A cimeira da democracia, convocada pelos EUA, pretendeu transmitir um sinal de que a superpotência americana se empenha na promoção de regimes democráticos no mundo. Estamos, no entanto, longe do que se passou após o fim da II Guerra Mundial.
Nessa altura Washington apostou numa rede de países e organizações internacionais (ONU, FMI, Banco Mundial, etc.) como resposta à agressividade do comunismo soviético. Recorde-se o que representou o plano Marshall para a recuperação de uma Europa devastada pela guerra e para lançar a integração europeia.
Recentemente, a desastrada saída dos militares americanos do Afeganistão levantou dúvidas sobre a vontade dos EUA defenderem os seus aliados. Nessa retirada Washington não se empenhou em consultar ou sequer prevenir os países amigos. Tal como não preveniu a França de que ela já não iria fornecer submarinos à Austrália, pois estes seriam fornecidos pelos EUA.
Com Trump na Casa Branca, os EUA entraram numa tendência isolacionista que a administração Biden só em parte inverteu. Compreende-se: os americanos fartaram-se de guerras no estrangeiro que não ganharam, não querem mais aventuras fora de portas. Além disso, como afirma o “The Economist”, os americanos estão demasiado divididos internamente para manifestarem externamente um propósito sólido.
Ora é a situação política interna americana que coloca mais ameaças a uma democracia que desde o fim do séc. XVIII é uma inspiração para o mundo. Trump perdeu as eleições presidenciais de 2020, mas não aceitou essa derrota. Continua a manter a mentira de que o verdadeiro vencedor foi ele, tendo-lhe sido “roubada” a eleição. E essa mentira é entusiasticamente partilhada pelo partido republicano, outrora o partido de A. Lincoln. Nada de tão contrário à democracia se havia ainda visto nos EUA.
Acresce que Trump patrocinou no início deste ano uma invasão do Capitólio, ou seja, do Congresso federal, numa tentativa para derrubar pela força a democracia americana. Algo até aqui impensável.
A grande ajuda que Washington pode dar à democracia representativa no mundo está em mostrar que, internamente, preza e respeita o regime democrático. É uma tarefa essencial, mas difícil, a que Joe Biden e o seu partido têm que dar prioridade efetiva.