O secretário-geral do PS acredita que se está a viver um momento histórico na esquerda e na política portuguesas: PS, Bloco de Esquerda e PCP estão a tentar chegar a um acordo que vire a “página da austeridade”. No entanto, António Costa reafirma que “não está disponível para um Governo que não seja de legislatura”.
No discurso de abertura da comissão nacional do PS, este sábado, António Costa defendeu que há tanta legitimidade neste acordo pós-eleitoral entre os partidos de esquerda como houve no acordo pós-eleitoral PSD/CDS de há quatro anos. “Alguém pôs em causa a legitimidade desses acordos pós-eleitorais? A não ser que se considere que alguns acordos são legítimos e outros não.”
O líder socialista reforça que “aquilo que dá consistência à acção governativa não são os acordos, é o programa de Governo". Foi necessário assegurar que o que está no programa de Governo PS, com propostas de BE e PCP, "são medidas coerentes entre si, consistentes com o programa do PS, e que o que resulta destas negociações é um programa inteiramente compatível” com as “obrigações internacionais de Portugal".
Costa esclareceu que "o PS não está disponível para um Governo que não seja de legislatura". “O país precisa de estabilidade” e que se encontrem “soluções” e se “assumam responsabilidades” para “responder às necessidades dos portugueses e ao superior interesse nacional”.
Golpe de estado? Costa faz contas
O secretário-geral do PS começou o discurso de cerca de uma hora pela resposta aos ataques de que tem sido alvo nas últimas semanas. "A direita está em minoria não por causa de um golpe de estado, mas porque tem menos deputados que as restantes bancadas", disse Costa. E acrescentou: "Tem menos deputados porque teve menos votos que as restantes bancadas.”
O líder socialista aproveitou para ler o texto da moção com que se candidatou à liderança do PS. Nela dizia estar contra o “arco de governação” e falava na legitimidade de todos os partidos.
Costa reconhece que as negociações com Bloco de Esquerda, PCP e Verdes não foram fáceis e são um “enorme desafio” porque se está a tentar “mudar a correlação do sistema partidário como ele tem existido nos últimos 40 anos”. “Devemos dar esse passo, é tempo de mudar o paradigma do sistema partidário”, reforçou.
Respondendo aos que consideram que estamos num novo PREC (Processo Revolucionário em Curso), afirma ser “hora de pôr termo a esse último resquício do PREC e do muro de Berlim”.
“Condições duradouras”
O líder socialista elencou as “grandes batalhas de hoje: virar a página da austeridade, apostar no conhecimento assente na inovação, contra os baixos salários e em defesa do nosso modelo social”.
Costa diz ter encontrado “nos três partidos espírito construtivo, sério e responsável” e, apesar de haver matérias em que não foi alcançado um acordo, o Bloco de Esquerda, o PCP e Os Verdes decidiram “viabilizar um Governo do PS com condições duradouras ao longo da legislatura”.
“Nós somos sérios e estamos a falar com gente séria. Nós sabemos aquilo que nos separa do BE e do PCP, tem a ver com posicionamentos diferentes de cada um. Aquilo que nos divide não é mercantilizado em lugares de Governo”, atirou, numa crítica a Paulo Portas. “Não é revogável ou irrevogável para os lugares de ministros ou vice-primeiros-ministros.”
Costa aproveitou o discurso para deixar críticas à coligação e em especial a Portas, que, nomeadamente, já foi contra o euro.
Também os críticos internos não foram esquecidos. António Costa rejeitou a via "de se colocar na posição passiva de ser mera oposição a um Governo minoritário, ficando na posição cínica (que muitas vezes têm sido recomendada) de estar à espera que a direita fique mais uns meses [no poder) para se estender ao comprido, altura em que será mais fácil derrubá-la".
A terminar o discurso, Costa apelou a que a comissão política do PS aprecie e aprove o documento, baseado no programa socialista, mas já com as alterações pós-negociações à esquerda.