o governo que os portugueses quiseram". Agora é Pedro Duarte a regressar ao tema das coligações negativas ao analisar na Renascença o impasse criado para a eleição do Presidente da Assembleia da República.
"Assistimos ao que se denomina de coligação negativa", assinala o antigo deputado que reconhece que o seu partido está sujeito a chumbos desde logo na discussão do programa de Governo. " Se isso voltar a acontecer, isso em tese pode acontecer. O Governo é assumidamente minoritário. Estará sempre dependente do que os diferentes partidos quiserem fazer no Parlamento", confessa o presidente do Conselho Estratégico Nacional do PSD.
O mote de Montenegro é retomado pelo ex-deputado na Renascença ao evocar o "susto que muitos democratas tiveram" com o resultado do Chega nas eleições para colocar pressão sobre as decisões do PS.
" Temo que da parte do Partido Socialista haja uma tentação de que se combate o crescimento do Chega imitando-os, fazendo o mesmo que eles fazem, entrando numa competição para ver quem é o mais irresponsável e destrutivo", diz Pedro Duarte no programa "Casa Comum"
"Não competia à AD selecionar apoios para Aguiar Branco"
Questionado sobre uma possível inabilidade na gestão política do PSD do processo de candidatura de Aguiar Branco, Duarte rejeita a tese e afirma que há quem "brinque com as palavras e com gestos de forma infantil aos olhos da generalidade da população portuguesa".
O comentador social-democrata fala numa "surpresa" pelo chumbo inicial do candidato apoiado pelo PSD, sustentando que foi seguida a prática parlamentar de proposta de um nome pelo partido mais votado. " A partir do momento em que o nome é proposto, esperava-se sentido de responsabilidade por parte de toda a gente". Estaria o PSD à espera do apoio do PS ? "Não compete à bancada da AD estar a selecionar quem apoia ou não o candidato. A democracia funciona desta maneira e as votações parlamentares são assim. Os nomes são propostos e os partidos votam como entenderem".
Pedro Duarte diz não ter informação sobre um possível entendimento entre PSD e Chega para este processo, mas afirma que falar em acordo "é uma discussão de semântica e, sem ofender ninguém, é infantil", insistindo que os portugueses não esperam este tipo de debates e impasses.
Uma equação de arrogância
A gestão política do processo por parte de Montenegro foi "infeliz", na análise do socialista Porfírio Silva, tomando Montenegro esta eleição como "favas contadas" , sem contactar o PS para apoios ou votos, "nem sequer para saber se o candidato do PSD era aceitável para o PS".
Para Porfírio Silva, assistiu-se no Parlamento a uma "fórmula quase matemática" em que "sobranceria + improvisação = irresponsabilidade". O socialista acusa os social-democratas de "arrogância" ao decidir que "não têm que conversar com ninguém", dando o exemplo da forma como o PSD não procurou auscultar os partidos sobre a candidatura de Aguiar Branco.
"O PSD pelos vistos não fala com ninguém, não quis saber se gostavam do seu candidato. Acha que se consegue eleger o Presidente da Assembleia da República, estando empatado em número de mandatos com o maior partido da oposição, sem falar com ninguém. Atira-se para a frente e depois retira o seu candidato", descreve o antigo deputado socialista no programa "Casa Comum".
PS não quis Chega sozinho na corrida
Questionado sobre a forma como o PS geriu o diálogo com o PSD no processo de candidatura à presidência da Assembleia da República, Porfírio Silva assinala que "o PS não se meteu no caminho", tendo apenas apresentado um candidato, Francisco Assis, depois do PSD ter retirado a candidatura de Aguiar Branco, depois de falhada a primeira eleição.
Não podíamos deixar que o único candidato fosse do Chega", contesta o agora ex-deputado socialista na Renascença. "A partir do momento em que se viu que o PSD tinha arranjado uma grande embrulhada com o Chega, o PS tomou a iniciativa de ir conversar com o PSD para resolver a situação. E afinal havia uma solução."
Para o resto da legislatura, o comentador que milita no PS lembra que o PSD deve procurar governar mas tem uma "ínfima maioria" que deve motivar os social-democratas ao "dever de conversar, negociar, procurar soluções para os problemas e respeitar os outros partidos".
Em jeito de conselho, Porfírio Silva avisa o PSD para "não se deixar cair na armadilha" de confiar no Chega. "Já vimos o resultado que isso deu nos Açores. O Chega rói sempre a corda"