Mais despesas e dificuldades no emprego são algumas das razões apontadas pelas chinesas para não avançarem para um terceiro filho. A aprovação formal da nova política do Governo foi recebida com ceticismo e críticas generalizadas nas redes sociais chinesas, revela a CNN nesta quarta-feira.
No Weibo, a rede social mais famosa no território e que se assemelha ao Twitter, muitas mulheres expressaram reticências face à medida e alguma ansiedade no que toca ao aumento do custo de vida e à desigualdade de género no local de trabalho.
“Não quero ter um filho, muito menos três”, refere uma chinesa na plataforma. O comentário obteve 51.000 “gostos”.
Depois de mais de 35 anos debaixo da política do filho único, a China percebeu que a população envelheceu e a economia precisa de mais gente nova. Decidiu, pois, incentivar os casais a ter mais filhos.
A primeira tentativa ocorreu em 2015, ano em que o Partido Comunista passou a permitir dois filhos por casal. A medida levou a um aumento de nascimentos em 2016, mas foi breve, pois a taxa de natalidade tem vindo a cair todos os anos.
Por isso, em maio, o Governo anunciou a política dos três filhos, formalizada na sexta-feira.
Mas os chineses não parecem muito convencidos. O principal argumento contra é financeiro: dizem que criar três crianças é demasiado caro, sobretudo para os casais urbanos, muitos dos quais enfrentam salários estagnados, menos oportunidades de emprego e horas de trabalho extenuantes.
Além da questão financeira, na China são as mulheres as mais sacrificadas com o trabalho doméstico e o cuidado dos filhos, o que as leva a evitar ainda mais a maternidade.
“Os homens terão licença paternidade para seus três filhos, então?”, questiona uma mulher no Weibo, numa publicação que mereceu mais de 67.000 “gostos”.
“Ter três filhos, o mais importante: é um problema porque as empresas não recrutarão mais funcionárias; é problema das mulheres ficarem desempregadas desde então. Só existe uma solução: licença maternidade obrigatória para homens. Não ao mesmo tempo, mas a mãe descansa três meses e o pai três meses. E tudo está resolvido”, lê-se noutra publicação.
A China não tem atualmente uma lei nacional que conceda licença de paternidade.
Desigualdade de género no trabalho
Segundo um relatório da Human Rights Watch publicado no início do ano, as mulheres chinesas são aconselhadas, em algumas empresas, a esperar para engravidar e, se engravidarem antes do estabelecido, podem ser demitidas ou punidas.
A relatório daquela organização não-governamental teve por base estudos, relatos da comunicação social, cobertura de notícias, documentos judiciais e entrevistas.
Nos últimos anos, muitas mulheres chinesas têm relatado casos de discriminação no trabalho com base em seu estado civil ou parental, com empregadores que muitas vezes relutantes em pagar a licença de maternidade.
Governo promete mudanças
O Partido Comunista já veio reconhecer as dificuldades e comprometeu-se a criar condições que protejam o direito das mulheres ao emprego, bem como trabalhar com o setor privado para criar creches em áreas públicas e locais de trabalho, disse a agência de notícias estatal Xinhua, citada pela CNN.
O Governo vai ainda “lançar mais medidas de apoio em termos de finanças, impostos, seguros, educação, habitação e emprego, para aliviar o fardo das famílias”, acrescenta.
Resta saber como irão ser implementadas estas medidas, dado que a legislação não foi ainda publicada.
Em 2019, a taxa de natalidade na China atingiu o nível mais baixo em 70 anos e, em 2020, o número de recém-nascidos caiu mais 18%.
Significa isto que que o país – o mais populoso do mundo, com 1,4 bilhão de pessoas – viu sua taxa de fertilidade cair de mais de cinco nascimentos por mulher para menos de dois, em apenas 40 anos. Essa é uma das taxas de fertilidade mais baixas do mundo.