A situação dos cristãos nos países onde são uma minoria deteriorou-se muito e alastrou a mais locais e protagonistas, conclui um relatório intercalar da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS) sobre a perseguição religiosa no mundo.
A AIS divulga este relatório de dois em anos. O último foi publicado no final de 2016 e este, que é oficialmente divulgado esta quinta-feira, diz apenas respeito aos cristãos.
Intitulado “Perseguidos e Esquecidos?”, o relatório analisa a situação em 13 países, entre Agosto de 2015 e Julho de 2017, concluindo que “houve um declínio da liberdade de expressão da fé da comunidade cristã”, que está a ser vítima de uma perseguição “nunca vista na História”, e de uma violência sem precedentes.
O Iraque e a Síria são dos locais onde a situação é mais grave, por causa da perseguição movida nos últimos anos pelo auto-proclamado Estado Islâmico. “Os cristãos são uma minoria pobre, desprotegida e sem acesso aos direitos mais básicos, e muitos tiveram de fugir por causa da ameaça dos radicais islâmicos”, diz à Renascença Catarina Martins Bettencourt, que alerta: “O cenário que apontamos neste relatório é o da possibilidade de em três anos as comunidades cristãs pura e simplesmente desparecerem nestes dois países. O que me choca muito, porque estamos a falar do berço do cristianismo”.
Mas se no Médio Oriente a violência é exercida normalmente por grupos jihadistas, há casos em que os ataques contra a comunidade cristã são realizados pelo próprio Estado. Acontece na China e na Coreia do Norte.
“Na China, o presidente já afirmou que o cristianismo é visto como uma infiltração estrangeira, e nos últimos dois anos houve destruição de símbolos religiosos e de igrejas, detenções. É uma perseguição por parte do Estado”, diz-nos. Mas, na Coreia do Norte a situação é ainda mais alarmante, com relatos de “atrocidades inimagináveis” contra os cristãos em campos de concentração. “Os cristãos são obrigados a passar fome, há casos de violações, aborto forçado, e relatos de fiéis que são pendurados em cruzes sobre fogo, ou que são esmagados por rolos compressores. São práticas de tortura. É indescritível o que os cristãos ali estão a passar”, afirma a responsável da AIS. Muitos destes cristãos perseguidos acabam presos: “estão em campos de concentração, de onde a maioria não sairá com vida dado este tipo de tortura que é feito”.
Também em África há cada vez mais extremismo religioso. A Nigéria é dos piores exemplos: “há uma limpeza étnica, sobretudo no norte do país, levada a cabo pelo Boko Haram, um grupo terrorista filiado do auto-proclamado Estado Islâmico”. O relatório indica que a onda de violência já causou “mais de 1,8 milhões de refugiados ou deslocados”. Só na diocese de Kafanchan, e só nos últimos cinco anos, o Boko Haram assassinou 988 pessoas, destruiu 71 aldeias – na sua maioria cristãs –, e mais de 20 igrejas. Catarina Martins Bettencourt diz que os relatos que chegam, impressionam pela brutalidade: “para além de haver milhares de pessoas em fuga dentro do próprio país, tem havido assassinatos em massa. As pessoas têm de fugir para salvar a vida, e há um número exorbitante, que tem crescido nos últimos anos, de mulheres viúvas e crianças órfãs de pai e mãe. O objectivo é, claramente, o de fazer uma limpeza étnica”.
A responsável da Fundação AIS lembra que em 2016 vários países, Portugal incluído, reconheceram que havia “um genocídio em curso no médio oriente, e em alguns países de África”, mas isso “não teve efeito prático”, lamenta. “Não basta votar uma declaração e depois nada acontecer. Tem de haver medidas concretas, mas infelizmente o que continuamos a ver é que acima de tudo estão as questões económicas e as questões estratégicas, de posicionamento dos países mais poderosos do mundo”.
O relatório “Perseguidos e Esquecidos?” vai ser apresentado esta quinta-feira em todos os países onde a Fundação Ajuda à Igreja que Sofre está presente, para sensibilizar os media e o poder político para esta questão. Em Portugal a apresentação será feita esta quinta-feira, às 17h00, no auditório da Rádio Renascença, pela Fundação AIS e pelo bispo auxiliar de Lisboa D. Nuno Brás.