O embaixador palestiniano junto às Nações Unidas saudou esta quarta-feira a "mensagem poderosa" enviada pela Assembleia-Geral da ONU, onde 153 países exigiram um cessar-fogo humanitário imediato em Gaza, defendendo que se trata de um "dia histórico".
"É nosso dever coletivo continuar neste caminho até que possamos ver o fim desta agressão, desta guerra contra o nosso povo. (...) É nosso dever coletivo salvar vidas", disse Riyad Mansour aos jornalistas.
"Não iremos descansar até vermos Israel a cumprir esta exigência da Assembleia- Geral", frisou.
A Assembleia-Geral das Nações Unidas aprovou hoje, com apoio esmagador de 153 países, uma resolução não vinculativa que exige um cessar-fogo humanitário imediato em Gaza, após o Conselho de Segurança ter falhado em aprovar a mesma exigência com um veto dos Estados Unidos.
O resultado excedeu mesmo o apoio à condenação da invasão russa da Ucrânia que, na melhor das votações na Assembleia-Geral, conseguiu 143 votos, um resultado que os Estados Unidos na ocasião consideraram uma prova do isolamento da Rússia.
Este projeto de resolução sobre Gaza, apresentado à Assembleia pelo Egito, e copatrocinado por cerca de 80 Estados-membros da ONU, incluindo Portugal, obteve 153 votos a favor, 10 contra e 23 abstenções dos 193 Estados-membros da ONU.
Votaram contra este texto países como Israel, Estados Unidos ou Áustria e entre os países que se abstiveram estão Ucrânia, Itália, Reino Unido, Argentina, Alemanha ou Cabo Verde.
Resolução responde a exigência de António Guterres
A resolução responde a uma exigência sem precedentes do secretário-geral da ONU, António Guterres, que teme um "colapso total da ordem pública" no território palestiniano devastado pela guerra.
O texto aprovado manifesta preocupação com a "situação humanitária catastrófica na Faixa de Gaza", "exige um cessar-fogo humanitário imediato" e apela à proteção dos civis, ao acesso humanitário e à libertação "imediata e incondicional" de todos os reféns.
Após a votação, Mansour sublinhou a importância de salvar a vida de crianças palestinianas, que estão entre as maiores vítimas da ofensiva israelita em Gaza.
"As crianças palestinianas são tão importantes como qualquer outra criança ao redor do mundo. Não deveria haver diferenciação entre crianças. As crianças palestinianas são preciosas para nós, precisamos de salvá-las, precisamos de protegê-las e permitir-lhes sonhar os seus sonhoos e reconstruir o Estado da Palestina e viver em liberdade e em dignidade", salientou o embaixador.
Ao contrário das resoluções do Conselho de Segurança, as resoluções da Assembleia-Geral não são juridicamente vinculativas. Mas, como disse na segunda-feira o porta-voz da ONU, Stepháne Dujarric, as mensagens da assembleia "também são muito importantes" e refletem a opinião da comunidade internacional.
Isolamento dos Estados Unidos
A votação na Assembleia-Geral reflete o crescente isolamento dos Estados Unidos e de Israel, que se recusam a aderir às exigências de um cessar-fogo em Gaza.
"O tamanho desta maioria vai prejudicar muito os Estados Unidos", comentou o analista Richard Gowan, do International Crisis Group, em declarações à agência France Press (AFP). "Isto mostra que a grande maioria dos Estados-membros da ONU perderam a paciência com a posição de Washington".
Mais do que as Nações Unidas ou qualquer outra organização internacional, os Estados Unidos são vistos como os únicos capazes de persuadir Israel a aceitar um cessar-fogo como seu aliado mais próximo e maior fornecedor de armamento.
Face ao posicionamento norte-americano, são cada vez mais as vozes a acusar Washington de "cumplicidade" face aos crimes que estão a ser cometidos por Israel no enclave.
Canadá apoia cessar fogo imediato
O Canadá, que até agora se alinhava com as políticas dos Estados Unidos e de Israel, mudou o seu posicionamento e apoiou hoje, pela primeira vez, um cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza.
Tal como o texto adotado pela Assembleia-Geral no final de outubro - que obteve o apoio de 120 países e que apelava a uma "trégua humanitária imediata, duradoura e sustentada"-, a resolução hoje aprovada não condena especificamente o grupo palestiniano Hamas, uma ausência que tem sido sistematicamente criticada por países como Estados Unidos, Reino Unido ou Israel.
"Porque é que é tão difícil condenar o Hamas? Dizer, inequivocamente, que assassinar bebés e matar pais a tiro na frente dos filhos é horrível. Que queimar casas enquanto famílias se abrigam lá dentro e fazer civis como reféns é abominável", declarou o embaixador dos EUA junto à ONU, Linda Thomas-Greenfield, antes de votar contra um cessar-fogo imediato em Gaza.
A guerra entre Israel e o Hamas começou em 7 de outubro, quando o grupo islamita atacou, de surpresa e com uma força inédita, o território israelita, matando, segundo as autoridades de Telavive, 1.200 pessoas, na sua maioria civis, e fazendo mais de 200 reféns.
Em retaliação, Israel tem bombardeado Gaza e bloqueou a entrada de bens essenciais como água, medicamentos e combustível.
Embora os dois lados tenham feito uma trégua de alguns dias para troca de prisioneiros e reféns, bem como para permitir o acesso de ajuda humanitária, os últimos dados atualizados das autoridades de Gaza, território controlado pelo Hamas desde 2007, apontam para mais de 18 mil mortos e 50 mil feridos no enclave palestiniano.